Iker Casillas é um dos jogadores mais titulados da História, um 
jogador que já jogou (e venceu) todas as grandes competições de elite, 
um dos melhores guarda-redes de sempre - numa lista alargada, é certo - e
 um homem que sabe liderar, quando quer. Sérgio Conceição não ganhou nem
 um quinto do que ganhou Casillas, como jogador, mas o seu carácter e 
liderança sempre foram imagem de marca e desde que passou do relvado ao 
banco sempre fez da honestidade, do trabalho colectivo e do espírito de 
grupo, caracteristicas marca da casa da sua filosofia de trabalho. É por
 isso, sobretudo, que estamos a viver o melhor arranque de temporada dos
 últimos cinco anos. E é por isso que não nos podemos permitir deixar 
que um problema interno, de resolução interna, afecte a crença neste 
projecto, neste grupo e, sobretudo, neste Mister.
Desportivamente
 Casillas tem tido um papel positivo desde que chegou. Não superlativo -
 não foi capaz, até agora, de reproduzir o papel de um Mlynarzick ou 
Schmeichel, por exemplo - mas a sua classe não está nem esteve nunca em 
discussão. Teve falhos importantes, sobretudo na Champions, mas também 
momentos de brilhantês que ajudaram a equipa ainda que, no final, por 
muitos outros factores, os objectivos não fossem alcançados. O melhor 
exemplo comparativo de Casillas destes últimos três anos seria talvez o 
do belga Michel PreudHomme, um grande guarda-redes que não foi 
suficiente para que um mau Benfica fosse competitivo. 
Casillas
 foi também fundamental no processo de adaptação de vários jogadores 
jovens e de muitos dos colegas espanhóis - ou com passagem por Espanha -
 e nesse sentido é uma referência importante no balneário. Sem estar na 
lista de capitães é um líder, silencioso, como aliás tem sido sempre. Se
 houve algo que sempre se lhe apontou foi a dificuldade em assumir o 
papel de máximo líder de grupo. Em Madrid sempre foi ofuscado por perfis
 superiores, nesse sentido, como eram primeiro Hierro, Raul e até 
Roberto Carlos ou Guti e mais à frente, já de braçadeira, por Sérgio 
Ramos ou Alvaro Arbeloa. Na selecção espanhola, da qual foi capitão uma 
década, também o central de Camas ou jogadores como Puyol ou Xavi, 
passou o mesmo. Não esperem de ele outra coisa e para alguns treinadores
 isso é um incómodo porque imaginam que tanta experiência deve vir 
acompanhado de algo mais, desse plus. O que também sempre faltou a Iker,
 desde a sua ascensão meteórica, foi o compromisso de dedicação absoluta
 ao trabalho. Todos os seus treinadores passaram por problemas com a sua
 implicação com os treinos ou, nalguns casos, nos seus inicios, com a 
sua vida fora do terreno de jogo. Desde del Bosque a Ancelotti, passando
 por Capello ou Mourinho, sempre se comentou que a dedicação nos treinos
 era inferior à exigência do seu posto, que Iker pouco procurava 
melhorar os seus pontos fracos - jogo de pés ou cruzamentos à área, 
sobretudo - e que devido ao seu perfil mediático, primeiro com o Real 
Madrid e com Espanha e logo no Porto, dava demasiadas vezes a sua 
titularidade por assumida. Esse desleixo custou-lhe vários problemas, a 
saída do Real Madrid, primeiro, e da selecção espanhola depois. E essa 
desconexão está agora a provocar um fait-divers que só tem contribuído 
em ofuscar este brilhante inicio de temporada.

 
Sérgio
 Conceição tomou a decisão que se exige a um líder de um vestuário de 
muitos. Instaurou umas regras e decidiu punir quem entendeu que não as 
cumpria. Fê-lo sem olhar a nome, apelido, número e salário como 
corresponde a um líder. O exemplo dá-se precisamente quando se demonstra
 que ninguém é intocável. 
Desportivamente claro que a equipa 
sai a perder - José Sá está a anos-luz do pior Casillas, que nem sequer 
era o que estávamos a ver - mas se Conceição quer manter o grupo unido 
debaixo de uma ideia, é necessário actuar em consequência. Se este 
projecto tem sido competitivo é, precisamente, pelo grupo e pelo 
trabalho de Conceição. Não é pelo talento individual  - que quase não há
 - não é por nenhuma inovação táctica bestial - o sistema habitual é 
bastante elementar - e não é seguramente por Casillas. É pelo grupo, 
pelo espírito restaurado e pela disciplina que nos mantemos altamente 
competitivos. E isso é o que não se pode perder.
Casillas 
cometeu um erro. Acontece. Qualquer profissional comete erros. Que seja 
recorrente na sua carreira é um reflexo do tipo de atleta que é e foi 
mas não é motivo para criar um drama. Conceição actuou como tem de 
actuar, como devíamos todos esperar que actue um treinador do FC Porto. 
Não acredito que tenha feito uma cruz a um jogador importante mas também
 não quis deixar de marcar posição. Havia uma regra de grupo - reforçada
 depois do incidente com Aboubakar (que, recordemos, foi apanhado por um
 telemóvel que não era o seu num directo gravado por um colega, não por 
ele) e que os jogadores estão a respeitar. O telemóvel em dias de jogo 
não existe, as redes caladas, a concentração máxima. Desrespeitar uma 
regra elementar é um erro que deve ser assumido diante do grupo e entre 
todos passar página. Não é motivo de drama, é motivo de união, ainda 
mais se for possível, entre todos. Se Iker, com os seus quase vinte anos
 de carreira e balneários, tiver a humildade de desculpar-se ao grupo e 
se Sérgio tiver a liderança necessária para saber reforçar essa união, 
este episódio tem tudo para unir ainda mais o plantel. Se um deles 
decidir continuar fiel a uma postura inflexível, teremos um problema e 
José Sá corre o risco de sofrer um dano colateral que não merece. Se for
 ele o titular este sábado deve ter o apoio de todos. Se não o for deve 
entender a dificil natureza da sua situação. O que todos esperam é que 
isto seja um fait-divers e não um ponto de viragem. 
No
 entanto, uma coisa é certa. Todos os que pediam o "velho Porto", o da 
cultura de balneário, o de não saltar nada para fora, o do final das 
vedetas e o de um treinador capaz de fazer grupo, têm de saber que este é
 o momento para mostrar o verdadeiro apoio ao único homem que tem, 
dentro da estrutura, lutado pelo regresso a essa realidade. Um Porto onde quem decide é o treinador, nem interesses da SAD ou de agentes externos. Um Porto à Porto. Conceição 
cumpriu o seu papel - não foi ele que faltou a uma regra de grupo -  e 
no pior dos casos, se Casillas não demonstrar o arrependimento 
necessário que a situação exige e o seu afastamento siga, por muito que 
desportivamente signifique sair a perder, os adeptos devem mostrar o seu
 apoio incondicional ao homem que tem estado detrás de tudo o bom que 
tem sucedido desde Julho, desde a recuperação de jogadores ostracizados à
 recuperação do espírito competitivo e ofensivo de sempre sem esquecer a
 liderança isolada da liga e a luta pelo apuramento aos oitavos-de-final
 da Champions (objectivo realista neste contexto presente). Com todo o 
respeito para Iker - e qualquer jogador que se coloque voluntariamente 
nessa situação - o orgulho que eu tenho desta equipa, neste momento, tem
 um responsável principal e não tenho problemas em afirmar, estou com 
Sérgio, até ao fim.