É preciso recuar muito no tempo para descubrir um FC Porto activo em todas
as quatro frentes chegado esta altura do mês de Janeiro, precisamente 2008-09, em
que se chegou ao inicio do novo ano nos Oitavos de Final da Champions League
(cairiamos em Quartos frente ao Manchester United), a camino das finais da Taça
de Portugal (que ganhariamos) e da Taça da Liga (caindo nas meias-finais) e
liderando o campeonato que encerraría o ano do Tetra de Jesualdo Ferreira.
Nem
sequer no mágico ano de 2011 a equipa de André Vilas-Boas aguentou o ritmo e
soçobrou frente ao Nacional na fase de grupos da Taça da Liga precisamente no
inicio do mês de Janeiro. Isso sem ter de jogar a exigente Champions League. Algo
que permite colocar – ainda mais – em perspectiva, o feito dos homens de Sérgio
Conceição. E sabendo que aí vêm cinco meses de máxima exigência, a expectativa
não podía ser maior. Olhando para a forma desastrada como o plantel foi
construido – victima do descontrolo dos últimos anos – desde cedo a maioria dos
adeptos e analistas foi rápida a indicar que o plantel era curto e tarde ou
cedo iria necessitar de ajustes. Não deixa de ser correcto o raciocínio mas o certo é que, com
metade da época cumprida, esse inevitavel desgaste não se tem notado – nem nos
resultados nem em campo – graças à excelente gestão de grupo de Conceição o que
permite reabrir a discussão sobre a necessidade real de interferir activamente
na reabertura do mercado.
O mercado de Inverno é um mundo complexo.
Poucas vezes serviu, realmente,
de algo para equipas com objectivos importantes. Os poucos casos são simbólicos
e parecem reforçar a sua importância (e ninguém esquecerá Carlos Alberto em
2004 ou a série de avançados que foi chegando nos anos posteriores que, com golos
importantes, ajudou a alcançar metas e títulos) mas na prática vale muito mais
ter um plantel bem estruturado desde o início do que aventurar-se no
desconhecido do defeso invernal. Num ano sem competição africana de selecções –
fundamental quando os MVP´s da época têm sido Brahimi, Aboubakar ou Marega – e sem
lesões largas e graves, salvo os problemas físicos repetidos de um Soares que
ainda não apanhou a dinâmica e de um irregular Otávio, os problemas têm sido contornados com
tranquilidade. Sobretudo o que estes meses nos têm ensinado é que o éxito do FC
Porto começa e acaba no espirito de grupo que o treinador forjou nos meses de
pre-temporada e que todos têm abraçado, jogando mais ou menos.
Num modelo de
jogo muito exigente físicamente – por vertical e ofensivo – mas onde a posse de
bola ajuda, em momentos de descanso, gerir esforços, Conceição tem sabido
trocar peça por peça em momentos pontuais sem perder o ritmo colectivo. Tem
acontecido na metamorfose de Oliver a Herrera (onze mais físico, com menos posse, e com maior
entrega e presença em troca de maior controlo), nas inclusões pontuais de Sergio
Oliveira, Layun ou Maxi Pereira num onze quase sempre recitado de memoria. Até
mesmo a recuperação de Diego Reyes e o regresso de Soares abriram outras opções
em posições chave. Conceição tem claro na sua cabeça que há um onze titular
base mas sujeito a alterações pontuais face a rivais ou forma física e uma
poule de seis/sete jogadores (Maxi, Reyes, Sergio, Oliver, Otávio, Soares e André
André) que permite cobrir essas necesidades. É certo que, de base, o plantel
apresenta descompensações tais como o excesso de laterais (o que tem feito
Ricardo actuar de extremo algumas vezes) e a falta de jogadores abertos nas
alas quando, sobretudo, Corona, não está ao seu nível ou peca por ausente,
sendo que a adaptação de Ricardo, por um lado, e o uso de Hernani, por outro,
abrem outras questões paralelas na gestão de grupo. A forma como Conceição
abdicou de jogar com um 10 tem retirado importancia e influencia a Oliver, e
também a Otávio, e tendo em conta que Danilo é indiscutivel, aberto a Herrera,
André André e Oliveira a possibilidade de rodar por um lugar. No fundo o
técnico conta já com seis médios para duas posições (oferecendo às vezes uma
modificação do 4-2-4 para 4-3-3 para acomodar Herrera-Danilo-André
André/Oliveira em momentos de maior posse) e não tem necessidade de mais tendo
em conta que todos cumprem os distintos perfis utilizados. Layun, vitima de um
claro over-booking e de um grande ano de Telles, e Maxi e Casillas – por questões
salariais – são os claros candidatos a sair das contas sem que, em principio, a
equipa mostre sinais de ressentir-se das suas baixas mas e quanto a
incorporações, que decisão tomar?
O importante, uma vez mais, é referir o espirito de grupo como base de
tudo.
A ideia de jogo do técnico não é complexa – digamos que é uma versão à
Porto, com esse extra de garra, do que lograva o Benfica de Jesus com êxito a
nível doméstico no inicio da década – mas a idiossincrasia da equipa é muito
especial. Qualquer novo reforço entra num grupo já formado, trabalhado e
emocionalmente muito unido e tem de ser capaz de adaptar-se a essa realidade em
tempo recorde. Não há, no mercado e face à nossa realidade, um talento absoluto
disponível capaz de ser titular de caras apenas pelo genial que possa ser, pelo
que quem vir tem de ser parte da engrenagem colectiva ou o próprio técnico será
o primeiro a excluí-lo das opções. Oliver, sem dúvida um jogador com um talento
incomparável, não joga precisamente porque apesar das suas virtudes, não é o
homem certo para o modelo de jogo.
Ou seja, salvo que seja uma posição
cirúrgica (estou a pensar em extremo esquerdo/direito) ou um avançado de
natureza muito diferencial do jogo que oferece Aboubakar (e para isso já existe
Soares, inclusive), as necesidades reais deste plantel são escassas. E mais
ainda quando o grupo parece de tal forma unido que a capacidade de
multiplicação de posições reduz ainda mais essa ideia de necessidade extrema
individual. Chegar e sentir o que o técnico fazem os jogadores sentirem, dentro
dessa dinámica de “irmãos de armas”, é algo extremamente complexo de lograr e difícil
de exigir a uma cara nova. Para quatro meses de competição, mais ainda.
Seguramente haverá jogadores melhores que Marega no mercado mas será que algum
dará a Sérgio o que ele quer dessa posição? Ou será tão capaz como Marega é de
representar a unidade do grupo e o espirito deste projecto? O mesmo pode ser
dito, realmente, de todos. Ninguém pode saber o que nos espera o amanhã e
talvez uma lesão grave de um central, um problema sério de Danilo ou de Brahimi
– os únicos jogadores sem réplicas reais daquilo que são e dão à equipa – podem
sempre oferecer novos problemas e novas equações. No entanto, no momento
presente, cada incorporação corre o risco de ser mais vista como uma
contratação do que, propriamente, um reforço. E sabendo como está a SAD e como
estão as finanças do clube - com
jogadores por renovar e buracos abertos para a próxima época, sobretudo na
posição de defesa central – o mais lógico seria confiar em Conceição e nos seus
homens e ir preparando o futuro com consciencia, sabendo que a força, a união e
o talento do grupo e do seu líder que trouxe o FC Porto à sua melhor posição
numa década a inicio de ano é uma arvore com raizes mais profundas na terra do
que podemos imaginar para abanar ao primeiro sinal de tempestade.
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