Retomando o fio à meada, àquela sementeira prometedora de meados dos anos setenta faltava quem soubesse tratar da colheita. E o Dr. Américo Sá escolheu de facto bem: convidou em 1976 Jorge Nuno Pinto da Costa para chefiar o Departamento de Futebol.
Já com um apreciável currículo no clube (nomeadamente à frente da secção de Hóquei em Patins, entre outras), Jorge Nuno Pinto da Costa fazia parte dos orgãos sociais do clube desde a presidência de Afonso Pinto de Magalhães. E, por mais que apreciasse a colegialidade das decisões directivas, sempre lhe fez espécie ver, por exemplo, o director da natação pronunciar-se sobre quem deveria ser o treinador da principal equipa de futebol. Por isso desde logo exigiu grande autonomia para o seu departamento.
Jorge Nuno Pinto da Costa era, pelo lado materno, filho de uma distinta família portuense e bisneto do grande mecenas das artes Honório de Lima, cujo nome honra uma rua do nosso burgo. Tivera uma esmerada educação familiar e uma instrução em alguns dos melhores estabelecimentos de ensino do Norte. Era uma pessoa de princípios firmes e de um portismo inabalável. Não foi ele que disse "sei o que quero e para onde vou", mas decerto esta frase se lhe aplicaria na perfeição. E sabia, como muitos portistas, que para aí chegar, necessitava da colaboração daquele que foi, possivelmente, o maior treinador português de todos os tempos: o genial José Maria Pedroto.
José Maria Pedroto fora jogador do clube, campeão em 1956 e 1959, e protagonizara aquela que, à época, fora a mais cara transferência do futebol português, quando se transferira do Belenenses para o FC Porto por 500 contos. Cedo enveredou pela carreira de treinador, e depois de um título europeu de juniores com a respectiva selecção em 1960 e de passagens pela Académica, Leixões e Varzim, foi deste último clube trazido para o FC Porto, num golpe de grande argúcia, por Afonso Pinto de Magalhães em 1966. Não é desse seu primeiro período de três anos à frente da equipa principal do clube que aqui se trata, mas tudo terminou de facto lamentavelmente, inclusivamente com uma decisão tomada em Assembleia Geral, promovida pela Direcção do clube, a proibir o regresso do "Zé do Boné" (alcunha que ganhara devido ao boné que sempre usava e ao nome de uma personagem de banda desenhada tornada famosa pelo quotidiano portuense "O Primeiro de Janeiro").
De cá saído, o Zé do Boné, que entretanto aumentara a sua celebridade com algumas tiradas famosas ("sou de Lamego, sou de antes quebrar que torcer!") passara a Setúbal, começando logo por nos humilhar com duas derrotas copiosas (5-0 em Setúbal e 3-0 nas Antas) na sua primeira época à frente do Vitória sadino, que haveria de levar a um 2º lugar no campeonato e a várias façanhas europeias de renome. Daí passara - ó Ceus! - ao Boavista, onde alcançara novo segundo lugar e conquistara duas Taças de Portugal. Os portistas sentiam a sua falta - e ele decerto pressentia que um dia regressaria.
J.N. Pinto da Costa tinha, portanto, uma tarefa espinhosa à sua frente: aparentemente fizera depender a sua aceitação do cargo de Chefe de Departamento de Futebol do regresso do "Zé do Boné", mas esse regresso estava formalmente impedido. A "democracia", mesmo que plebiscitária, tem, contudo, destas vantagens: nova assembleia foi convocada e, com a mesma ligeireza com que tinha imposto a proibição do regresso de José Maria Pedroto, a turba votou pelo levantamento dessa proibição. Em boa hora o fez, diga-se...
E assim, no Verão de 1976, o genial Zé do Boné regressava à casa de onde, a bem dizer, nunca deveria ter saído. Com ele trouxe um dos seus fiéis pupilos de Setúbal, o ponta-de-lança brasileiro Duda, e recomendou ainda a contratação do defesa-central do Belenenses Freitas - um jogador bem à imagem do seu novo técnico, já que não era de grandes cerimónias.
Aos nomes do plantel já referidos na primeira parte desta crónica há ainda a juntar os de uma excelente safra caseira: Rodolfo, Gabriel, Oliveira e Gomes, quatro magníficos jogadores da "formação" (como agora se diz), dos quais apenas Gabriel chegou a andar emprestado. Outros tempos...
Gabriel foi talvez o melhor defesa-direito de todos os tempos do nosso clube, Rodolfo começou nessa posição e passou a trinco, o primeiro digno desse nome a actuar no nosso clube, Oliveira era um médio de ataque (originalmente extremo-direito) genial, talvez o maior produto de sempre das nossas camadas jovens, e Gomes simplesmente o maior ponta-de-lança algum dia nascido neste jardim à beira-mar plantado.
E assim se inicou a época de 1976/77, a qual, com alguns solavancos, terminou com a conquista de uma Taça de Portugal (nas Antas, frente ao Braga, por 1-0), o primeiro êxito do clube desde que, em 1968, e também sob o comando de Pedroto, vencera a mesma prova.
As coisas estavam, de facto, bem encaminhadas.
(continua)
JMP trouxe com ele dois "cromos" do BFC, o Taí e o luso-brasileiro, Celso, e ainda o Fonseca do Varzim.
ResponderEliminarFoi uma época irregular, nomeadamente nos jogos fora de casa.
Mas, os alicerces do futuro FCP foram lançados com sucesso.
Mexemos de tal maneira com o status quo, que o SLB e o SCP até fizeram uma santa aliança, contra o perigo que vinha do Norte.
Só que depois da batalha, quem mais saiu machucado foi o FCP : foi o Verão Quente, com a ruptura de JMP/PdC com a restante direcção e a consequente saída de ambos.
O programa, porém, não continuou de seguida mas, dois anos depois, com o regresso de PdC, agora como presidente do FCP.
De facto, a dupla Pedroto - Pinto da Costa, mexeu com o FC Porto e mexeu com o futebol português.
ResponderEliminarHá quem diga que tudo o que Pinto da Costa sabe aprendeu com Pedroto, mas eu não concordo.
Não foi por acaso que Pinto da Costa exigiu a contratação de Pedroto para aceitar chefiar o Departamento de Futebol; e também não foi por acaso que exigiu a autonomia (e blindagem) desse mesmo Departamento de Futebol.
Eu não me esqueci do Taí, do Celso Matos e do Fonseca, caro Mário. A minha crónica não pretende ser exaustiva, ainda menos quando trata de antecedentes do grande acontecimento!
ResponderEliminarUm abraço