Numa análise puramente económica podemos observar que se mantêm praticamente inalterados os Proveitos Operacionais, constituídos em minha opinião por seis tipos de receitas ‘core’ (Bilheteira, TV, UEFA, Publicidade e Sponsors, Corporate e Outros) nos 55 M€ mas que existe um aumento considerável de Custos com Pessoal (+4,7 M€) (justificado no Relatório e Contas pelo investimento no plantel e por renovações com o intuito de mitigar os efeitos perversos da aplicação da Lei Webster) e um aumento ligeiro nos FSE's (+0,8 M€) e ainda uma duplicação dos Outros custos operacionais (+0,7 M€) o que nos leva a um resultado operacional (EBITDA) negativo de 1,6 M€ (Nota: não levo em linha de conta o EBITDA apresentado no R&C porque este inclui mais-valias obtidas com transacções de passes de jogadores, algo que não me parece de todo poder encaixar no conceito de "operacional").
Assim, a actividade corrente da SAD foi deficitária em 2007/2008, contrariamente ao que aconteceu em 2006/2007 em que foi possível apurar um resultado operacional positivo de 7,7 M€. Já na época de 2005/2006 tínhamos registado um valor negativo de 11,6 M€.O quadro acima demonstra que a sociedade tem tido grandes dificuldades em ‘segurar’ o crescimento dos Fornecimentos e Serviços Externos (FSE’s) e também um crescimento preocupante dos Custos com Pessoal, embora neste último caso se entenda que tenham existido renovações com inclusão contratual de cláusulas de rescisão para evitar o que aconteceu com a saída do Judas para o Atlético de Madrid ao abrigo da “Lei Webster”. No que respeita a Proveitos Operacionais é possível identificar uma tendência para a sua estabilização em torno dos 55 M€ sendo as receitas provenientes de participação nas Provas UEFA aquelas que têm tido maiores variações (daí se entendendo a importância no Orçamento anual da passagem aos oitavos de final da Liga dos Campeões). De registar ainda um interessante crescimento da rubrica Publicidade e Sponsorização ao longo dos três últimos exercícios.
Por outro lado assistimos a uma progressão da função financeira com o crescimento do endividamento bancário de curto prazo em 22 (vinte e dois!) M€, com o consequente aumento dos custos financeiros (leia-se neste caso juros e comissões, porque os custos financeiros propriamente ditos diminuíram devido ao fim dos - para mim inexplicáveis - "descontos de pronto pagamento concedidos). O endividamento bancário total aumentou cerca de 43% no último ano.
Em termos financeiros temos um enorme desajuste entre Activos Correntes e Passivos Correntes (com um saldo negativo de cerca de 25 M€), o que indicia uma enorme dificuldade da sociedade em cobrar dívidas. Da degradação na relação entre prazos de pagamento e prazos de recebimento, que já é uma constante ao longo dos últimos anos, ressalta naturalmente uma maior pressão sobre a tesouraria (confirmada por uma degradação nos rácios de liquidez).
O aumento da dívida bancária está, de certa forma, suportado no aumento dos capitais próprios dado que o rácio debt-to-equity (relação entre dívida e capital próprio) diminuiu consideravelmente de 2006/2007 para 2007/2008. No entanto é uma situação arriscada aumentar a dívida bancária de curto prazo por um montante superior ao do total do capital próprio. O aumento da dívida tem, em minha opinião, dois objectivos: suportar os investimentos feitos no plantel e fazer face ao aumento do ciclo de tesouraria.
Nos últimos anos a SAD não tem conseguido inverter a sua tesouraria líquida (diferença entre o Fundo de Maneio e as Necessidades de Fundo de Maneio) para valores positivos, o que a coloca num problema de solvabilidade, com maior dependência do sistema bancário, como está bem patente no crescimento da dívida bancária.
Sumariamente poderemos concluir que a SAD não gerou dinheiro a partir da exploração e que não tem apresentado uma actividade pautada pela estabilidade dos fluxos. Como tal, não se encontra numa situação de equilíbrio financeiro. Ao contrário do que é afirmado pelos Srs. Administradores no Relatório de Gestão, a generalidade dos rácios e indicadores, bem como a sua evolução no último ano, não demonstram que "os resultados apresentados permitam vislumbrar uma maior solidez e consistência na estrutura patrimonial da sociedade". Tendo presente que na actual conjuntura de crise financeira a nível global os valores de receitas obtidas com transferências de jogadores deverão baixar consideravelmente, parece-me no entanto que se deve dar o benefício da dúvida a esta Administração uma vez que já deu mostras de possuir qualidades de alquimista no que respeita à potenciação de receitas com transferências de jogadores para clubes de top no panorama europeu.
12 comentários:
A análise às contas feita pelo Nuno revela a qualidade e o rigor habitual de quem a fez.
Vou colocar algumas questões para o Nuno, se tiver tempo e pachorra, responder.
«mantêm praticamente inalterados os Proveitos Operacionais, constituídos em minha opinião por seis tipos de receitas ‘core’ (Bilheteira, TV, UEFA, Publicidade e Sponsors, Corporate e Outros) nos 55 M€»
Tenho ideia de ter lido que as receitas de Bilheteira e da UEFA (LC) baixaram relativamente a 2006/07 cerca de 10%.
A confirmar-se, é dada alguma explicação para este facto?
Relativamente ao Corporate, o grosso destas receitas ainda está indexado ao Project-finance do Estádio, correcto?
Até que ano isso vai acontecer?
É divulgado o valor total destas receitas?
«existe um aumento considerável de Custos com Pessoal (+4,7 M€)»
Este aumento de custos com Pessoal, abrange apenas os custos do plantel, ou também custos com a estrutura da SAD?
«Em termos financeiros temos um enorme desajuste entre Activos Correntes e Passivos Correntes (com um saldo negativo de cerca de 25 M€), o que indicia uma enorme dificuldade da sociedade em cobrar dívidas. Da degradação na relação entre prazos de pagamento e prazos de recebimento, que já é uma constante ao longo dos últimos anos, ressalta naturalmente uma maior pressão sobre a tesouraria (confirmada por uma degradação nos rácios de liquidez).»
Isto significa o quê?
Que somos mais rápidos a pagar os passes dos jogadores que compramos do que a receber daqueles que vendemos?
«O endividamento bancário total aumentou cerca de 43% no último ano. (...) O aumento da dívida bancária está, de certa forma, suportado no aumento dos capitais próprios dado que o rácio debt-to-equity (relação entre dívida e capital próprio) diminuiu consideravelmente de 2006/2007 para 2007/2008.»
Na minha ignorância, fiquei sem perceber se neste aspecto - endividamento bancário - a situação da SAD melhorou ou piorou relativamente a 2006/07.
As receitas de Bilheteira baixaram 11,35% enquanto as receitas das Provas UEFA diminuiram 7,94%.
Diz o R&C na pág. 12 que "este decréscimo (Bilheteira) ficou a dever-se, em grande parte, à diminuição dos proveitos obtidos com a venda de bilhetes individuais de jogo, com destaque negativo para o jogo com o Schalke 04, que obteve uma significativa quebra de receita, comparando com outros jogos dos oitavos de final da Champions League, em que o F. C. Porto defrontou equipas de renome do futebol europeu. Complementarmente, também se verificou uma descida das receitas resultantes das quotas dos associados do F. C. Porto".
Já que no que respeita a Provas UEFA diz o mesmo Relatório que "a diminuição da receita obtida deve-se exclusivamente ao facto de, no exercício anterior, a UEFA ter distribuído um montante extraordinário no valor de 1M€.
Quanto às receitas de Corporate diz-nos a administração da SAD que:
"Os resultados da gestão do negócio Corporate Hospitality, que atribui à F.C.Porto – Futebol, SAD o montante excedentário decorrente da gestão do negócio corporate (direitos de utilização de camarotes e lugares para empresas no Estádio do Dragão para assistir a jogos do F.C.Porto), depois de honrados todos os compromissos decorrentes do project finance para a construção do Estádio, foi neste exercício de 2M€. A diminuição verificada neste item não está relacionada com o insucesso na comercialização deste negócio, mas antes com o facto de neste exercício ter havido um custo extraordinário, relativo ao IMI de 2004 e 2005 que, consequentemente, fez diminuir o resultado líquido deste negócio."
Os custos com pessoal aumentaram, como já referi, em 4,7 M€. A repartição desse aumento pode ser vista da seguinte forma:
Orgãos Sociais: + 0,6 M€
Atletas: + 4,3 M€
Técnicos e Adm.: + 1,0 M€
Seguros: - 0,4 M€
Outros: - 0,8 M€
«Em termos financeiros temos um enorme desajuste entre Activos Correntes e Passivos Correntes (com um saldo negativo de cerca de 25 M€), o que indicia uma enorme dificuldade da sociedade em cobrar dívidas. Da degradação na relação entre prazos de pagamento e prazos de recebimento, que já é uma constante ao longo dos últimos anos, ressalta naturalmente uma maior pressão sobre a tesouraria (confirmada por uma degradação nos rácios de liquidez).»
"Isto significa o quê?
Que somos mais rápidos a pagar os passes dos jogadores que compramos do que a receber daqueles que vendemos?"
CORRECTO.
O aumento do endividamento bancário só se justifica em caso de aumento do investimento. O que se passa é que o valor do investimento é muito idêntico ao do desinvestimento ou, se quiserem, o valor total das aquisições é semelhante ao das vendas de jogadores, por isso depreendo que o aumento do endividamento bancário serve essencialmente para fazer face a dificuldades de tesouraria.
"Os resultados da gestão do negócio Corporate Hospitality, que atribui à F.C.Porto – Futebol, SAD o montante excedentário decorrente da gestão do negócio corporate (direitos de utilização de camarotes e lugares para empresas no Estádio do Dragão para assistir a jogos do F.C.Porto), depois de honrados todos os compromissos decorrentes do project finance para a construção do Estádio, foi neste exercício de 2M€."
in Relatório e Contas
É pena que o Relatório não indique qual é o valor total do Corporate Hospitality porque, quando o project-finance do estádio terminar, a SAD irá passar a ter uma receita adicional que, suponho, seja significativa.
"É pena que o Relatório não indique qual é o valor total do Corporate Hospitality porque, quando o project-finance do estádio terminar, a SAD irá passar a ter uma receita adicional que, suponho, seja significativa."
Sim, lá para 2030... :)
José Correia:
"É pena que o Relatório não indique qual é o valor total do Corporate Hospitality porque, quando o project-finance do estádio terminar, a SAD irá passar a ter uma receita adicional que, suponho, seja significativa."
A partir da época 2018-2019 a SAD fica com o direito às receitas do Corporate Hospitality. Tal está expresso no R&C de 2003-04.
Enviar um comentário