sexta-feira, 11 de maio de 2012

A mitologia benfiquista

«Há muitos anos, os nossos antepassados inventaram deuses para explicar fenómenos - o vento e a chuva, o sol e a lua, o fogo e a tempestade, o dia e a noite - para os quais não tinham explicação, e organizaram religiões com o objetivo de influenciar os humores imprevisíveis da mãe Natureza. (...) os antigos egípcios arquitetaram uma narrativa religiosa bastante completa, onde, por exemplo, Rá, deus do Sol, cuspiu Shu, deus do Ar, e Tefnut, deus da Humidade. No panteão de deuses egípcios, Ísis encarregava-se dos seres vivos, mas nem o futuro (Osíris superintendia a todo o processo da jornada até ao Além) nem os sentimentos - Seth era a divindade que tratava do ódio - eram negligenciados.
Interesseiros, os gregos abriram espaço na sua mitologia para Hermes, deus dos comerciantes, a quem rezavam e dedicavam o sacrifício de animais, na tentativa de o satisfazer e melhorarem as vendas.
Coube aos hebreus o louvável esforço de racionalização desta confusão panteísta de adoradores de uma multidão de deuses. (...) fundação de uma religião monoteísta, em que um só Deus, todo poderoso, responsável por toda a Criação, que se ocupa em regime de acumulação de todos os pelouros - e a quem os fiéis podem recorrer seja qual for a índole da sua aflição.

Nove em cada dez dos seis milhões de benfiquistas refugiaram-se na religião para achar uma explicação para a esmagadora hegemonia portista no nosso futebol. Os panteístas atribuem as culpas a efeitos conjugados da ação malfazeja de alguns anjos e demónios, como Jesus (o Jorge), Vítor Pereira (o dos árbitros), Luís Filipe Vieira e Pinto da Costa. Outros, monoteístas, optam por culpar apenas os árbitros por todas as suas desgraças.

Como portista e agnóstico compreendo a desorientação teológica que se apoderou dos benfiquistas. (...) Demonizar os árbitros e sacrificar animais à Fortuna (a deusa romana da Sorte) é o drama da mitologia benfiquista. Para voltar às vitórias, o Benfica tem de aprender com Minerva (a deusa romana da Sabedoria) a lição de que as vitórias portistas são filhas da combinação de talento com competência e muito, muito, trabalho. Só assim a sua fé no futuro terá fundamento.»
Jorge Fiel
JN, 11/05/2012

4 comentários:

  1. Irónico que num texto que pretende desmistificar a mitologia lampiã o autor insista nos 6 milhões...

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  2. Muito bom. Melhor artigo de opinião sobre a "benfiquice aguda", que alguma vez tive oportunidade de ler.

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