Há quem pense que o pior dos últimos quatro anos tenha sido a ausência de títulos para o Futebol Clube do Porto. Não é. O pior é a constatação da incompetência recorrente e da cobardia de quem dirige os destinos da instituição perante várias situações transversais que têm condicionado os resultados apresentados pelo clube. O FC Porto perde títulos por muitos motivos mas um dos mais importantes é, sem dúvida, que passou a ser gerido como o clube pequeno, de mentalidade pequena, com gestores pequenos e de ambições e objectivos pequenos como era antes de 1976. Não foi por casualidade que o clube viveu um longo deserto de títulos entre Guttman e Pedroto. É muito fácil e prático culpar o "Regime" desses anos negros mas o certo é que durante o "Regime" o FC Porto venceu vários troféus incluindo todos os títulos nacionais que ostentava. Não, a ausência, em muitos casos, desses títulos devia-se muitas vezes à gestão pequena e complexada dos seus dirigentes, capazes de despedir um treinador e irradia-lo do clube quando este está a forjar uma equipa ganhadora ou de dar sucessivos tiros nos pés na escolha de jogadores ou técnicos. O mesmo cenário do presente com o simbolismo tão doloroso para qualquer portista que alguns dos homens que acabaram com esse ciclo nefasto presidam agora a uma repetição da História.
O caso do baile de nomes de treinadores é só mais um exemplo. Nuno nunca esteve implicado no Porto, como se disse tantas vezes, porque era um homem que sabia que à mínima ia sair do clube amparado pelo seu agente e amigo que tão bem o colocou num emblema do seu império. Que o treinador com quem o Porto quis ser campeão acabe na segunda divisão inglesa, um lugar de acordo com a sua valia, diz muito da narrativa do último ano. O Porto hoje é rejeitado pelos Marco Silvas da vida, técnicos que não são ninguém no mundo do futebol mas que já perceberam que a gestão negativa do Porto não vai ajudar em nada as suas carreiras. Alguns comentadores a soldo querem atirar areia para os olhos dos adeptos dizendo que há filas e filas de nomes conceituados a pedir de joelhos para treinar no Dragão, algo coerente com a colecção de fracassos pos-Vitor Pereira e que será devidamente explicado - ou não - quando Sérgio Conceição, amigo intimo do filho do Presidente e um treinador de terceiro nível, apareça com o seu discurso do "Somos Porto versão Até os Comemos Carago que eu Parto isto Tudo". Comer a relva em campo e querer comer a relva desde o banco nunca funciona como sabem bem aqueles que conheceram os treinadores de maior êxito na história do clube, futebolistas finos como Pedroto, Artur Jorge, Bobby Robson ou mentes analíticas como José Mourinho e André Villas Boas. Sim Sérgio, és o exemplo desta mentalidade desencontrada por muito respeito te tenhamos todos!
O que mais indigna neste circo em que se tornou o quotidiano do FC Porto é a cobardia da sua gestão.
O silêncio confrangedor em momentos em que o clube é expoliado por quem antes levantava as pedras da calçada, a entrevista da praxe ao menor sinal de coisas boas para colocar medalhas no peito, continua tudo lá. Mas o que preocupa verdadeiramente e o que dá sinais de desnorte ou de absoluta e nefasta mediocridade é quando o FC Porto decidiu deixar de se preocupar consigo mesmo e passou a querer ser uma réplica anedótica dos clubes do sul, com o vitimismo sagrado do Sporting e o complexo de perseguição do Benfica. Para atirar areia aos olhos dos sócios e adeptos, como esses clubes tantas vezes fizeram, a autocritica desapareceu do FC Porto para dar lugar a uma bipolaridade confrangedora que, ainda para mais, se beneficia do silêncio oficial do clube, amparando-se assim na desculpa de que os adeptos é que são a voz desse descontentamento. Nesse cenário de atirar as culpas para os outros há desde a tentativa de criar um novo modelo de cartilha azul e branco - o Porto sempre teve os seus jornalistas e comentadores encartilhados, como qualquer outro clube - á anedótica criação de uma página de supostos "portistas" que se quer transformar num espaço de defesa do clube, na ausência da disposição deste. Essa página, criada há semanas no Facebook, quer aparecer como um acto espontâneo de revolta quando transpira a encomenda por todos os poros e surge no seguimento de uma mudança na política de comunicação que faz de um programa televisivo semanal o novo livro de queixinhas do "portismo". Em ambos casos o silêncio de Pinto da Costa é substituído pelas criticas dos seus novos lacaios, oficiais ou não, que em nenhum momento parecem estar interessados em discutir o que está mal com o clube - algo evidente aos olhos de todos - para desviar atenções ao que outros clubes fazem. Ninguém vai questionar a estas alturas o tamanho gigantesco do "Polvo" - aliás, o silêncio do clube até agora quando espaços como este o denunciavam sim é confrangedor - nem a influência que o Benfica tem em todos os membros do organismo desportivo, judicial, financeiro e político em Portugal. Não é necessária uma página de bitaites para isso. Se o FC Porto quer realmente fazer-se ouvir deve-o fazer onde pode e tem de exercer toda a sua influência, nos tribunais desportivos e nas assembleias gerais da Liga e da Federação, espaços onde a sua presença tem sido exigua e a lista de aliados encolhida de ano para ano. Institucionalmente o Porto continua a mexer-se ao ritmo de uma lesma, talvez de acordo com a idade de quem o dirige, num ritmo similar ao do Partido Comunista soviético dos anos oitenta pre-Gorbachov, tanto na defesa do clube frente aos inimigos externos - a alguma claque do clube sim se podem tratar ao velho estilo soviético ou "salazarista", como preferirem, banindo-as do campo ao menor sinal de discordância - como na preparação de um plano de futuro sustentável e positivo a nível interno.
O triste, tal como sucedeu nos anos sessenta e setenta, é que esse plano não existe e enquanto não surgir outro José Maria Pedroto e outro Jorge Nuno Pinto da Costa, ainda que o contexto seja radicalmente distinto, não há esperanças de que algo quebre o ciclo. O que sim ameaça ridicularizar ainda mais o clube é a importância que se tem dado a este tipo de "portismo" mesquinho, aziado e sem argumentos que se tem dedicado a levantar podres alheio - em alguns casos de uma forma falaciosa e confrangedora que dá vergonha a qualquer portista minimamente informado e sem palas nos olhos - e como esse posicionamento sufragado desde o clube pelo tempo de antena que se lhe dá em oposição a outros espaços mais críticos - basta recordar o que disse dos blogues "anónimos" o recém re-eleito presidente há poucos meses - para entender que essa mensagem é para o consumo interno, ou seja, para doutrinar ainda mais os portistas a uma submissão intelectual a partir de um complexo de inferioridade e de perseguição que não tem qualquer motivo para existir. O FC Porto fez-se grande, precisamente, quando deixou de se vitimar, de se queixar e de se comportar como "bons rapazes", actuando onde tinha de actuar para equilibrar a balança do poder. O regresso a esse vitimismo que faz rir qualquer rival e dá vergonha a qualquer portista só augura um cenário negro para o futuro imediato. Em 1977 Pinto da Costa percebeu onde estavam os grandes cancros do clube que iam desde detalhes tão insignificantes como a presença dos sócios nos treinos até à logística das deslocações do clube. Quarenta anos depois, num triste e previsível fecho de ciclo, reabriu essas portas a sócios escolhidos a dedo para vociferarem idiotices em seu nome e do clube e abriu os corredores do Dragão a todos, fazendo com que decisões que antes eram tratadas no segredo dos deuses hoje sejam conhecidas na praça pública de imediato. Contra isso, problemas reais e graves do Dragão, os comentadores a soldo nos programas semanais e as páginas serviçais e de mente pequena, nada têm a dizer. O discurso oficial é outro, disparar para o ar para que os adeptos e sócios se entretenham a olhar para as nuvens enquanto o chão se continua a abrir debaixo dos pés.