domingo, 20 de julho de 2008

Crónica de uma noite de Verão


Sou considerado o (pseudo) intelectual do grupo, vá-se lá saber porquê. Cá no sítio, e com a supervisão da Junta, organizo – uma vez por semana – a “quadratura do círculo cá do meu bairro”, esta semana dedicada ao tema: “O Apito Final”. Sou o moderador. Pedi dispensa, com carácter excepcional, mas não me foi concedida. Passo a apresentar os restantes participantes: o Zé da Frutaria (dono do pomar) e a companheira (Rute Marlene, dona da peixaria), ambos portistas, o Santos (o príncipe das retrosarias), benfiquista disfarçado de boavisteiro, o Silva (empresário de restauração), benfiquista, o Pinto (porteiro de bar), sportinguista, o Ilídio (técnico de arrumação de carros), doido por automóveis e anti-futebol e a Svetlana (estudante universitária russa), simpatizante do FCP.

Eram nove horas da noite quando abri a sessão. Notava que os rostos estavam tensos. Pedi elevação e que não houvesse interrupções, nem bocas foleiras, de uns para os outros. Havia muita cerveja fresca, pouca água, fiambre, queijo, chouriço, pão de forma, café e miniaturas, para aconchegar a discussão.

Limitei o tempo de intervenção a 3 minutos e ninguém tinha direito a bis, enquanto houvesse novos oradores a pedir o uso da palavra. “Está aberta a sessão”, exclamei solenemente. O primeiro a inscrever-se foi o Zé da Frutaria, seguiu-se o Silva, o Pinto e o Santos. Depois, foi mais ou menos a balbúrdia que deixei correr. Infelizmente. Foi assim que se passou e consta da acta:

da Frutaria: Mais uma cabazada do FCP. Desta vez até o Caldeira, que é um "torto", lhes deu um baile. Dizem para aí uns ressabiados que o gajo é um pau mandado da Olivedesportos e apenas tinha serventia para representar o clube nos torneios de golfe. Pois, agora, o homem - com quem não simpatizava nem um bocadinho -, deu a tacada mais certeira da sua vida e virou do avesso a opinião da nação portista. Quanto ao Costinha da Liga e aos 5 matulões da Federação, só resta um caminho: pedirem ao Vieira emprego, pois são bons para encher pneus. Digo mais, são uns grandes...

Santos (interrompe): O que o Zé disse é insultuoso e uma cabala. O Platini é que vos topou. Esse é que vos conhece de ginjeira. O presidente do SLB – tomem nota e repito pela enésima vez: EU NÂO SOU BENFIQUISTA – tem toda a razão. O homem bate-se pela verdade desportiva e tem tido um comportamento exemplar, como comprova a sua vontade (confessada) de não querer que o SLB tirasse partido da exclusão do FCP na CL. Isto é que é um exemplo. A UEFA vendeu-se. É pena que o PGR e a PJ não tenham poder sobre essa máfia. Incrível a decisão do TAS, tendo em conta...

Rute Marlene (não lhe permitindo continuar) - Oh Santos cale-se que só está a dizer asneiras. Você é do Boavista e só fala das galinhas. Não está preocupado com a descida de divisão ou continua fascinado com o voo da gaivota. Continuou, cantarolando: uma gaivota voava, voava, cheia de pó nunca mais parava. Chamem a polícia, chamem a polícia...

Svetlana (interrompe: põe-se de pé e fez-se silêncio. O que a mini saia e o pequeno top não tapavam deixou todos sem fala) – Qual polícia? O SLB é o dono do regime. Conheço jogadores, treinadores, árbitros, dirigentes, autarcas, assessores, empresários, advogados, juízes e todos são unânimes: o SLB é intocável. Um Estado dentro do Estado, como repetidamente o mestre – que também conheço muito bem – não se cansa de repetir. Só por isso não os gramo: parecem os donos do país. Nem o Putin tinha tanto poder na Rússia. Uma vergonha. Tenho dito e sentou-se.
Generosamente, continuou a proporcionar-nos uma vista magnífica.

Ilídio - Por tudo isto e aqueloutro é que detesto a bola. O Futebol é o ópio do povo. E serve para calar...

(interrompendo) – O ópio de quem? Não estás enganado e a confundir toucinho com velocidade?


Ilídio
- Oh Zé não me interrompas. O Pacheco Pereira e o Rui Rio é que têm razão. O país vive para o futebol, como se a bola comandasse a vida. Gosto de carros e sou um apaixonado pelo desporto automóvel, mas não sou fanático. O fanatismo é o pai de todos os males. Proibi em casa o futebol e resolvi o problema.

– Pois resolveste. Os teus filhos saíram de casa. A tua mulher deixou-te. Gostas de automóveis, mas já não aceleras.

Ilídio – Se voltas a falar da minha vida particular, não respondo por mim.

Achei por bem e fiz uma interrupção de dez minutos para dar de beber à dor. Quando senti os ânimos mais calmos, recomecei. A cerveja esgotou-se como por encanto. Reabri os trabalhos e dei a palavra ao Pinto.

Pinto - Não me dou com estas confusões. Felizmente o meu clube é verdadeiramente aristocrático, na melhor acepção da palavra. Temos o Hermínio e o Vítor que são umas feras, assim a modos que leões amansados habituados ao circo, em postos de comando. Desta forma, acautelámos a nossa representação na Liga. Somos chorões, campeões de grandes penalidades e com muitos figurões. Berrámos muito – quem não berra não mama – e calámos sempre que é conveniente. Sempre no timing exacto. Ouviram falar mais daquele imbróglio aquando da contratação de João Pinto? Não, obviamente. Somos um clube de misteres e de presidentes da república. Este ano vamos ser campeões e vamos bater o nosso recorde de grandes penalidades. Está tudo previsto. Somos os príncipes do planeamento.

Luís – Tenho aqui um documento a que tive acesso privilegiado, que conta como um árbitro foi aliciado para assinalar um fora de jogo contra o FCP, quando o atacante azul e branco se encontrava em posição muito favorável. Mas o árbitro tinha tudo encomendado. Forçou que o consequente livre fosse marcado rapidamente, o que desconcentrou o defesa benfiquista. Pontapeou mal a bola, o colega perdeu-a para um jogador portista, em zona perigosa, que lançou um contra-ataque fulminante que deu em golo do FCP. Tenho cópia das escutas e não restam dúvidas que se o árbitro não tivesse marcado aquele fora de jogo ao FCP (um escândalo) o defesa do SLB não teria ficado desconcentrado e não cometeria erro tão infantil. O árbitro fabricou a situação. Fez parecer que beneficiava o SLB, mas sabia bem que isso era apenas camuflagem. Um roubo. As gravações, digo, as escutas provam-no de forma categórica. Há corrupção no futebol português. Está tudo viciado. Parece a Sicília. Tenho sido ameaçado. Não me calo. Ouviram!

Nessa altura a Rute Marlene levantou-se e disse: Oh Luís tens cá uma lata! Falas em vício seu caloteiro: não me pagas há mais de três meses e ao Zé até já perdi a conta. O Vieira deu cabo do Alverca, o Veiga era “dono” do Estoril e trabalhava para o SLB, os que falham grandes penalidades têm garantido o direito de jogarem no SLB e a rapaziada especializou-se em lançamentos de very lights e em fogo posto de autocarros. Incendiários é o que vocês são, seus invejosos.

O Luís disse, exaltadíssimo: se não fosses mulher dava-te uma tareia, já que o teu homem apesar de vender fruta, já não tem tomates para te pôr na ordem.

O furioso atirou-se ao Luís, mas foi aplacado pelo Ilídio e pelo Santos. O Pinto, como bom aristocrata, nem se mexeu. Era uma grande confusão de braços, quando se ouviu um grito estridente: “BASTA”. Era a minha voz, num registo totalmente novo. Resultou. Fez-se silêncio. Convidei a Rute e o Luís a sair, para podermos terminar em paz.

Foi aceite. O contrariado ficou. Um amigo da Junta acompanhou os dois “expulsos” para que não ocorresse algo mais desagradável. E não aconteceu. Foram na paz do senhor.

Ia rematar os trabalhos quando Svetlana se levantou, excitadíssima, com a saia pela cinta e o top abaixo do soutien, e disse com a serenidade possível: O FCP é o maior e o melhor. Também, eu, sou vítima de todas as invejas. Vocês sabem do que estou a falar. O FCP tem os melhores jogadores e ganha com uma vantagem tal que não consente dúvidas. Trabalhar mais e ser melhor, é o segredo. Sei o que passa com o Luís Filipe, coitado um frustrado. Sofre do síndrome: PdC. Não vou revelar as causas nem as fontes. Não sou delatora, nem bufa. O Luís Filipe abusa porque tem a certeza que, enquanto for presidente do SLB, sai incólume de qualquer rixa. Para terminar, convido todos a cantar comigo, os Filhos do Dragão numa versão e encenação muito originais.

Ficamos. Todos cantaram, sem excepção. De pé, como exigiu. A voz dela não era particularmente bonita, mas a encenação um achado. Pedimos bis, mas não foi concedido.

Dei os trabalhos por encerrados. Para a semana há mais. Vamos tratar da Crise Petrolífera.

12 comentários:

  1. Eu gostava de conhecer a Svetlana... ;-)

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  2. Deixo também aqui o meu total apoio às intervençoes da Svet...

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  3. Só agora é que reparei que referi, correctamente, o Silva, como benfiquista e empresário de restauração, e no texto o tratei, também correctamente, por Luís que é como normalmente é chamado pelas pessoas mais próximas.
    Aqui fica a justificação.

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  4. Que fique bem claro que o meu interesse em conhecer a Svetlana é meramente desportivo.

    Depois de ter lido que há 14 milhões de benfiquistas espalhados pelo Mundo ( LOL ), fiquei admirado por haver adeptas portistas na Rússia e, ainda por cima, com as qualidades intrinsecas da Svetlana...

    Este caso, aliás, vem provar que nós, portistas, somos mais de apostar na qualidade do que na quantidade...

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  5. O meu interesse em Svetlana é igualmente exclusivamente desportivo ! Svetlana pró balneário e a titular JÁ ! (sempre é melhor que o Stepanov )

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  6. E agora a sério ( não tem nada a ver com o post ): para quando um post dos ilustres autores do blog sobre a patética entrevista do Orelhas com a pseudo-entrevistadora Judite ? Não acharam deprimente ?

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  7. «para quando um post dos ilustres autores do blog sobre a patética entrevista do Orelhas com a pseudo-entrevistadora Judite?»

    Caro mefistófeles, o que nos pede é quase um castigo. E um castigo nada agradável, do tipo mandar-nos limpar a casa de banho que outros sujaram... Mais vale dizer que não nos grama... ;-)

    Agora a sério, para ilustrar um artigo sobre tal entrevista, só me ocorre uma figura: uma retrete

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  8. Porque razão toda a gente fala no Svetlana e ninguém se interessa pelos aristocratas cá do sitio?

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  9. Caro José Correia: confesso que não tinha medido a dimensão do sacrifício mas...conhece melhor entretenimento ( repito, entretenimento e não diversão, prazer ou delírio) que " malhar" nos lampiões ? Sobretudo no presidente deles ? Eu não. Em todo o caso, em se tratando do inimigo, porque não meter as mãos na m...assa ? Com luvas de borracha, bem entendido.

    Compreendo a imagem da retrete e imagino a angústia de quem tem que lavar as cuecas do Orelhas. Pessoalmente acho que, como imagem, latrina é ainda mais apropriado que retrete ( porque mesmo isso requer algum saber estar).

    Mas o que diriam os lampiões se fosse o nosso Presidente a dar uma entrevista daquelas ? Era esse " sangue" que eu queria ver jorrar...

    Quanto aos "aristocratas", se estamos a falar de Sousa Cintra, Jorge Gonçalves e Santana Lopes, prefiro "snifar" os collants da Svetlana até sufocar do que falar neles.

    Se estamos a falar do Visconde de Alvalade, o respeito por quem fez uma enorme patifaria ao sport lisboa ( aliás, bem merecida, como o tempo veio a provar ). Acho até que, na verdade, o Visconde era um dissimulado Portista ( pelo menos na alma ).

    Vá lá, só um postzinho a malhar no Orelhas e na Judite...não é pedir demais.

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  10. Este comentário foi removido pelo autor.

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