sábado, 12 de setembro de 2009

O futebol é um negócio?

Extractos de um interessante artigo publicado pelo Jornal de Negócios em 14 de Agosto 2009, acerca do livro 'Why England Lose: and Other Curious Phenomena Explained', de Simon Kuper e Stefan Szymanski.

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Os números do futebol, analisados pelo economista Stefan Szymanski e pelo jornalista de desporto Simon Kuper, revelam factos surpreendentes. E derrubam muitos mitos da modalidade. Afinal, o futebol não é um grande negócio. Nem um bom negócio. E há dúvidas de que seja um negócio.

Na temporada 2008/09, o Real Madrid liderou o "ranking" Football Money League elaborado pela consultora Deloitte, com receitas de 325 milhões de libras (cerca de 379 milhões de euros). Um valor "simpático" mas muito pequeno quando comparado com o da maior empresa cotada na bolsa londrina. A Royal Dutch Shell encerrou 2008 com receitas de 458 mil milhões de dólares (323 mil milhões de euros).

Os autores sublinham ainda que no futebol, ao contrário do que acontece noutros negócios, os clubes são classificados pelas receitas, e não pelo lucros ou pelo valor de mercado. "Na verdade, nenhum destes métodos funciona no futebol". Por "excelentes razões", a maior parte dos clubes nem sequer está cotada em bolsa e, se a Deloitte os classificasse pelos lucros, os resultados seriam "embaraçosos".

O futebol não é apenas um pequeno negócio. É também um mau negócio.
"Qualquer pessoa que passe algum tempo dentro do mundo do futebol rapidamente descobre que, tal como o petróleo faz parte do negócio petrolífero, a estupidez faz parte do negócio futebolístico". Quem está a gerir os clubes de futebol não domina as técnicas da gestão. E muitas das ideias de negócios implementadas são impostas pelo exterior.
Como aconteceu no início dos anos 90 com o Relatório Taylor, que obrigou os clubes a renovarem os seus estádios. "Era uma ideia de negócio óbvia." "Não admira que entre 1992 e Maio de 2008, mesmo antes do colapso financeiro, 40 dos 92 clubes profissionais de Inglaterra tenham estado envolvidos em processos de insolvência, alguns mais do que uma vez".

Depois de concluírem que o futebol não é um grande negócio, nem um bom negócio, Simon Kuper e Stefan Szymanski ficam com dúvidas. Será que o futebol é mesmo um negócio? Os autores olham para o exemplo de Alan Sugar, que em 1991 se tornou presidente do Tottenham. O seu objectivo?
Conseguir que o clube vivesse com os meios de que dispunha. Nem pensar em transferências milionárias.
"Ele manteve a sua palavra". Mas dez anos mais tarde, os fãs odiavam-no, o clube só tinha conseguido ganhar uma Taça da Liga e passou a maior parte do tempo no meio da tabela. E conseguiu apenas um lucro de 2 milhões de libras por ano nos primeiro seis anos. Gerir uma equipa de futebol com o objectivo de fazer dinheiro é uma causa perdida. Os lucros privam o clube de dinheiro que poderia ser gasto na equipa. "O negócio do futebol é futebol".

Em 1923 a Liga Inglesa de Futebol era formada por 88 clubes. 84 anos mais tarde, na temporada 2007/08, 97% dessas equipas ainda existiam. E a maioria delas (48) permanecia na mesma divisão. O mesmo não se pode dizer das 100 maiores empresas do mundo. Nas últimas oito décadas, quase metade desapareceu. Enquanto outras mudaram de sector ou de localização.
"Quase todos os clubes profissionais de Inglaterra sobreviveram à Grande Depressão, à II Guerra Mundial, a recessões, directores corruptos e gestores pavorosos. É uma história de estabilidade extraordinária". "Apesar de serem geridos de forma incompetente, são um dos negócios mais estáveis ao cimo da Terra", concluem Kuper e Szymanski.


(*) Simon Kuper é jornalista de desporto no "Financial Times", enquanto Stefan Szymanski é economista e dá aulas na Cass Business School, em Londres.

6 comentários:

dragao vila pouca disse...

Se no futebol acabar a paixão, o entusiasmo, o coração e passar a ser dirigido com o pragmatismo das empresas que só vêm lucros, é o caminho para o fim. É obvio que a gestão não pode ser de merceeiro, mas os lucros têm se ser em primeiro lugar os títulos, os sucessos, as vitórias...foi com esse espírito que comprei as acções do F.C.Porto e não para vir a ter qualquer benefício futuro. Chmamem-lhe o que quiserem, mas se mesmo assim, fica cada vez mais difícil manter a chama, se "isto" passar a ser só a frieza dos números eu por mim dou a vaga.

Um abraço

Anónimo disse...

E pronto, lá vamos ter os indefectíveis a dizerem que até os ingleses dão razão à "gestão de risco" da SAD.

O objectivo de um clube de futebol - ou de qualquer outra modalidade, claro - é desportivo e não financeiro. Até aí estaremos todos de acordo. Agora experimentem dizer isso aos boavisteiros e aos salgueiristas. O "porreirismo" financeiro levou-os ao fundo.

John Aarson disse...

O FC Porto é um claro exemplo que vai contra o que é dito nesse texto. É possível fazer uma boa gestão desportiva e financeira. Sempre foi.

Anónimo disse...

Não é pacífico que o FCP faça uma boa gestão financeira. Vide venda de Lucho González, que com uma boa gestão financeira teria sido evitável.

John Aarson disse...

Não concordo. Nunca receberíamos tanto pelo lucho se ele fosse vendido para o ano ou para o outro. Isso para além de o Lucho este ano ter feito uma época extremamente "assim assim". Boazita, vá lá. Em comparação com épocas anteriores o Lucho esteve alguns furos abaixo e não foi consistente nas exibições. Foi muito bem vendido, embora eu tenha tido muita pena.

Disse e volto a dizer: o FCP em termos de venda de jogadores é um clube único no mundo e um modelo a seguir.

Paulo Marques disse...

Independentemente do lucho, qualquer empreendimento que movimenta tanto dinheiro é um negócio. Se os clubes em si não dão lucro, é porque há imenso desperdício e imenos mercenários a cobrar muito dinheiro pelos seus serviços.
Diria também que segundo as contas oficiais, os filmes e os cds também não dão lucro, o que toda a gente sabe que é mentira. Não me parece que as pessoas com poder no futebol não aprendam com isso. Não foi há muitos anos que se falou em contas na Suiça de altos cargos na FIFA.