Costumava cruzar-me com um moço vestido a rigor com o fato de judoca e que aproveitava o passeio como tapete para simular os golpes marciais, que mimetizava a preceito e que acompanhava com "urros bestiais", tradicionais daquelas disciplinas orientais.
Certo dia, no fim do período estival, o judoca ao passar parou de repente e sobre mim simulou um golpe marcial que me fez recuar. Receoso das suas intenções, disse-lhe muito sério: “Que é isso?”.
Respondeu-me com toda a serenidade: ”Fosga-seee, não tenha medo, não ataco pessoas indefesas. Estou apenas a treinar os golpes que aprendi esta semana. Adoro as artes marciais e sou conhecido lá no bairro por Karaté Kid, porque acham-me muito parecido com o artista. Não perco um filme do género, fosga-seee”.
Deu meia volta, deixou-me a falar sozinho, e foi pela rua abaixo a simular golpes improváveis, repetindo os berros marciais que deixavam os transeuntes espantados e traziam às portas das lojas muitos curiosos para espiar o que se estava a passar.
Não tive nenhum encontro imediato de qualquer grau com o Karaté Kid, durante uns meses.
Hoje, vi o moço: andava a correr no jardim de Arca de Água com a camisola do FCP, como se estivesse a fazer treino de aquecimento para disputar um qualquer jogo de seguida.
Reconheceu-me e disse-me: ”Fosga-seee, lesionei-me gravemente num pulso e tive de deixar as artes marciais. Como gosto muito de futebol e do FCP, vou tentar entrar na equipa. Meti uma cunha e tenho esperança de poder vir a ser o futuro defesa esquerdo. Sou canhoto, e ando numa academia a aprender os passos de dança latina, pois vi num filme que ajudam muito no passe e no drible no futebol. Fosga-seee! O que é que acha?".
Comentei, o mais sério que me foi possível: “Oh Karaté Kid, vi o filme mas esses passos da dança latina eram próprios para um atacante, o que não é o seu caso. Para si, e para um defesa esquerdo, acho mais conveniente uma dança tradicional nossa, e aconselhava-lhe o malhão ou a chula”.
Ficou muito sério a ponderar o que lhe tinha dito. Andou de um lado para o outro, muito pensativo, como se estivesse a tomar uma decisão muito importante para a sua vida. Parou e disse-me: “Fosga-seee, tem razão. Vou deixar as danças latinas e vou para o rancho folclórico da paróquia aprender o malhão. E, fosga-seee, a partir de hoje deixo de ser o Karaté Kid e passo a ser o Chula, futuro defesa esquerdo do FCP. Fosga-seee!”. Olhou para mim e desandou em passo de corrida para destino incerto, seguro de um futuro certo no clube do seu coração.
Esse rapaz não era avançado?
ResponderEliminarOntem o nosso defesa esquerdo "desapareceu" (mais uma vez) no meio daquele nevoeiro.
ResponderEliminarO pior é que me parece que vamos continuar o nosso sebastianismo na espera por um defesa esquerdo em condições.
Sobre o jogo de ontem fica apenas a excitação da comunicação social, nomeadamente da RTP e da SIC. Rodrigues dos Santos introduziu a rubrica do desporto naquele seu ar apalermado do costume com a frase: "a equipa do FC Porto foi derrotada pelo Nacional na Madeira". Ficámos a saber mais uma vez que quando o adversário vence é o FC Porto que perde e quando os lisboetas perdem é o adversário que vence. Enfim, pormenores...
Isso e a apreciação "não se ve, mas deve ter sido de certeza um belo golo do nacional"...
ResponderEliminarExcelente e deliciosa história...
ResponderEliminarMas estão mesmo a falar a sério ou é ficção?