O denominado Estádio Nacional era uma velha aspiração do Estado Novo. Influenciado por obras como o Estádio Olímpico de Berlim (construído para os Jogos Olímpicos de 1936), o regime ditatorial que governava Portugal procurava com este novo recinto, não só a promoção da prática do desporto, mas também a criação de um espaço para demonstrações públicas inspiradas nos princípios políticos vigentes.
Em ‘A Arquitectura em Portugal nos anos 1930-40’, José Manuel Fernandes (Universidade Autónoma de Lisboa) escreve o seguinte:
«muitos dos arquitectos formados em Lisboa, (...) seriam claramente e em muitos casos, adeptos de uma arquitectura neo-tradicional, ou neo-clássica, servindo desse modo os ideários da propaganda e da ideologia conservadora do Estado Novo – nomeadamente na chamada "Política de Obras Públicas" oficial.
As grandes obras públicas do Salazarismo do Estado Novo (...). Um grande estádio desportivo (Jamor), um grande Monumento Nacional (Sagres) e os Pavilhões de Exposições Internacionais constituem três casos paradigmáticos. (...)
O caso do Estádio Nacional, no Jamor (arredores de Lisboa), erigido entre 1938 e 1944, foi exemplar: obra de grande efeito cénico, (...) concebida pelo arquitecto paisagista Caldeira Cabral, integrada elegantemente na encosta (e não a meio do vale), ao modo dos anfiteatros da Antiga Grécia. Cabral era um técnico agrónomo que tinha uma formação muito mais actualizada, levada a cabo no âmbito da Escola Paisagista Alemã.»
Inaugurado a 10 de Junho de 1944, a primeira final da Taça de Portugal disputada neste estádio “helénico” teve lugar a 30 de Junho de 1946, colocando frente-a-frente dois clubes de Lisboa: Sporting e Atlético.
Desde aí, houve mais 59 edições da Taça de Portugal, e apenas em cinco ocasiões a final foi disputada noutro estádio (por quatro vezes a final da Taça disputou-se no Estádio das Antas – nas épocas 60/61, 75/76, 76/77 e 82/83 – e por uma em Alvalade, na temporada 74/75).
Contudo, é hoje unânime que o denominado Estádio Nacional não tem acessibilidades, parques de estacionamento, ou condições de conforto, higiene e segurança minimamente adequadas para um jogo de futebol, que fará para uma final da Taça de Portugal. Aliás, não é por acaso que a própria selecção portuguesa deixou de jogar lá. Também não há dúvidas que, após o EURO 2004, passaram a existir em Portugal 10 novos estádios, cuja qualidade é muitissimo superior à do anacrónico Estádio do Jamor.
Assim sendo, porque razão continua a haver a obrigatoriedade da final da Taça de Portugal ter de ser jogada no “helénico”, mas decrépito estádio de Oeiras (dito Nacional)?
Há uma explicação óbvia. Fazendo um balanço das 55 finais já realizadas no estádio de Oeiras, verifica-se que em 29 delas esteve presente um clube de Lisboa e em 13 foi mesmo disputada por dois clubes da “capital do Império”. Ou seja, 76,3% das finais realizadas no Jamor (42 em 55) tiveram, pelo menos, um clube de Lisboa a disputá-las.
Deste modo, quando em Março de 2004 o presidente da FPF, Gilberto Madail, pôs a hipótese da final da Taça de Portugal (entre o Benfica e o FC Porto) ser disputada num dos novíssimos estádios do EURO 2004, ninguém o levou a sério.
Reagindo a esta possibilidade, em 20/03/2004, o insuspeito Director do jornal A BOLA (Vítor Serpa) não podia ser mais claro: «O Benfica, perante a opção de jogar em Lisboa ou em qualquer outro ponto do País, defenderá, inevitavelmente, Lisboa.».
Na mesma linha de raciocínio, o ex-presidente do Sporting Pedro Santana Lopes escreveu na sua crónica em A BOLA, de 31/03/2004: «espanta-me que os alegados rostos do sistema, como Pinto da Costa e Valentim Loureiro, ainda não tenham conseguido remover do regulamento da FPF uma escória anacrónica que vem dos tempos da outra senhora e que assumiu foros de lei (...) Ora, alguém tem dúvidas de que o estádio Nacional favorece objectivamente as equipas de Lisboa? Penso que não. Porquê? Porque jogam em casa, um factor determinante. Passa pela cabeça de alguém que o Benfica teria conquistado sete das oito taças que disputou com o FC Porto se a final tivesse tido outro palanque? Se tem, consulte as estatísticas da Supertaça Cândido de Oliveira, que não se joga lá, e extraia conclusões.».
Estas afirmações do Director de A BOLA e de um ex-presidente do Sporting são de tal modo elucidativas, que não é preciso dizer mais nada.
O estádio de Oeiras foi construído para servir a propaganda do Estado Novo e o facto de ainda ser o local da final da Taça de Portugal é uma das heranças do sistema do antigamente que ainda perdura – o benefício claro e descarado dos clubes da “capital do Império”.
No próximo domingo, irá realizar-se mais uma final neste estádio helénico de inspiração nazi. A pergunta que se impõe é: até quando?
Não embarco completamente nas conclusões do artigo.
ResponderEliminar1) penso que sim, os clubes de Lisboa têm vantagem em jogar em Oeiras, mas essa vantagem hoje em dia é marginal.
2) Choca-me q a final se faça em Oeiras não tanto por causa de ser num estádio nacional, mas sim porque ESTE estádio nacional não tem as mínimas condições (são certamente muitíssimo mais baixas do q qualquer um dos 10 estádios do Euro 2004).
Também em outros países se joga a final da taça num estádio nacional: Inglaterra e Bélgica são apenas 2 exemplos. O q é diferente é q os estádios nacionais deles são do melhor q há no país, ao contrário do caso português.
Ora como não somos ricos e já temos 10 bons estádios espalhados pelo país, não fará sentido nenhum investir num estádio nacional novo. Chego pois à mesma conclusão, de q a final devia ser "ambulante": sugiro q deviam ser pré-seleccionados/reservados no início da época 3 dos melhores estádios (a norte, ao centro, a sul) e depois sabendo-se quem são os finalistas escolhia-se o estádio (de entre os 3) q minimizasse a deslocação dos adeptos.
Esqueci-me de mencionar uma coisa: a comparação q o Santana Lopes faz entre o resultado das finais da taça entre slb e FCP com os resultados das supertaças tem relevância, mas muito pouca.
ResponderEliminarÉ q a grande diferença é q o slb e FCP defrontaram-se nas finais da taça *principalmente* nas décadas áureas do slb; já na supertaça é ao contrário.
Esta sim é a maior explicação para a discrepância no deve-e-haver nos embates entre os 2 clubes nas 2 competições.
«Também em outros países se joga a final da taça num estádio nacional: Inglaterra e Bélgica são apenas 2 exemplos.»
ResponderEliminarEste tipo de argumento é muito fraco e, para mim, não tem qualquer tipo de validade.
Já agora, fazes ideia de qual é a percentagem de finais da Taça em Inglaterra, França ou Bélgica que contou com pelo menos um clube da respectiva capital?
«os clubes de Lisboa têm vantagem em jogar em Oeiras, mas essa vantagem hoje em dia é marginal»
ResponderEliminarPara os adeptos é que, de certeza, a vantagem não é marginal.
Sem contar com o tempo gasto, em termos de custos qual é a diferença entre ir do Porto ou ir de Lisboa assistir a uma final da Taça de Portugal a Oeiras?
Porque razão os adeptos da área de Lisboa são tratados como filhos e os do resto do país como enteados?
Para a FPF há adeptos de 1ª e adeptos de 2ª?
«a grande diferença é q o slb e FCP defrontaram-se nas finais da taça *principalmente* nas décadas áureas do slb; já na supertaça é ao contrário.»
ResponderEliminarDesde que o FC Porto se "emancipou", perdeu 5 finais da Taça de Portugal no Jamor contra equipas de Lisboa.
1977-78: Sporting
1979-80: Benfica
1980-81: Benfica
1984-85: Benfica
2003-04: Benfica
Em três destas épocas - 1977/78, 1984/85, 2003/04 - o FC Porto chegou ao Jamor tendo acabado de conquistar o título de Campeão Nacional.
Logo, a comparação que o Santana Lopes fez tem alguma razão de ser.
José Correia, muitos parabéns pelo texto e a evocação desse pechisbeque do regime como há muitos anos lhe chamei em O Jogo.
ResponderEliminarIa também lembrar ao jose rodrigues as finais perdidas pelo FC Porto enquanto campeão nacional presente no Jamor.
Os argumentos das finais de vários países não colhem. A ideia de fazermos do Jamor como Wembley é simplesmente idiota. Um insulto até.
E quanto aos adeptos, o cerne da questão, decerto o josé rodrigues é daqueles que ou nunca lá foi ou está perto e não custa nada.
É sempre assim, o umbigo lisboeta, l'ombeligo del mondo!
Já tinha jurado não voltar mais ao Jamor onde fui 4 ou 5 vezes. Mantive a promessa em 2006 e custou-me muito porque tenho muita simpatia pelo V. Setúbal a quem ganhámos nesse ano. Simpatia porque o único troféu que não vi o FC Porto ganhar desde que nasci foi em 1968 contra os sadinos.
Mas, apesar da classificação desta época não o revelar, esta final já está contextualizada num ambiente mais difícil que nunca. Por isso lá vou eu. Espero que, ao contrário de 2004, a nossa superioridade de toda a época tenha reflexo e venha de lá o caneco.
Também espero que sim, Zé Luis.
ResponderEliminarEm 2004 começamos a perder o jogo na arbitragem habilidosa do Lucílio e acabamos com a insegurança fora de postes do Nuno.
Espero que este ano não aconteça o mesmo. E, já agora, que a equipa aprenda com os erros cometidos nos jogos contra os viscondes. Por isso deve ser dada especial atenção aos remates de Vukcevic e Izmailov, que sacam sempre a 'mijinha' do costume contra o FC Porto.
Em caso de vitória, esta deve ser dedicada aos sócios, que têm visto o nome e a imagem do clube ser denegrida sem qualquer reacção pr parte da Administração.
"E quanto aos adeptos, o cerne da questão, decerto o josé rodrigues é daqueles que ou nunca lá foi ou está perto e não custa nada."
ResponderEliminarEm primeiro lugar, foi a várias finais da Taça, vivendo no... Porto.
Em segundo lugar, em lado nenhum soneguei q é mais fácil deslocar-se ao estádio vivendo-se perto dele. Aliás, se não fosse assim eu não teria advogado q a final seja relativamente perto dos adeptos, como fiz na parte final do meu comentário.
Em terceiro lugar (e este é o ponto mais relevante de todos), eu não misturo as coisas. Estávamos a falar de q o jogo em Oeiras aumenta as possibilidades dos clubes de Lisboa a ganharem; ora eu aposto q amanhã vamos ter tantos adeptos do FCP em Oeiras como do SCP. Há anos q os bilhetes são distribuídos proporcionalmente, e da parte do FCP a procura é (e será sempre) superior à oferta (até pq eu não me esqueço, se calhar ao contrário de outros q aqui comentaram, q o FCP tem muitos adeptos na Grande Lisboa).
Não é pois por aí q o FCP não ganhará finais. Não misturemos os argumentos, por favor.