No dia 19 de Maio o Bayern de Munich preparou-se para ganhar a
Champions League. Jogavam em casa – no seu próprio estádio. Eram os máximo
favoritos. Tinham eliminado, em grandes penalidades, o Real Madrid. O seu rival
dessa noite jogava feio, jogava porco e jogava mal para a esmagadora maioria de
adeptos neutrais e analistas. Era mais uma questão de quantos e quando e não
uma questão de se. Afinal era o Allianz, a cidade estava já a preparar-se para
esvaziar os stocks de cerveja e havia instruções claras sobre como o cortejo ia
ter lugar no dia a seguir. O Bayern ia ser campeão europeu em casa. Diante dos
seus. Deutschland Uber Alles e todas essas coisas.
O Bayern dominou. Dominou. Dominou. Bola aquí, bola ali.
Flanqueava o jogo, conduzia o esférico. Trocava a bola no meio-campo do rival.
O seu sobrava. Não estava lá ninguém. Só Neuer. Todos os azuis no seu
meio-campo, na sua área. Rezavam, rezavam e rezavam. A bola mexia-se, mexia-se
mas não encontrava o espaço, a oportunidade. Não entrava. Até que chegou o
minuto 83. O minuto da euforia. A bola encontrou Muller. Muller encontrou o
espaço. Cech não podía fazer nada. O Bayern ia ser campeão europeu em casa.
Diante dos seus. A velha arrogância voltou ao de cima. A mesma de todas noites
bávaras, a de Viena 87, a de Barcelona 99, estava tudo lá. O Bayern era campeão
europeu para tanta gente que até o seu treinador, Jupp Heynckes, decidiu tirar
a Muller de campo para receber o aplauso, a ovação. A medalha no peito. Mas o
Bayern, o todo poderoso Bayern, o que jogava em casa, no Allianz, não foi
campeão europeu. Não foi nada nessa noite.
A um minuto do fim o Chelsea decidiu que era a hora de
atacar. Algum dia tinha de acontecer. Foi ali. Ataque, defesa, canto, centro,
cabeceamento, golo. Drogba. Outro africano como Madjer. Outro fantasma para o
baú. Do golo ao prolongamento foi um instante. Do prolongamento aos penaltis
também. A velha arrogância no Allianz, a sensação de invencibilidade que aqui mandamos
nós, apanhou o primeiro autocarro para casa e deixou os adeptos entregues a si
mesmo. Vieram os penaltis. Veio Neuer e veio Cech. O primeiro era um expert
reconhecido, tinha defendido até dois penaltis do Real Madrid na ronda
anterior. O segundo tinha atravessado os penaltis de Moscovo, quatro anos
antes. Foi Cech, foi o Chelsea, foram os pequenos que não jogavam a nada, os
azuis, que ganharam. E o Allianz lá teve de trocar as cores que brilhavam. Saia
o vermelho, entrava o azul. A ordem lógica do Mundo estava estabelecida.
Hoje o Allianz vai outra vez estar vermelho.
Hoje a velha
sensação de invencibilidade vai estar lá. Hoje vamos ser nós os pequenos,
modestos, os que não contam para nada. Os que vão ter de esperar quando
entrarão os golos alemães de forma quase subserviente porque é assim que
funcionam as coisas na Baviera, dirão. Uber Alles e todas essas coisas. Mas
não. De ir ganhar a casas vermelhas sabemos nós. De ultrapassar a arrogância e
sobranceria alemã também. Tal como em 2012, o FC Porto também não conta para
nada na opinião de muitos (até de alguns que, pasme-se, viram o jogo da
primeira mão!!). E tal como em 2012 há uma sensação na Baviera de que aqui não
ganha ninguém a não ser eles.
Uma mentira contada mil vezes não deixa de ser mentira. Já se
ganhou no Allianz uma Champions – e hoje, é uma final de Champions para nós e
ainda mais para eles, depois da lição levada no ano passado – e não foram eles
a ganhar. Já passou um exército azul desconsiderado e mandou calar com golos os
que gritavam de peito feito e coração vazio. O Bayern não é nenhum papão e o
Allianz não é o terceiro nível do purgatório. De infernos e criaturas mitológicas
entendemos nós. E de perder em casa com azuis quando todos os davam por
vencedores entendem eles.
O Allianz hoje é só mais um estádio. Só mais um Old
Trafford, um Gerland, um Riazor, um Olimpico de Kiev, um Olimpico de Roma, um
Werderstadion, um Pittodrie, um De Kuip. Um estádio mais para a nossa colecção de noites europeias memoráveis.
Hoje o Allianz pode ter acordado vermelho e com a arrogância de quem já canta
vitória só porque joga em casa. Mas vai dormir azulinho, ao som de uma valsa de
acordes que nunca se esquecem.
"Hoje o Allianz pode ter acordado vermelho e com a arrogância de quem já canta vitória só porque joga em casa. Mas vai dormir azulinho, ao som de uma valsa de acordes que nunca se esquecem"
ResponderEliminarMiguel, vejo que estás muito optimista.
Gostava de partilhar tanto optimismo, MAS... vamos esperar pelo fim do jogo.
Citando o grande José Correia,
Eliminar"Eu sou realista mas deixem-me sonhar" ;-)!
Numa perspectiva muito realista/pragmática, vaticino que o Porto perde 2-1, mas apura-se com distinção, depois de muito sofrimento. Concordo que, apesar da derrota da semana passada, a sobranceria dos alemães entende que virar o resultado é "peanuts". Atente-se nas declarações do Müller, o jogador mais insuportável da actualidade. Por outro lado, acho que não devemos comparar-nos ao Chelsea referido no texto. Era uma equipa ultra-defensiva, com um futebol pobre e que ganhou a Champions como uma Grécia ganhou um Europeu. Este Porto, apesar das fragilidades, é bem mais ambicioso. Joga um futebol ofensivo, discute o resultado olhos nos olhos, como assistimos na 4ª-feira passada, sobretudo na exuberante 2ª parte, ao invés de esperar que a vitória lhe caia do céu. Espero, sinceramente, que a postura de hoje seja a mesma. Que não baixemos linhas à espera do milagre, porque pode correr mal. Já se sabe que vamos ter de sofrer, resistir, defender, mas não podemos entrar com essa estratégia. E não vamos entrar certamente, como o Jackson já veio a terreiro dizer. Hoje é dia de fazer história. Contudo, mesmo que não a façamos, e excluindo alguma humilhação inesperada, a campanha deste ano na Champions será sempre motivo de orgulho.
ResponderEliminarMau exemplo...
ResponderEliminarO Bayern, sejamos justos, merecia claramente ter ganho esse jogo, como merecia ter ainda outra CL, a que perdeu de forma inacreditável para o MU em 98 ou 99.
Logo temos de fazer o nosso jogo, com a consciência que fizemos na "primeira parte" mais do que o Chelsea ou mesmo o MU fizeram para merecer a vitória sobre o Bayern.
Cabe-nos acreditar!
Muller é um maniento, desbocado, arrogante e até algo idiota... e infelizmente um enormíssimo jogador adversário!
Não se meta tudo no mesmo saco, obviamente que para eles, que jogam em casa, um resultado de 2:0 não é nem nunca pode ser considerado um feito, mt menos para uma equipa como o Bayern... fossem contra quem fosse!
Mas nós somos Porto... queremos vencer mais do que ninguém, porque sabemos que NADA, ABSOLUTAMENTE NADA nos é dado, tudo é conquistado com mt esforço e sacrifício!
O resultado é-me indiferente, quero é ver o meu Porto a deixar tudo em campo e a passar! E a deixar o mundo mais uma vez vergado aos nossos feitos!
"O Bayern, sejamos justos, merecia claramente ter ganho esse jogo, como merecia ter ainda outra CL, a que perdeu de forma inacreditável para o MU em 98 ou 99."
ResponderEliminarNão se trata de merecer. Hoje o Bayern até pode merecer ganhar por 10-0. Importa-me pouco se no final da noite o FCP estiver nas meias-finais.
Não sei o que vem aí. Não estou optimista, nem pessimista. Apenas expectante. Acredito que podemos passar se estivermos no máximo das nossas capacidades, se formos ao limite, ou muito perto disso. Mas também tenho consciência que podemos tombar, face à diferença de forças existentes, a vários níveis... Sonho com uma noite perfeita, um FC Porto forte, personalizado, a recusar-se apenas a defender. Se entrarmos medrosos, subservientes, já perdemos. Mas acredito que, se formos fortes mentalmente e soubermos sofrer, vamos fazer história!
ResponderEliminar