sábado, 4 de junho de 2011

Juros de 8%

«Andamos há mais de um ano a dizer que “a culpa é dos mercados”. Mas quando podemos, portamo-nos como eles. Exigir 8% para comprar obrigações do Porto é especulação?

Este exemplo do Porto é claro para compreender o que são, afinal, “os mercados”. Ontem, o Porto comemorou 13 anos de cotação em Bolsa. Se as ações tivessem o desempenho da equipa de futebol, os acionistas da Porto SAD estavam hoje a passear de jato privado com o Cristiano Ronaldo. Mas se as ações (isto é, capital próprio) dão pouco, as obrigações (ou seja, capital alheio) dão muito. 8% ao ano é o dobro do que estão a pagar neste momento os melhores depósitos a prazo. E porquê? Porque o risco das obrigações do Porto é superior ao risco dos depósitos. Diz quem? Dizem os mercados.

A colocação de obrigações feita ontem pelo Porto foi um sucesso: para uma oferta de 10 milhões de euros houve procura de quase 100 milhões, o que levou a um rateio de 10 vezes. No total, houve quase três mil investidores que se inscreveram para comprar estas obrigações, ou seja, que emprestaram dinheiro ao Porto a três anos, por 8% ao ano. (Bom, 8% brutos, o que dá 6,37% de rentabilidade líquida, pois o Estado também quer o seu quinhão).

Quando Portugal passou a pagar mais de 7% por títulos de dívida pública, tornou-se óbvio que a situação era insustentável. Então, muitos disseram que os mercados estavam a especular “contra” Portugal (e muitos estavam mesmo), o que era uma ignomínia. Mas esta colocação do Porto mostra que a SAD teve de pagar 8% para atrair os investidores, a maioria dos quais é portuguesa. Ou seja, os credores, investidores, especuladores – escolha você mesmo o termo – somos nós. Nós somos os mercados. E o Futebol Clube do Porto não se queixou. Nem um bocadinho.»
Pedro Guerreiro
in Record, 03/06/2011



Para além de benfiquista e cronista do Record, Pedro Guerreiro é também director do Jornal Negócios e, quando centra as suas crónicas na economia, diz coisas com algum interesse.

A questão mais relevante é perceber porque razão a FC Porto SAD teve de se comprometer a pagar juros de 8% ao ano.

A resposta parece-me óbvia. Se a FC Porto SAD fosse financiar-se à Banca teria de pagar um juro superior ou, pior ainda, nesta altura a Banca portuguesa não estava em condições de emprestar os 10 milhões de euros que a SAD portista precisa para financiar a sua actividade corrente.

9 comentários:

Ribeiro DeepBlue disse...

Sim mas será interessante verificar se quando o SLB for ao mercado, com um juro igual ou superior este tal de Pedro Guerreiro (que nem sempre acerta nas suas "récitas" do Jornal de Negócios) também se manifesta desta forma negativa.
A banca fechou a torneira.
Fechou às famílias e em boa medida às empresas.
Se não houver um mecanismo alternativo de financiamento como este, gostava de saber como é que o "inteligente" Pedro Guerreiro financiaria as actividades de uma empresa ganhadora como é o FCP (ou neste caso, a SAD).
Não há resultados?
Para os accionistas não, é verdade.

Mas penso que a maior parte dos accionistas (se exceptuarmos Amorins e afins) borrifam-se bem para isso.
Então este ano...

HULK 11M disse...

O que o mercado "disse" foi que a FCP-SAD poderia ter oferecido um juro ligeiramente mais baixo. Não teriam aparecido os tais "100 milhões" mas apareceriam os milhões suficientes para satisfazer os 10 milhões necessários.
Não estou a criticar, antes pelo contrário, mas penso que deveria ir novamente ao mercado procurar novo financiamento oferecendo agora uma taxa mais baixa, que serviria para amortizar os empréstimos à banca, pelos quais estará a pagar bem mais do que os "tais" 8% de juro.

Carlos disse...

a SAD teve de pagar 8% para atrair os investidores porque o mercado assim o exige
a concorrência, que não passa pelos depósitos a prazo, é grande e oferece taxas de remuneração bem interessantes.
na minha opinião, mais do que o risco das obrigações do Porto, o mercado actual obriga taxas de remuneração desta ordem para que haja interesse por parte dos investidores

embora no caso do futebol o factor 'coração' tenha um impacto como se vê no caso das acções dos clubes

Mário Faria disse...

Não entendo. Ninguém parece preocupado. O futebol português vive muito acima do país real.
Olho para a Grécia e a ordem é suspender:"A Federação Grega de Futebol decidiu suspender toda a atividade de selecções e clubes a partir de segunda-feira e por tempo indeterminado. A intenção é proceder a uma reforma total."´
Um empréstimo obrigacionista a juros de 8%, emitido antes do anterior (empréstimo) ser vencido, é coisa que me inquieta. Quase tanto como a situação de grave crise em que vivemos, no nosso país, de forma tão próxima à grega.
Estou preocupado e gostaria de ser melhor informado.

MM disse...

Dou tanta importancia a esse avençado como à Selecção Nacional da Eritreia.

Respondo com uma pergunta:

Qual é a taxa de juro a particulares, para um emprestimo, por exemplo?

Fonte MG:

"Exemplo de Financiamento
Prestação mensal de 198,66 euros, correspondente a um contrato de financiamento no montante de 9.000 euros pelo prazo de 60 meses. A TAN do contrato é de 7,728%, calculada em 7 de Julho de 2009 e resulta da adição de um spread de 6,5% ao indexante Euribor a 3 meses (1,228% em Julho de 2009. A TAEG é de 12,303%, foi calculada nos moldes definidos pelo Decreto-Lei n.º 133/2009 e inclui o custo com seguro de protecção ao crédito PPCI (Plano B, 1 mutuário) e os montantes referentes a impostos e a despesas de contratação."- fim de citação.

Agora articule-se a verbas, em vez de pessoal, passa a empresa (de risco neste caso)e...

O tal Director deve ter feito o texto em cima do joelho, porque não sabe o que diz nem tão pouco do que fala!

Zé Luís disse...

Zé Correia,

tá tudo certo.

Os mercados, cujo funcionamento está bem descrito e é hoje bem perceptível ao comum cidadão já consciente do que tem ouvido sobre o assunto (se não for muito estúpido ou ideologicamente faccioso).

O Pedro Guerreiro, enquanto especialista de jornalismo económico (não sei se é Economista) e se se ficar por aí.

O Pedro Guerreiro, cujos escritos sobre a estrita Economia são do meu agrado, estraga tudo quanto mete clubite pelo meio.

Ora, esta descrição é boa no plano técnico e enviesada no plano clubístico-emocional. Porque, de facto, como outros comentários aqui percebem e descrevem, o financiamento, em geral, pela Banca (em geral), está como está. O chamariz para mais gente, investidores e dinheiro é pôr o juro a uma forma atractiva que nem olham para trás. O FC Porto, segundo a tese da prudência, poderia especular com e contra os "mercados". Podia, mas isso é como fazer o futebol segundo Mourinho, e o FC Porto está na fase de prà frentex do AVB.

O problema do PG é meter um bocado o "veneno" por ser o FC Porto. Se se quedasse por outras explicações e contextos técnicos e se abstraísse do clube/entidade em causa seria capaz de muito melhor e satisfazer toda a gente.

No fim, fica a imagem do "betinho" doentinho antiportista, quando queria em princípio explicar coisas básicas do mercado financeiro.

Aliás, neste contexto dos opinadores, continuo a preferir os que falam de Economia pura, explicando tudo direitinho de forma entendível para a maioria das pessoas. Cito o José Gomes Ferreira, da SIC, que me satisfaz totalmente e é jornalisticamente idóneo para transmitir tais conceitos e percepções da coisa. Aliás, não o troco por outra gente qualquer da televisão, quando muito o editor de Economia da TVI, de que não lembro o nome agora, é igualmente capaz.

Quando os opinadores, invariavelmente facciosos e lisbonenses, falam sobre Futebol não há metade da matéria dita que tenha interesse e seja objectivamente bem retratada. E, contudo, tecnicamente poderiam falar de futebol, se soubessem e despissem a camisola. Mas não era a mesma coisa.

Pedro Guerreiro é o que costuma misturar a sua capacidade técnica do jornalismo económico com o facciosismo clubístico. E assim, claro, não é a mesma coisa.

Luís Negroni disse...

O Porto em 2006 pagou 6% de juros, o slb em 2007 pagou 6,15% e o sporting em 2008 pagou 7,3%. Esperemos para ver que juros pagarão slb e scp em próximas emissões obrigacionistas e quais serão os bitaites do Pedrito Benfiquista acerca do assunto.

Não estou nada preocupado com este empréstimo obrigacionista nem com a respectiva taxa. O Porto tem neste momento um plantel com jogadores quase todos jovens e quase todos muito valiosos, que avaliados por baixo, muito por baixo, renderiam mais de 200 milhões de euros. E vou eu estar muito preocupado com "a porcaria" de 10 milhões de euros, que bastava vendermos um Rolando ou um Fernando e pagávamos essa quantia e ainda ficávamos com outro tanto?

PS Se calhar podia pagar-se uma taxa ligeiramente mais baixa, 7,5% ou coisa parecida mas os 150.000 euros ou coisa parecida que vão "deitar-se fora" nos próximos 3 anos, não terão sido compensados pelo "efeito psicológico" no mercado e não só, da procura 10 vezes superior à oferta, recorde neste tipo de obrigações?

Daniel Gonçalves disse...

Concordo que era preferível esta forma de financiamento do que, na actual conjuntura económico-financeira, ir à Banca solicitar capital.
Relativamente à opinião do Pedro Guerreiro sobre esta operação financeira parece-me facciosa e subtende-se uma profunda repugnância pelo FC Porto claramente manifesta no tom sarcástico com que ele escreve "Nós somos os mercados. E o Futebol Clube do Porto não se queixou. Nem um bocadinho..." Sendo assim a análise dele perde toda a objectividade e isenção que é suposto um profissional/académico ter, como o reconheceu o Zé Luís no comentário anterior. Há umas semanas atrás este Pedro Guerreiro esteve no programa da SIC Notícias "O Eixo do Mal", ouvi os comentários dele e, independentemente de qualquer ideologia, reconheci que, apesar de as suas afirmações económico-finaceiras estarem correctas, eram bastante banais e triviais, a certa altura do programa dei por mim a cogitar qual seria o clube dele (desconhecia qual, pois só com este post do José Correia fiquei a saber que ele era benfiquista) e imaginei que seria benfiquista, afinal não errei.

José Correia disse...

Penso que uma das razões para a FC Porto SAD ter avançado, nesta altura, com este empréstimo obrigacionista, é para poder estar mais à vontade para resistir a ofertas para jogadores que não quer vender.