Tanto eu como ele interpelámos Robson sobre o estatuto de suplente de Domingos. Felizmente, André Villas-Boas virou treinador e eu não. Por razões da ordem do óbvio (diferenças de género à partida), mas sobretudo porque essa interpelação desviou AVB do trajecto que estaria traçado: um engenheiro, um doutor ou consultor de multinacional e chegou, no séc. XXI, a treinador do clube de coração de ambos.
O FCP dos últimos anos, sobretudo o do consulado de Jesualdo Ferreira, trouxe uma época estranha ao Estádio do Dragão: o das vitórias desconfortáveis. Dirão: é um Porto que se aburguesou, em que já não nos chega aquilo que para muitos é o expoente máximo (ganhar um campeonato quando o rei faz anos; a euforia inebriante de quem chega aos quartos-de-final de uma competição secundária como a Liga Europa). Jesualdo limitou-se a ser tolerado, mesmo nas vitórias. Porquê? Vítima do seu próprio formato: discursos lentos, sem chama. Recordo-me que, mesmo nos maiores momentos de exaltação, Jesualdo foi sempre incapaz de um rasgo, de um ataque sem medo. Eu, que sempre considerei as conferências de imprensa antes e depois dos jogos como uma ferramenta essencial de intervenção nos níveis motivacionais dos jogadores, bocejava de tédio, ao ponto de já nem querer ouvi-lo: nas derrotas e nas vitórias.
AVB é a antítese disso: desde o dia da sua apresentação (e, se quisermos, mesmo na altura em que era sondado pelo Sporting e endereçou o assunto como “alimentação de palhaçada”) demonstrou estar mais sintonizado com o DNA do clube: quando critica os jornalistas que analisam jogos no ciclo “bestial a besta, besta a bestial”; quando lança avisos claros e desassombrados para os jogadores do clube (vide Raul Meireles); quando tem a coragem de dizer aquilo que mais nenhum jornalista – a quem esta história tocaria mais de perto – conseguiu dizer a propósito dos sermões aos peixes de Jorge Jesus na Benfica TV (substituindo as conferências de imprensa).
Intencionalmente, há sempre 3 componentes das intervenções do treinador com a imprensa: colocação de objectivos, preparação do enquadramento mental dos jogadores e…do público. Dir-se-á que a idade ajuda ao desassombro e que o facto de ser um treinador dos livros permite-lhe distanciar-se da cultura reinante do treinador-ex-jogador que depende da manutenção do sistema para sobreviver (não sei se concordo com a teoria). Eu diria que vai chegar o dia em que AVB vai pagar esta factura (nomeadamente ser o treinador a responder a LFV, um Presidente). Espero que o dia esteja longe e que não deixe de encarar estes espaços como contexto de preparação da equipa e do clube.
Talvez porque seja um de nós, ele sabe que se respira de maneira diferente no Dragão hoje. Há, naturalmente, o efeito sinérgico das vitórias (que nem o adepto mais optimista previa, de tanto ouvir JF a dizer que a equipa só lá para Janeiro estaria construída), mas nota-se uma empatia por defeito para com AVB. Não se trata de unanimidade: trata-se de um respeito confiante – até podemos discordar das opções que ele toma (e eu discordo de algumas…) mas o mister é que sabe.
O FCP dos últimos anos, sobretudo o do consulado de Jesualdo Ferreira, trouxe uma época estranha ao Estádio do Dragão: o das vitórias desconfortáveis. Dirão: é um Porto que se aburguesou, em que já não nos chega aquilo que para muitos é o expoente máximo (ganhar um campeonato quando o rei faz anos; a euforia inebriante de quem chega aos quartos-de-final de uma competição secundária como a Liga Europa). Jesualdo limitou-se a ser tolerado, mesmo nas vitórias. Porquê? Vítima do seu próprio formato: discursos lentos, sem chama. Recordo-me que, mesmo nos maiores momentos de exaltação, Jesualdo foi sempre incapaz de um rasgo, de um ataque sem medo. Eu, que sempre considerei as conferências de imprensa antes e depois dos jogos como uma ferramenta essencial de intervenção nos níveis motivacionais dos jogadores, bocejava de tédio, ao ponto de já nem querer ouvi-lo: nas derrotas e nas vitórias.
AVB é a antítese disso: desde o dia da sua apresentação (e, se quisermos, mesmo na altura em que era sondado pelo Sporting e endereçou o assunto como “alimentação de palhaçada”) demonstrou estar mais sintonizado com o DNA do clube: quando critica os jornalistas que analisam jogos no ciclo “bestial a besta, besta a bestial”; quando lança avisos claros e desassombrados para os jogadores do clube (vide Raul Meireles); quando tem a coragem de dizer aquilo que mais nenhum jornalista – a quem esta história tocaria mais de perto – conseguiu dizer a propósito dos sermões aos peixes de Jorge Jesus na Benfica TV (substituindo as conferências de imprensa).
Intencionalmente, há sempre 3 componentes das intervenções do treinador com a imprensa: colocação de objectivos, preparação do enquadramento mental dos jogadores e…do público. Dir-se-á que a idade ajuda ao desassombro e que o facto de ser um treinador dos livros permite-lhe distanciar-se da cultura reinante do treinador-ex-jogador que depende da manutenção do sistema para sobreviver (não sei se concordo com a teoria). Eu diria que vai chegar o dia em que AVB vai pagar esta factura (nomeadamente ser o treinador a responder a LFV, um Presidente). Espero que o dia esteja longe e que não deixe de encarar estes espaços como contexto de preparação da equipa e do clube.
Talvez porque seja um de nós, ele sabe que se respira de maneira diferente no Dragão hoje. Há, naturalmente, o efeito sinérgico das vitórias (que nem o adepto mais optimista previa, de tanto ouvir JF a dizer que a equipa só lá para Janeiro estaria construída), mas nota-se uma empatia por defeito para com AVB. Não se trata de unanimidade: trata-se de um respeito confiante – até podemos discordar das opções que ele toma (e eu discordo de algumas…) mas o mister é que sabe.
Nota final: O 'Reflexão Portista' agradece à Ana Martins a elaboração deste artigo.
Foto: Record
Tudo correcto na análise.
ResponderEliminarNão tendo sido um adepto entusiasta da contratação do AVB (apenas porque não pensava nem bem nem mal dele, simplesmente não o conhecia o suficiente enquanto treinador principal), houve uma coisa desde o início que gostei: o facto de ser portista.
O Porto orgulha(va)-se de ser um clube diferente, sentido de forma diferente pelos seus adeptos, jogadores, treinadores, dirigentes, etc.
Tivemos grandes treinadores mas desde o António Oliveira que não tinhamos um que fosse portista.
E confesso que para além das vitórias, o que mais estou a gostar é o discurso à Porto.
Ana, muito bem.
ResponderEliminarNum País em que o chefe dos Monarquicos, é o autor da revisão da Constituição da Républica, é bom entre os nossos existir alguém como tu. Repito muito bem.
Sempre apoiei AVB para o FCP, não pk seja advinho, mas sim porque sendo eu amigo do Prof. Vitor Frade, ouvi sobre ele referencias fantasticas... Bom fim de semana, vou acabar as vindimas...
Gostei!!
ResponderEliminarFaz,realmente,toda a diferença, O AVB ser Portista.
Nao percebo como 1 Clube como o FCP se deu ao luxo de ter treinadores nao Portistas,ou melhor,slmerdistas-ou conotados com durante tantos anos.
No futebol moderno para se ser 1 treinador de sucesso sao precisas varias coisas(num grande clube,claro):Astucia,Impertinencia,Coragem,saber fazer lobbye mas acima de tudo ter expediente intelectual.Nao para por os jogadores a jogar,nao para fazer tactica,mas para motivar a mob e assustar a concorrencia.
O resto do ser mestre da tactica sao balelas.Querem fazer do futebol o q nao e.Ha a fisica nuclear e ha a bola.
Um artigo que aborda o tema FCP/treinador numa perspectiva diferente e muito interessante.
ResponderEliminarO FCP sempre se deu bem com os treinadores portistas (Pedroto, Artur Jorge, Oliveira)e André Vilas Boas parece bem lançado para manter a tradição. Não gostei, contudo, de o ver a "responder" ao Vieira. Acho que isso compete a quem exerce o mesmo cargo que o Vieira.
Um dia também eu tive o desplante de fazer uma interpelação a um treinador do FCP, no caso o Artur Jorge, e perguntei-lhe o que via no Paulo Pereira. Tive a resposta merecida: "Essa pergunta distingue o treinador de bancada do treinador propriamente dito", respondeu-me com um sorriso o grande mestre de Viena.:-)
Aquilo que se nota nos adeptos do FCP é a empatia para com AVB. Eu sinto confiança na equipa e não tenho o nervosismo, mesmo quando ganhavamos, que sentia nos anos anteriores. Tive esta sensação de confiança com Robson e depois com Mourinho, não a senti com António Oliveira, apesar de este ser portista, porque sempre o considerei um "tosco" taticamente, nunca esquecerei a noite de Manchester e as suas disparatadas opções assim como outros jogos menos conseguidos.
ResponderEliminarMas estamos no bom caminho, AVB sabe colocar os jogadores nos lugares certos e motivar a aquipa.
A Ana refere no ultimo parágrafo que há "o efeito sinérgico das vitórias" a sustentar esta empatia total com o André Villas Boas o que não posso deixar de discordar. Penso que ainda antes de se ter dado inicio a este ciclo fantástico de vitorias já havia uma admiração e confiança latente por parte de uma esmagadora maioria de adeptos Portistas por este treinador e apenas sustentado pelo seu discurso incisivo, pelo seu reconhecido Portismo e por uma fé inabalável de que ele iria apagar rapidamente o rasto de futebol paupérrimo deixado por Jesualdo Ferreira.
ResponderEliminarO que este ciclo de vitorias nos trouxe foi a rendição de quase 99,9% dos Portistas a AVB e a certeza de que, neste momento, não se veja quem o poderia substituir.
Beirao Portsta
ResponderEliminarNO futebol todos sabemos que do bestial besta é apenas um peque
no passo! O AVB está próximo da genialidade, e é, sem dúvida, o Pedroto dos novos tempos, tal a argúcia e maturidade que evidencia pese ainda a sua juventude. Não há dúvida que beneficiou muito dos verdadeiros mestres que teve na sua formação: J. Mourinho e o Bobby Robson, com o qual ele faz questão de se "identificar mais", digamos assim. Foi um privilégio que , pelos vistos, soube usufruir e temos um grande treinador - qualquer que seja o resultado na Madeira com arbitaragem do Bruno Calabote!...
* Ora tanto o grande Mou como o inesquecível Bobby Robson, 2 génios da bola, não eram portistas desde pequeninos, logo essa do FCP se dar melhor com técnicos criados nas Antas é conversa mole! O que há é grandes profissionais independentem/ da sua oorigem ou da sua escola de formação!Basta de conversa para épater le bougeois...
"Não gostei, contudo, de o ver a "responder" ao Vieira. Acho que isso compete a quem exerce o mesmo cargo que o Vieira."
ResponderEliminarDavid, após dois ou três anos de um incompreensível silencio sepulcral por parte do nosso Presidente neste tipo de questões, você ainda não se habituou ao facto de que quem tem sido o porta voz das contra-ofensivas Portistas tem sido o treinador?
Jesualdo, no entanto, fazia-o de uma forma cuidadosa, cautelosa e sempre na tentativa de não agitar demasiadamente as águas. O AVB atira à mouche sem renitências. Eu também prefiro assim.
Habituar, habituei-me, miguel_canada, como também me habituei à barulheira que a minha vizinha do andar de cima faz todos os dias às 6.30 da manhã. Mas hábito e concordância não são sinónimos.
ResponderEliminar@ inconformista,
ResponderEliminarO facto de eu gostar de ter um treinador que seja portista não significa que exija que assim seja ou que outra escolha seja má. Uma coisa não exclui a outra, mas se poder juntar-se o útil ao agradável, melhor. Ou não é?
Se o Mourinho fosse portista, por exemplo, decerto trataria o FCP com mais respeito e consideração.