É sempre uma
alegria especial quando o FC Porto levanta um título mas talvez seja maior
ainda quando são títulos dos putos. Os putos da casa. Os que sentem a camisola,
muitos deles andam ali desde muito pequenos. São o nosso ADN e seja qual for o
futuro que lhes depara, sempre vão ser parte nossa. A formação do FC Porto foi
campeã da Europa há um mês e sagrou-se campeã nacional ontem. Uma dobradinha
sem paralelo na história do futebol português. O impacto mediático foi quase
nulo em ambos casos. O FC Porto forma bem, muito bem, mas vende-se mal, muito
mal. Para muitos esse é um problema. Não é. O grande problema é outro. O FC
Porto forma bem, muito bem, mas aproveita pouco, muito pouco. Esse é talvez o
maior desafio com que nos encontramos para o futuro imediato. Aproveitar uma
geração excelente ou deitar fora uma oportunidade histórica para beneficio próprio de uns poucos.
Durante anos
ouvimos lenga-lengas sobre a impossibilidade de ser competitivo recorrendo a
jogadores da formação. O exemplo claro era o Sporting, um clube que raramente
deveria servir de exemplo para o que fosse (formaram o melhor jogador europeu
de sempre e deixaram-no sair por tostões), e o discurso apontava à necessidade
de experiência, maturidade e que a formação fosse apenas um complemento. Claro
que o Barcelona tratou de desmentir isso mas como tinham um génio absoluto como
Messi tudo ficou relativizado. Também não ajudou o facto do Porto, entre a era
Mourinho e os anos de Conceição, realmente, não ter tido uma grande formação.
Geraram-se grandes expectativas com alguns jogadores pontuais mas nunca nenhum
deu verdadeiramente o salto. Havia alguns títulos mas zero impacto no plantel e
na própria evolução da carreira de muitos jogadores. Atrás tinham ficado os
anos 90, onde havia realmente prata da casa de grande nivel. E apostar quando
não há qualidade faz pouco sentido apostar forte, ainda que faz menos ainda ter o plantel
recheado de jogadores piores vindos de fora para papeis absolutamente
secundários quando a prata da casa podía cumprir perfeitamente essa função. As
comissões, já sabemos.
O paradigma
começou a mudar nos últimos anos, pouco a pouco. Foi-se trabalhando melhor,
desde a base, mas esse trabalho leva o seu tempo. Os que hoje são campeões
europeus e nacionais levam cinco, seis anos nessa dinâmica. Havia que esperar. Mas entre essa espera e o agora houve 4 casos singulares que explicam bem o que é a formação
do FC Porto e como o clube a vive. E aí é onde se pode entender a gigantesca
diferença entre o FC Porto e o Benfica.
Lá em baixo vendem o Seixal como o novo
Alcochete, o centro por excelência da formação mundial e talvez europeia. Foi
sem dúvida uma jogada acertada terem contratado muitos dos treinadores e
olheiros do Sporting e a qualidade subiu exponencialmente nos últimos anos, é
impossível discutir. A formação do Benfica é boa, bastante boa. E vende muito
porque estamos em Portugal, um país que fez do Mantorras o Eusébio. O minimo é
que tivessem feito do Bernardo Silva o novo Cruyff. Mas tem algo que continua a
faltar ao FC Porto, uma ideia de clube. Quer queiramos quer não a estrutura
actual do FC Porto não existe. Sobrevive um Politburo soviético na pré-reforma,
desfasado do tempo e onde primam os intereses pessoais ao mesmo tempo que se
afiam facas. Cada decisão é vista sob essa perspectiva, a quem interessa, como,
quanto e porquê. O Clube normalmente tem ficado para último plano com
regularidade. No Benfica isso não acontece porque o seu Presidente, como o
nosso foi durante décadas, não tem contestação e as suas decisões são a base da
política de todo o clube. E é por isso que a formação do Benfica tem sido aproveitada
e rentável, porque tudo é feito do primeiro ao último dia para ser assim. São
vendas fáceis, sem custos, tê-los na primeira equipa é algo mediaticamente popular
com os adeptos e permite criar uma liturgia óbvia de rendição ao mercado para
beneficio do clube ("nós não queriamos vender, mas...". Por isso, desde há cinco anos para cá, uma formação pior
que a nossa tem tido na primeira equipa mais jogadores (e a experiencia, quando
se dá o salto, é FUNDAMENTAL) e portanto gerado mais valias superiores às que
possamos gerar. No Porto, nesse periodo, há 4 jogadores que realmente tiveram
um impacto minimo da formação, um abismo. Desses 4 um deles – Ruben Neves – tem
o 60% dos jogos disputados. E não foi uma aposta do clube, foi uma aposta muito
pessoal de um treinador que não teve problemas em fazer com que o jogador
saltasse escalões porque tinha esse nivel (olá Fábio!!). E tem-o. Já o provou no campeonato
mais exigente do mundo, com um treinador que contribuiu também para a sua
desvalorização de mercado perante o olhar sereno de quem manda. Não esquecemos!
O restante 30% dos jogos disputados divide-se
por André Silva, Diogo Dalot e Gonçalo Paciência. São 3 casos muito diferentes
em si mas que resumen muitas coisas.
André podia e devia ter ficado um ano
mais. Ele era o primeiro a necessitar disso como tem provado a sua lenta
evolução no Milan e Sevilla. Promete muito mas custa-lhe dar o salto, essa paciência
que faltou num ano mais de etapa formativa na equipa principal do Porto (ele
que no ano NES levou o ataque sozinho às costas,lembram-se?).
Porque foi vendido? Porque
uma gestão absolutamente desastrosa do Politburo teve as suas consequências
práticas e era uma obrigação da UEFA cumprir com o FFP. Quando um clube é mal
gerido, como o FC Porto tem sido, dentro e fora de campo, é o que sucede. Ter
jogadores do nivel do André e não os aproveitar por culpa própria é uma pena
mas pode passar. O caso Dalot é diferente. Há anos que o Dalot estaba bem
referênciado por essa Europa fora, não enganava ninguém. Num clube com uma
estrutura sólida dos pés à cabeça, com ideia de clube desde a base, o Dalot
teria renovado muito antes do tempo. Quando o dossier chegou às mãos do novo
director desportivo, Luis Gonçalves, a sua vontade não bastou, já era tarde.
Nestas idades basta um movimiento em falso e tudo se pode perder e foi o que
aconteceu (como o Barcelona, quando perdeu Pique e Fabregas para United e
Arsenal pelos mesmos motivos, não somos um caso virgem, muito longe disso). O Dalot foi à procura do contrato da vida dele
porque durante anos não foi mimado como seria expectável para quem,
seguramente, será um lateral de topo europeu na próxima década. O desleixo foi
evidente e quando se quis corregir já não havia margem.
E Gonçalo? Gonçalo não
tem perfil para titular do FC Porto, é um jogador muito limitado (no modelo de jogo táctico e na sua fragilidade física) e não vale a
pena andar a vender narrativas em que é bom ter 11 titulares da casa se esses
não estão à altura. O Gonçalo não está. Mas um plantel tem 23 ou 25 jogadores,
o do Porto e o de qualquer outro clube. E as provas da UEFA exigem um minimo de jogadores da casa nos inscritos. E quando há vagas para dois ou três
avançados suplentes, convén sempre ver os prós e os contras. Dizer que o
Gonçalo não tem nivel de titular Porto não significa que não tenha nivel para
ser plantel Porto. Não é inferior nem foi inferior a sua aportação a Adrian
Lopez (o último resquicio da entrega do clube nas mãos de Mendes). Muito menos
de Waris, uma escolha pessoal de Conceição. Ou de Andrade, outro jogador
escolhido a meias entre técnico e estrutura que além de ser um desatre ocupou uma vaga no plantel Champions que podia ter sido de Manafá, por exemplo. Todos esses 3 negócios custaram ao
Porto dinheiro, muito mais do necessário e muito mais do que foi recebido em
troca. Gonçalo custava 0. Não é pior jogador do que André Pereira (que faz
parte dessa política e foi uma escolha pessoal do treinador) e seguramente
exemplifica outro dos usos possiveis para a formação. Nunca vai render milhões,
não está para ser titular mas pode perfeitamente dar forma ao plantel. E foi
repatriado para longe. Sem sentido.
O Benfica
vende-se melhor mas também mima mais os seus. O Sporting, no longinquo apogeu
da sua formação, vendia-se muito mais do que aproveitava os seus, mas ainda
assim as suas grandes pérolas foram somando bastantes minutos. Quando um
jogador salta dos juniores ou da equipa B o que precisa é disso. Minutos,
confiança, apoio do treinador, paciência dos adeptos. O FC Porto tem tido muita
dificuldade nesse processo. O treinador é claramente arisco a apostar na
formação. Diz que só responde ao Presidente, o mesmo que diz que há muito
jogador a aproveitar. Algo não cuadra. Sabemos que há gente que se move como
sombras pela formação à procura da próxima comissão (basta ver o filho-agente
ou o homem que se levou parte do negócio Ruben Neves para casa para entender) e
talvez isso jogue contra os putos quando quem tem de se decidir por pô-los a
jogar ou não é um homem extremamente emocional que sabe que tem inimigos dentro
de casa que estão mortinhos por vê-lo sair para continurem a fazer o seu
trabalho sujo e a sacar a sua suja recompensa. Sabemos tudo isso. Mas
continuamos sem entender porque Fabiano é opção em jogos que podiam ser de
Diogo Costa. Porque Diogo Leite desapareceu do mapa, porque Diogo Queirós tem
zero minutos com a equipa principal quando está referenciado por olheiros dos maiores clubes da Europa como o futuro De Ligt. Porque nunca houve espaço para o Bruno
Costa além dos jogos com o Liverpool ou porque nem mesmo nas Taças (esas obsessões
de Conceição) não tivemos a oportunidade de começar a ver as jogadas do Baró ou
os golos do Fábio.
São campeões europeus e nacionais, são jogadores com o ADN da
casa e que já mostraram ter o carácter ganador que se procura num futebolista
de elite. E são jogadores com talento, é evidente. Não precisam de ser capas de
jornais mas precisam que apostem neles. Uns vão ser vendidos por milhões
seguramente porque o mercado é o que é e não vale a pena criar ilusões de que os vamos agarrar para todo o sempre. Mas também há outros muitos que poderiam acumular anos no
plantel jogando mais ou menos. Quando virem as histórias deste ano
futebolistico, muitos vão olhar para o Ajax, semi-finalista da Champions e
campeão nacional com jogadores que têm praticamente a sua idade e jogam sem
medo porque têm a confiança de quem neles aposta. Ninguém quer um FC Porto com
11 jogadores da casa porque não seria realista mas depois de anos a atravesar o
deserto quem pode não querer um 11 – e mais com a hemorragia que o plantel vai
sofrer este verão – onde esses putos tenham o seu espaço para crescer de mão
dada com os que já estão e com o apoio de todos?
Mais comissões.
Mais dinheiro gasto em vão. Mais bolsos cheios de meia dúzia de sanguessugas.
Mais miudos
campeões. Mais ADN Porto. Mais negocios futuros de máxima rentabilidade para o
Clube e não para quem o rodeia.
Nunca foi tão
evidente o dilema e nunca a resposta que o FC Porto der nos próximos tempos vai
ser mais exemplificativa de que clube estamos a falar para hoje e para amanhã.
E se o Jorge Jesus vier a substituir o Sérgio Conceição (porque nunca esteve tão perto e possível de acontecer), mais negociatas e mais comissões irão ocorrer...e menos jovens a aparecer.
ResponderEliminarPedro Martins
Não basta falar de formação, mas também de infraestruturas. Alcochete e Seixal têm uns 10/15 campos relvados, campos cobertos, o não-sei-quê 360º, espaço residencial para os jovens, etc... Nós temos o Olival que não é nosso, com 2 campos (1 dos quais tem de ser poupado para a competição e treinos da equipa A), e pouco mais. São realidades completamente diferentes. É normal que os putos (e famílias) prefiram estruturas mais profissionais, e sabendo que têm mais possibilidade de futuro. E se se confirmar contratações como "Ricardo Costa", é a prova de que o FCPorto se está borrifando para a formação...
ResponderEliminarMuito gostava de acreditar que existe algum dilema. Que fique bem claro, esse dilema só se for na cabeça dos adeptos.
ResponderEliminarEstamos entregues à bicharada, o nosso clube vai gastar milhões em brasileiros e argentinos, e vamos continuar a cair a pique....
ResponderEliminarNão menosprezando o valor do jogador, um Oliver a menos dava para um centro de formação.
ResponderEliminarAlgo acredita que o atual FC Porto, é capaz de renovar com algum talento da sua formação com cláusulas superiores a 50 milhões € ??
ResponderEliminarOs nossos miúdos ou não renovam ou não passam a fasquia dos 25 milhões €.
Nesse particular temos de nos render ao Benfica.
Li o seu texto com interesse (julgo que merece uma revisão no corrector ortográfico) e concordo com grande parte do que escreveu. Na minha modesta opinião de adepto, que não é sócio porque recusa contribuir para a máfia de interesses/comissionistas que controla e desgraça o nosso clube, nunca o F. C. Porto teve um ambiente tão favorável para recuperar a hegemonia do futebol português e continuar a ser uma referência a nível mundial. Basta olhar para as nossas bancadas e ver uma geração de jovens bem formados, que nasceram e cresceram a ver este clube a ganhar a nível nacional e internacional, que acabaram com a imagem do "adepto grunho do norte/Esteves(Herman)", que mostram ser fieis incondicionais do clube mesmo nos piores momentos (ver o apoio que o Porto em toda a última época) e que vão acabar com o mito do país 60% vermelho. Pena é que um clube destes continue a ser administrado por Adelinos, Fernandos, Reinaldos, ... e todos os que gravitam nas suas esferas de interesses. Não me esqueço de tudo o que devemos ao nosso Presidente, mas já há algum tempo que é parte do problema e não parte da solução. Não posso compreender que, ao longo destes anos, não tenha encontrado alguém, jovem e com valor, capaz de o ajudar a renovar este clube e a garantir um projecto para o futuro.
ResponderEliminarRelativamente à formação, julgo que temos de ter uma base de 15 a 16 jogadores de qualidade inquestionável, independentemente da sua idade, nacionalidade e origem, para podermos continuar na elite do futebol mundial. O resto do plantel deveria ser composto por jovens, prioritariamente da formação, com potencial e qualidade para poderem ser opção. A história do Ajax é muito bonita, mas acontece de 20 em 20 anos. Na última década, o F. C. Porto chegou 6 vezes aos oitavos de final da Champions, o SLB 3 vezes e o Ajax 1 vez, precisamente na última.