Por Justino Lourenço (*)
Acabei por aceitar o repto de escrever a propósito do percurso do Jesualdo Ferreira no último ano no F.C.Porto. Começo por dizer, que estou a escrever este texto, antes do resultado do Jamor, mas de qualquer forma penso que o próximo Domingo não irá de nada mudar as minhas convicções.
O F.C.Porto ao longo da sua longa história tem tido nas suas fileiras treinadores com os mais variados perfis. Assim, desde exemplos de treinadores que pela sua forma de estar e técnicas inovadoras de treino conseguiram sucessos nacionais e mesmo na senda internacional, sem querer esquecer ninguém, salientaria o exemplo do Pedroto, Artur Jorge, Bobby Robson, António Oliveira e José Mourinho.
Na segunda divisão desta minha classificação acrescentaria Co Adriaanse, que revolucionou a clássica forma de jogar, em especial a nível da defesa (sector com tradição no F.C.Porto), causando alguns calafrios aos adeptos em especial nos jogos internacionais, mas que para consumo interno conseguiu o esperado sucesso. Passaram, pelo historial do clube treinadores, que conseguiram gerir a equipa que herdaram, mas falharam a sua renovação como foi o caso de Fernando Santos (merecido obreiro do Penta).
Mas, o que é que estes treinadores tiveram em comum?
Um presidente do F.C.Porto no seu melhor, não sujeito a uma espécie de lei da rolha que foi habilmente cozinhada, porque justamente se pensava que se fraquejasse esse elo, fraquejaria o F.C.Porto. Ainda me recorda de ler na imprensa, que sempre que Pinto da Costa aparecia publicamente, dizia-se à boca cheia que condicionava as arbitragens.
Depois do despoletar, do Apito Dourado, surgiu um forçado silencio deste, que Jesualdo Ferreira inicialmente com dificuldades (por ter um perfil mais reservado) a gerir, complicou as coisas, mas não o impediu de ganhar. Este ano, já assistimos a um Jesualdo Ferreira mais desinibido nas suas intervenções que serviu muitas vezes de escudo do clube. Tal como o Sporting de Paulo Bento, o F.C.Porto deixou muitas vezes demasiadamente exposto o seu treinador.
O Jesualdo Ferreira, mais vezes apelidado de Prof. Jesualdo Ferreira quando se passeava pelas bandas da capital, com o seu perfil reservado, que não dá murros na mesa, que não abandona conferências de imprensa, que não é perito nos modernos mind games, lá foi com altos e baixos gerindo a sua carreira no F.C.Porto. Tendo no entanto desempenhado tarefas de relevo. Meio à pressa teve que substituir o treinador holandês (das birras), alterando o romântico sistema de três defesas que arruinava o clube quando jogava no plano internacional e mesmo com os seus rivais directos. Conseguiu alterar para melhor as coisas, com uma equipa que não tinha escolhido, sem ter uma pré-época para explanar o seu modelo de jogo. Conseguiu gerir ao longo dos anos, as necessidades de vender jogadores influentes e colmatar com sucesso as suas ausências, chegando a conseguir a nível interno um domínio tão intenso que deixou os adversários directos a cerca de vinte pontos.
No ano transacto, penso eu, teve o seu maior desafio, colmatar com sucesso as saídas de dois elementos fundamentais, que impulsionavam o ataque e traziam alguma magia à equipa, falo dos casos de Quaresma e Bosingwa. De tal forma foi a necessidade de reconstruir a equipa, que este ano terminou o campeonato com apenas quatro a cinco jogadores que alinhavam no ano passado, preenchendo a equipa de novos jogadores que a imprensa constantemente levantava dúvidas do seu valor.
Termino este texto levantando algumas questões importantes, que merecem a reflexão de todos os Portistas:
Existe mais alguma equipa portuguesa que apostando num 4X3X3 (dinâmico), consiga lançar defesas no ataque, e atacantes na defesa em momentos chave duma forma harmoniosa e eficiente?
Salvaguardando a natural distância, não é isso o motor do sucesso de Pep Guardiola?
E já agora que treinador português da actualidade teria o arrojo de jogar em Old Trafford olhos nos olhos como Jesualdo o fez?
Não será de reflectir na componente de preparação, igualmente implementada, que permitiu ao F.C.Porto ter um índice de lesões musculares inferior aos seus adversários?
E a evolução nas qualidades de jogadores como Hulk, Fernando, Raul Meireles e mesmo Bruno Alves e Mariano Gonzalez?
Penso que o leitor nem que não concorde na íntegra com todas estas questões que eu levantei, pelo menos concordará que neste momento, me parece que Jesualdo Ferreira será a melhor solução de continuidade. Apesar de não ser o Mourinho 2 nem a Paula Rego do futebol, é uma pessoa humilde, educada e competente que faz falta no futebol português.
(*) Docente Universitário e, segundo o próprio, Portista desde o dia em que nasceu.
5 comentários:
No essencial, concordo com a análise, ainda que falte aí a referência à saída de Paulo Assunção, e à evolução de jogadores como Sapunaru e Cissokho. Diziam que não controlava o balneário, e esta época provou o contrário, ainda que o tenha feito em grande parte afastando os jogadores que não alinhavam no seu tipo de jogo (p.e. Ibson).
Jesualdo foi mal apreciado, e por mim falo, que apenas após os jogos com o Atlético e com o Manchester é que olhei para o professor e pensei "querem lá ver...", dois anos e meio depois de ter começado.
É humilde, é trabalhador, e de facto a muitos níveis está no top dos treinadores. Sinceramente, com o mesmo orçamento disponível, será que o Ferguson faria muito melhor?
O Jesualdo merece continuar, merece os nossos elogios e admiração, mas também penso que o Jesualdo que agora temos não é o mesmo Jesualdo que contratámos. Tornou-se ambicioso, ousado e mais comunicativo.
O professor é hoje melhor treinador, melhor comunicador e mais bem sucedido, e ficar-lhe-ia bem reconhecer que isso o deve ao F.C.Porto e à sua forma de estar no futebol.
Três frases que julgo muito reveladoras do perfil do nosso técnico (isto a propósito - ou a despropósito - da antevisão da final Barcelona-Manchester Utd):
- "Creio que Ferguson se vai apresentar com três médios de TRABALHO, para tentar bloquear o Barcelona";
- "Barcelona é uma equipa que só sabe jogar em ataque continuado e é particularmente forte em posse, mas isso vai criar espaços atrás";
- "Muitos gente espera que seja o Barcelona a vencer porque joga um futebol atractivo, com muita posse e troca de bola, um futebol até certo ponto ROMÂNTICO";
Creio que, por entrepostas pessoas (Barça e Man Utd), ficam bem vincadas as ideias-chave do nosso treinador.
Boas ou más, cabe a cada um julgar.
Já sobre o verdadeiro balanço destes 3 anos e desta súbita unanimidade em torno do professor, julgo ser melhor apenas falarmos quando entendermos as verdadeiras causas da demora na renovação do seu contrato...
Pacheco disse...
«O professor é hoje melhor treinador, melhor comunicador e mais bem sucedido, e ficar-lhe-ia bem reconhecer que isso o deve ao F.C.Porto e à sua forma de estar no futebol.»
Tal como muitos jogadores que ele ajudou a evoluir, também ele, Jesualdo Ferreira, evoluiu e é hoje melhor treinador do que era quando chegou ao FC Porto. Sobre isso não tenho dúvidas.
Luís Carvalho disse...
»desta súbita unanimidade em torno do professor»
É natural haver hoje mais defensores da continuidade de Jesualdo tendo em conta os resultados obtidos.
De qualquer maneira é necessário continuar a exigir um futebol com mais qualidade. Esta época no Dragão foi sofrível para dizer o mínimo. Não encontro mais do que uma mão cheia de jogos em que jogamos bem ou acima do mediano.
Para tal, o FC Porto tem de fazer melhores escolhas e reunir um plantel com mais alternativas.
Nas duas últimas épocas FC Porto teve um plantel demasiado curto.
Basta ver o que teria sucedido se o FCP tivesse eliminado o Manchester e fosse jogar as meias-finais da Champions sem Lucho ou Hulk. Se até nesta recta final do campeonato foi notoriamente sofrível ver uma equipa com Raul Meireles ou Rodriguez de rastos, sem Lucho ou Hulk e com os laterais Fucile e Sapunaru em dificuldades físicas.
Quem sabe se as alternativas não estariam nos jovens do plantel. Eu pelo menos não os vi muitas vezes.
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