terça-feira, 21 de outubro de 2014

O que passa aos Leões de Bilbao?

Quis a ironia do destino que o FC Porto fosse jogar hoje no Dragão - no dia em que José Maria Pedroto celebraria o seu aniversário - com aquele que foi o seu primeiro rival das "Noites Europeias". O Bilbao que participou naquela edição da Taça dos Campeões Europeus chegou via o segundo lugar obtido na liga espanhola. Como o campeão europeu e espanhol era o mesmo - o Real Madrid - a UEFA abriu uma vaga ao conjunto basco que eliminou o FC Porto antes de cair frente ao Manchester United dos Busby Babes numa das primeiras grandes batalhas europeias da história a duas mãos. Naquela época havia um critério geográfico para colocar frente a frente os rivais na primeira pré-eliminatória e não havia muita volta a dar. O FC Porto caiu de pé contra uma equipa que era claramente superior. Muitos passou desde esse momento. O Bilbao dessa altura era um "Grande" por direito próprio em Espanha e até aos anos cinquenta tinha mais titulos que Real ou Atlético de Madrid. Mas as provas europeias nunca foram o seu forte - apenas duas finais, perdidas, frente à Juventus e Atlético de Madrid, sempre na UEFA/Europa League. Ao contrário de nós como todos sabemos, hoje "Grandes" sim, mas da Europa.



No entanto havia quem pensasse que este projecto desportivo do Bilbao tinha tudo para dar uma boa imagem na Champions deste ano. O técnico Ernesto Valverde aproveitou o trabalho desenvolvido por Marcelo Bielsa e removeu a componente do conflito emocional habitual no treinador argentino. O ano passado montou uma equipa extremamente sólida na defesa e eficaz no ataque. Mesmo sem Javi Martinez e Fernando Llorente - peças chave do plano bielseano - conquistou o quarto lugar com autoridade. Nunca ameaçou realmente o trio da frente (era impossível) mas manteve sempre debaixo de olho a Villareal, Valencia e Sevilla. Dessa equipa para este ano houve apenas uma mudança substancial, a saida de Ander Herrera para o Manchester United. Pela cláusula. O Bilbao não é um clube vendedor e quem quer que queira um jogador seu sabe o que tem de fazer. Ou espera pelo fim do contrato ou bate a cláusula. Vantagens de quem vive da filosofia exclusivista de jogadores de ascendência basca (inicialmente eram apenas vizcainos mas isso foi mudando com os anos) e não precisa de ir ao mercado contratar jogadores salvo aqueles que já tem debaixo de olho desde os anos da formação. Mantendo treinador e o grosso do plantel muitas eram as expectativas para este ano. A forma exemplar como a equipa basca eliminou o Napoli - nunca pêra doce - com uma exibição personalizada no San Paolo e uma noite europeia das antigas no novo San Mamés - deixavam claro que as percepções iniciais pareciam confirmar-se. Eu disse na altura do sorteio que o Bilbao era o grande candidato a ganhar o grupo e que entre nós e o Shaktar se discutiria a segunda vaga. Hoje é dificil dizer o mesmo até porque à fraquissima performance europeia (empate com o Shaktar, derrota com o BATE) alia-se uma péssima participação na liga espanhola.

Em termos tácticos nada mudou do Bilbao do ano passado para este.
Em lugar de Herrera o meio-campo que Valverde coloca sobre o terreno de jogo não varia demasiado da variante que já utilizava no ano passado. A Iturraspe - um belissimo futebolista - unem-se Oscar de Marcos, Markel Susaeta e Iker Munian na linha de ataque. O seu acompanhante no meio-campo pode variar entre o "Pirlo basco", Beñat, ou uma abordagem mais fisica que oferece Mikel Rico. O primeiro além de pensar muito bem o jogo é um maestro das bolas paradas mas a capacidade fisica do segundo convida a pensar que pode ser mais útil a Valverde logo à noite. No ataque o golo é coisa de dois, o temivel Ander Aduritz e o oportunista Ibai Gomez, dois jogadores que precisam de pouco espaço e tempo para marcar. Não é estranho que ocasionalmente joguem os dois numa especie de 4-4-2, em jogos em casa, mas esse é um cenário dificil quando a coisa está tão apertada e o encontro é longe de San Mamés.
É uma equipa vertical, que sabe controlar bem os ritmos de jogo e domina à perfeição as rápidas transições entre um defesa que é uma pedra como stoper e um maestro na condução do esférico como Laporte, e a frente de ataque. No entanto esta temporada revelou também uma equipa que é bastante frágil a defender e que lhe custa criar oportunidades de golo. Apesar de todo o potencial ofensivo com que conta - o mesmo da época passada - torna-se cada vez mais complicado ao Bilbao criar verdadeiro perigo na área contrária. O meio-campo tem perdido mais bolas do habitual, deixando espaços atrás que qualquer equipa rápida e organizada saberá aproveitar. E Gorka Iraizoz, um guarda-redes de luas que no ano passado salvou a equipa em muitos jogos, não tem estado no seu melhor.



O que se passa afinal aos Leones de Bilbao?
Há quem aponte este péssimo arranque de época a um esforço muito grande para ter toda a equipa a 100% em Agosto, para a prévia, que depois se está a fazer pagar neste mês e meio. Fisicamente os jogadores não são os mesmos e esse cenário em Espanha não é novo. Já aconteceu com a Real Sociedade, o Villareal, o Celta de Vigo ou o Bétis. Equipas que surpreendem ao classificarem-se no quarto lugar da liga, apostam tudo por entrar na fase de grupos de Champions mas depois são incapazes de viver com a exigência de estar fisica e mentalmente a 100% nas duas competições. A Celta e Villareal esse desnorte custou inclusive a despromoção e a Real Sociedade que tanto prometia no ano passado terminou a época longe de repetir façanha. O Bilbao actualmente está na mesma linha. É dos últimos na liga espanhola - também é certo que já jogou contra Barcelona e Real Madrid - com uma vitória e apenas cinco golos marcados em oito jogos. O treinador Ernesto Valverde já foi claro em indicar que a máxima prioridade do clube é a liga (o Bilbao é um dos três clubes em Espanha que nunca foi despromovido) e depois deste noite, salvo um resultado surpreendente no Dragão, selô-à mais ainda. De favoritos a seguir em frente agora há quem não tenha muitas duvidas que serão últimos de grupo. E em Bilbao pouco se importam. A situação vivida na liga parece de tal forma dramática - na última década o Bilbao já esteve um par de vezes perto do abismo - que ninguém criticará a Valverde por abrandar o ritmo na competição que todos queriam jogar. Esperem hoje um Bilbao aguerrido sim, de orgulho ferido, mas com a cabeça e o corpo noutro lado. Depois da derrota contra o Sporting os bascos são, provavelmente, os leões perfeitos para caçar!

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