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terça-feira, 10 de março de 2015

A Julen o que é de Julen

Este texto sai propositadamente antes do jogo com o Basel. Não quer ser um texto oportunista se o FC Porto garante o apuramento para os quartos-de-final (primeira vez desde 2009, já lá vão seis longos anos) nem pessimista se o improvável – a julgar pelo que passou na Suiça, suceder e voltemos a cair com um rival à nossa altura (como passou em Málaga). E sai agora porque Julen Lopetegui o merece.

É muito difícil – diria mesmo quase “colinhamente” impossível – que o treinador basco conquiste o titulo que escapa desde que Vítor Pereira vergou Jorge Jesus com um golpe de 92 graus Kelvin. Todos sabemos o que se passa, semana sim, semana também, nos relvados portugueses. Não vale a pena dar mais voltas, apenas lutar até ao ultimo suspiro como exige a camisola e culpar aqueles que realmente permitiram este controlo quase absoluto das instituições arbitrais na sombra, esses que vestem traje. Com a Taça de Portugal perdida – e mal perdida, é certo e inequívoco – e a Taça da Liga no número 374 das minhas prioridades do ano (logo a seguir ao titulo de bilhar), sobra a Champions League. E Lopetegui tem o claro objectivo de colocar o FC Porto no top 8 da Europa. Se o fizer terá cumprido com uma parte importante da sua missão. Terá merecido o nosso aplauso porque, já nos diz a nossa história recente, não tem sido fácil chegar longe na Champions. Há outros que acham que são os melhores treinadores do Mundo, não a jogar Playstation mas a treinar na Europa League. Níveis de exigência distintos, está claro.

Lopetegui vai ficar um ano mais inequivocamente e pode ficar com esse bom registo europeu e um subcampeonato que, se tudo correr bem, com vitória na Luz incluída, pode obrigar o clube da capital a sofrer até ao último jogo do ano depois de tudo ter procurado fazer (em jogos próprios e alheios) para ser campeão mais cedo e tranquilamente. Lá chegaremos. Mas se hoje as coisas correrem mal, o cenário afinal não será diferente dos Jesualdos, Vítor Pereiras, Co Adriaanses e afins nos palcos europeus. Nada a que não estejamos habituados. O que sim é preciso reconhecer é o trabalho de fundo realizado. E aí é preciso dizer que a Julen o que é de Julen.
Não considero que seja um grande treinador na esteira de grandes treinadores que o FC Porto já teve nas suas filas. Não é preciso procurar exagerar para fazer justiça. Fui critico com Lopetegui quando chegou, fui critico com as suas decisões, poderia sacar o oportunismo de não ser campeão (como é provável) para dar-me a razão mas acho que o treinador mereceu não só o segundo ano no banco como o meu respeito. E fê-lo sem estridências, sempre com uma ideia concreta. Fê-lo sendo fiel a si mesmo, a mesma fidelidade que transformou uma defesa com vários erros posicionais quando a dupla era Maicon-Indi numa defesa de ferro muito mais bem estruturada quando jogam Maicon e Marcano. Critiquei a incorporação de Marcano e graças a Lopetegui hoje posso dizer que me enganei. Como o treinador, não está nem sequer no top 10 dos melhores centrais que vi de dragão ao peito em vida. Não está. Mas traz essa tranquilidade e organização que faz tanta falta num projecto novo como este. Marcano é um exemplo. Um de muitos.


O crescimento espantoso de Danilo, hoje um dos melhores do Mundo na sua posição, deve-se sobretudo ao trabalho de Lopetegui que lhe meteu ordem e confiança na cabeça depois do desnorte que foi servir no ano passado. Danilo é um desses jogadores que, bem polidos pelo treinador, vai longe. Este ano prova-o. Uma pena que tenha perdido um ano de carreira por uma decisão presidencial nefasta. Mas não é único sinal positivo. Longe disso. A esperança de um futuro menos doloroso depois da sua inevitável saída, com Ricardo Pereira a jogar, também é obra do treinador que pegou num extremo que tinha feito a posição para ensiná-lo, como fizeram no passado com Conceição de forma inversa, a que tem as condições para dominar o carril completamente.
A transformação mental – sobretudo mental – de um Tello que jogava para si e tomava sempre a decisão final errada num Tello que joga para todos e que, graças a isso, aprendeu a sacar a espinha individual de golos que tinha atravessada, também é mérito seu. Lopetegui é o homem que lançou Ruben Neves – a maior prova de confiança de um treinador do FC Porto na formação desde que o Octávio Machado lançou o Ricardo Carvalho – mas não o queimou, dosificando um miúdo que há um ano jogava encontros de 80 minutos e passeava anónimo nas ruas. Foi o treinador que recuperou emocionalmente Herrera – e que desastre foi Herrera no ano passado – para o transformar num jogador mais colectivo ainda que continue a ser para mim uma peça a mais na sua ideia geral e uma dor de cabeça para quem segue o jogo e se asfixia nas suas correrias sem sentido. Brahimi, Oliver, Alex Sandro, todos têm crescido com a ideia de jogo colectivo de Lopetegui porque esta implica potenciar as suas valências dentro de um bloco colectivo organizado, tudo aquilo que não se viu no ano passado.

Se considero – e considero – ainda que algumas das suas petições pessoais em Julho foram tiros falhados totalmente – Andres Fernandez, Opare, Campaña – isso não pode tapar o bom trabalho que fez em potenciar alguns dos jogadores que já por cá havia. Nem todos, é certo. Quintero parece perdido em ser sempre Quintero e Quaresma está condenado, já o sabemos, a ser Quaresma. Mas são casos pontuais – e um treinador não é um milagreiro – num colectivo que parece cada vez mais mentalmente unido em trabalhar em conjunto. Oito meses depois de ter começado a trabalhar com grande parte do plantel, esse é o maior mérito do treinador.

Lopetegui tem uma ideia que o clube partilha e que implica resultados a médio prazo, algo pouco habitual em que parece ter vivido os últimos anos no imediatismo absoluto. A carteira tem algo a ver com essa mudança (aparentemente) de visão. Nessa ideia há espaço para crescer o produto da casa – o Gonçalo é bom exemplo e há mais a caminho, dêem-lhes tempo e dêem-lhes oportunidades –  mas também potenciar negócios da SAD como tem sido habitual. Danilo é o melhor exemplo (quem pensava há um ano que se poderia sacar lucro de um investimento como o seu?) mas a seguir vêm Aboubakar (do qual só temos 30%), Alex Sandro e se tudo correr bem na sala de aulas pode ser que Indi ponha em prática conceitos que, seguramente, conhece de sobra.


Depois dos tropeções iniciais – os por culpa própria como o Boavista, a mancha mais negra no "reinado" do basco, e os por culpa alheia como o jogo em Guimarães – a equipa está a uma vitória na Luz e um tropeção do Benfica do conseguir o que parecia impossível depois de subir o Evereste com uma sucessão de demonstração de superioridade inaudita frente a rivais complicados. E sem colinho, vejam lá. Há muito, muito trabalho por fazer. Muito. O nosso jogo de bola parada é fraco. A nossa eficácia ofensiva também, para a superioridade com a bola que geramos. Exige-se que uma equipa que domina totalmente o processo de construção de jogo seja capaz de rematar mais vezes e de forma mais acertada do que fazemos. O trabalho ofensivo, sobretudo de recuperação e posicionamento melhorou de forma tremenda e hoje somos uma das melhores defesas da Europa. A equipa joga como um bloco, pensa como um bloco e actua como um bloco, para o bem e para o mal. Quem viu o perigoso que pode ser uma anarquia no relvado, no ano passado, sabe do que falo.

Espero sinceramente que o Lopetegui possa hoje à noite riscar um dos objectivos do ano e trabalhar sem pressão até Maio (porque como estão as coisas aqui a pressão sobra) e a continuar a pensar na sua ideia de FC Porto para 2015/16. Sem ser um treinador que me enche as medidas e que me faz parar para ouvir o que tem a dizer com devoção, como fiz com outros que ocuparam o seu lugar no banco das Antas e do Dragão, não deixa de ser um homem que está determinado a deixar um legado. E a esse tipo de homens sempre há que respeitar e esperar para ver que Ás vão sacar da manga.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

A entrevista de Lopetegui ao El Pais em frases e conceitos


Julen Lopetegui concedeu uma entrevista ao prestigioso jornal espanhol El Pais. Uma entrevista onde coloca sobre "papel" aquilo para que foi contratado e o que tem como objectivo aplicar. Parece evidente, pelo discurso do treinador, que todos na estrutura do clube têm assumido que é um projecto a médio prazo independentemente do que passe até Junho, pelo menos. Parece-me uma boa solução e ninguém poderá dizer que a SAD não é fiel a si mesma, com o relevante resultado final. Este treinador sabe que tem o respaldo da direcção - coisa que faltou a Vitor Pereira, por exemplo, de forma clara - e que a aposta do Clube em renovar o clube de cima abaixo obedece a esse desejo de mudar.

Realmente, para quem conhece o trabalho a fundo de Villas Boas e Vitor Pereira, o rumo aplicado por Lopetegui é um regresso ao que já se fazia. O que muda essencialmente são os interpretes. Cada vez mais novos, cada vez mais preparados para os desafíos do futuro imediato. A idade não é coincidência. Por um lado, Lopetegui é um treinador de formação. Sempre o foi em todas as suas experiências prévias. Por outro está a velha filosofía de que a aprendizagem é um largo processo e quanto antes se começar, melhor. Não é o mesmo tirar “vícios” a veteranos que ensinar, quase desde os primeiros passos profissionais, a jovens promessas.

Dessa entrevista, muito boa aliás, retiro algumas frases chave que vale a pena reler para entender o que quer e o que planeia Lopetegui para o FC Porto nos próximos dois anos:

 “Da-se por garantido que os jogadores entendem o jogo e não é verdade”
A esmagadora maioria dos adeptos parte do principio que todo o jogador tem, no seu interior, um Xavi Hernandez mas que só alguns poucos o desenvolvem. Lopetegui pertence ao grupo (onde me incluo aliás) que pensa precisamente o oposto. A maioria dos jogadores são, em termos tácticos, e para usar o bom calão da minha “Invicta” “cepos”. E são-no porque a esmagadora maioria dos clubes, na área da formação, não fomenta a aprendizagem do jogo como tal mas sim o desenvolvimento físico e, eventualmente, o trabalho posicional concreto. Quando um futebolista com 19 anos chega à primeira equipa há muitos conceitos básicos que nem sequer explorou ainda e por isso o salto para a elite custa tanto a muitos que tanto prometiam nas camadas jovens. Por isso mesmo o trabalho do treinador é cada vez mais importante. Menos espaços, ritmo mais intenso, maior necessidade de compreender o máximo número de conceitos possíveis. Hoje em dia os futebolistas continuam a ser as estrelas mas cada vez mais os jogos se decidem no trabalho diário dos treinadores.

“Quando recebi a oferta do FC Porto percebi que queriam criar uma maneira de entender o jogo. Esta é a equipa mais jovem da história do Porto  e esse converte-a num projecto muito atractivo.”


Lopetegui parte do principio com esta afirmação que nunca se jogou como se joga agora no clube o que não é certo. Não é por acaso que ao Porto de Villas-Boas se comparava em toda a Europa com o Barcelona de Guardiola. O que sim está claro é que o ano de Paulo Fonseca deixou claro que não deve haver novas derivas futuras e que o modelo deve ser aprofundado até ás categorias base. A juventude do projecto também não deve enganar. Os problemas financeiros do clube forçam-nos a recorrer cada vez mais a jogadores jovens (comprados, emprestados, graças a fundos) com salarios mais baixos e potencial de rentabilidade futura maior.

“Eu quero que os meus jogadores sejam capazes de entender o jogo e acho que quando jogas entendes muito pouco e isso passava-me também a mim. E a verdade é que a riqueza da tua equipa depende das soluções que te dão os teus jogadores”.


Cada vez é mais importante ter jogadores de talento no plantel. O espaço para haver futebolistas que apenas sabem cumprir uma função (vide Fernando, por exemplo) vai diminuindo quando queres implementar um modelo de jogo que exige uma constante adaptação do jogador. E isso leva-nos a Ruben Neves. É um 6? É um 8? Não é bem nenhuma das coisas mas desempenha-se igualmente bem em ambos lugares porque entende o jogo e sabe adaptar-se ás soluções que tem para oferecer. Por isso Oliver pode jogar na ala em momentos pontuais ou Brahimi. Jogadores uniposicionais funcionam cada vez menos em equipas dinâmicas que querem ter a bola. A maior diferença? Cristiano Ronaldo é o melhor rematador do mundo, joga bem em diagonal mas precisa de espaço para mexer-se e aproveitar os seus recursos. No meio do meio-campo ou só na área perde muito. A Messi podemos vê-lo em qualquer zona do terreno de jogo porque está preparado desde a mais tenra idade a saber dar soluções para todos os problemas.


“Temos de ser muito agressivos quando perdemos a bola no campo contrario. Esse roubo é uma arma, mas de ataque, não de defesa, porque o adversário está a preparar o seu ataque e se a recuperas encontras espaços livres”.


Uma das grandes armas do Porto de Villas-Boas (e do Barcelona de Guardiola) era a pressão alta e o rápido roubo de bola, um conceito recuperado do Milan de Sacchi e do Dinamo de Kiev de Lobanovsky. Essa pressão alta obriga aos jogadores a um constante trabalho físico o que muitas vezes choca com a juventude dos jogadores do plantel (o Ruben jogava 80 minutos por jogo há poucos meses) e esse savoir faire de saber como dosificar-se (o melhor exemplo do futebol actual é, sem dúvida, Tiago). Nesse puzzle um jogador como Herrera seria válido – devido à sua boa capacidade de recuperação – se depois a sua tomada de decisão não fosse habitualmente desastrosa. Essa dose de agressividade pedida por Lopetegui tem faltado este ano em muitos jogos e deve-se, sobretudo, à natureza dos jogadores disponíveis.

“A chave de tudo é que a posse de bola não seja uma arma contra nós. É preciso saber dar-lhe uso.”


Os grandes profetas da possessão têm lidado com este problema há bastante tempo. Ter a bola nos pés para atacar e também para defender (e nesse capitulo a Espanha demonstrou que tanto pode ser uma máquina de ataque ao bom estilo holandés como uma Itália com a bola a defender e evitar o desgaste físico e psicológico do jogo posicional sem esférico) e isso foi uma das grandes queixas ao FC Porto de Vitor Pereira e agora também a este. Tinhamos a bola mas raramente sabíamos transformar a posse em perigo real.
O caso mais exemplar dos últimos anos talvez tenha sido o jogo contra o Malaga, no Dragão, onde o domínio foi asfixiante mas as oportunidades (e o resultado) tão escasso que acabamos eliminados no jogo da segunda mão. Naturalmente que ter a bola só serve se esta for aplicada em criar desequilíbrios basculando o rival até encontrar gretas. Para isso é preciso dois elementos fundamentais: um conjunto de jogador que saiba fazê-lo de forma homogénea (e aí é onde entram as habituais criticas a Quaresma, Tello ou Herrera que perdem o sentido grupal no processo) mas também uma rotina que é difícil de aplicar num projecto renovado quase de raiz e que se prolongará ad aeternum num clube que vive de vender os seus melhores activos.

“Ás vezes podes correr menos e outras vezes mais porque o rival também pode querer ter a iniciativa do jogo e o futebolista tem de estar preparado para isso, para essa dupla dinâmica.”

O FC Porto disputa 90% dos jogos de uma temporada procurando ter a iniciativa. Aliás, como ficou demonstrado na derrota com o Benfica, mesmo na esmagadora maioria dos jogos contra os rivais pelo titulo, a iniciativa cabe-nos a nós. Salvo algum jogo pontual de Champions League, a bola é nossa. O grande problema é precisamente esse, que os jogadores se habituem tanto a ter a bola que contra um rival distinto se vejam completamente descaracterizados e perdidos em campo. É um tema importante mas não fundamental, ainda que esse 10% de jogos se possam transformar rapidamente nos jogos mais importantes do ano. No entanto acredito que face á nossa realidade é cada vez mais importante saber pensar o jogo tendo a bola mas abrindo espaços nos habituais autocarros que encontramos. Afinal, esse é o nosso cavalo de batalha.

“Os treinos devem ser explicados aos jogadores antes de que se ponham a fazer os exercícios. É preciso que entendam o porquê porque assim sabem melhor o que têm de fazer.”


Como disse ao principio o trabalho do treinador – e por isso a escolha do treinador – é cada vez mais relevante. No FC Porto sempre se pensou o oposto, que o importante era ter um homem de estrutura (vide Fernando Santos, Jesualdo Ferreira) e bons jogadores. Ciclos curtos sempre e pouco poder ao treinador. Uma ideia extremamente desfasada da realidade. Houve uma altura do jogo, sim, onde os treinadores eram apenas responsáveis da condição física. Depois passaram a ser, sobretudo, organizadores e motivadores. Hoje são o motor de tudo. Os jogadores movem-se em espaços pre-determinados e a pesar do seu talento, uma equipa só funciona se o seu treinador está a fazer bem o seu trabalho. De aí que os treinos sejam cada vez mais relevantes. Não só nos lances estudados de laboratório mas, sobretudo, na repetição de circunstancias de jogo. É bom saber – não era difícil de imaginar – que o treinador do FC Porto é consciente dessa situação mas também parece claro que apesar das suas boas intenções há ainda muitos jogadores que não assumiram o seu papel como se espera deles.

“O futebolista aprende por repetição e descobrimento espontâneo e por isso temos de automatizar movimentos mas sempre com cuidado, não queremos matar a criatividade do jogador. Este tem de saber que nesse momento chave, quando acaba o espaço para o automatismo e aparece o espaço para a improvisação, o que fazer”.

Quaresma, Tello, jogadores de talento técnico superior mas com problemas no jogo automatizado colectivo. Brahimi, Oliver, jogadores de talento técnico superior e com total integração nos automatismos do grupo. Essa é a grande diferença entre uns e outros. São os quatro virtuosos com a bola mas apenas dois deles realmente sabem que naquele momento onde o treino acaba e a realidade começa, que decisões tomar para beneficio do colectivo. Seguramente haverá trivelas fantásticas de Quaresma e sprints com golo ou assistência de Tello e é importante ter esses jogadores no plantel para desbloquear uma equipa. Mas a realidade é cada vez mais outra e um treinador que tem um futebolista como Pedro Rodriguez, por exemplo, tem uma mina de ouro. Só os grandes clubes podem presumir de ter figuras mundiais tão grandes que saibam manobrar com igual facilidade os dois componentes. Para clubes como o FC Porto, com as suas limitações de mercado, é inevitável ter um Tello em vez de um Pedro Rodriguez (para que entendam o abismo que há entre dois jogadores da mesma escola de formação) porque o segundo é muito mais raro e portanto caro e o primeiro, embora espectacular, aos treinadores mais exigentes não convence. O que terá de saber fazer Lopetegui – e quem esteja no seu lugar – é reducir ao máximo as debilidades individuais dos Tellos, transforma-los de melhor forma possível em Pedros. Jogadores que sabem que a sua criatividade não desaparece com o treino mas que, dominando ambas facetas, nos momentos da tomada de decisão, raramente se enganam. E ele sabe bem isso!

Quem quiser a entrevista na integra pode fazê-lo aqui.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

O futuro essencial da nossa formação nacional

O FC Porto nunca foi uma grande potência nacional em formação de jogadores. Sempre tivemos algumas posições onde fizemos escola (guarda-redes, centrais, sobretudo) mas nunca vivemos à sombra da fama que outros clubes tiveram com os seus "fabulosos" projectos de formação que em muitos casos foram fogos de vista. No entanto, a marca de jogadores à Porto, sobretudo recrutados e formados na região do Grande Porto sempre fez parte do nosso ADN, particularmente após a chegada de Pinto da Costa à presidência do clube. O FC Porto quer ter os melhores, seguramente, mas também quer - ou melhor, queria - ter os melhores no espaço físico que mais depressa se identificava com o clube. 

Foi com essa politica desportiva que se trabalhou muito e bem durante os anos oitenta. O FC Porto tinha uma excelente equipa de olheiros espalhados pelo país mas concentrados essencialmente na região Norte. Os jogadores estrangeiros que aterravam nas Antas eram, quase sempre, recomendações de empresários e não fruto do trabalho de prospecção. Foi graças a isso que as camadas jovens dos Dragões se encheram de jovens promessas que marcaram a geração do Penta, a dos Vitor Baía, Fernando Couto, Jorge Costa, Jorge Couto, Rui Filipe, Domingos Paciência, António Folha, Rui Jorge, Paulinho Santos que sucederam aos André, Jaime Magalhães, Fernando Gomes, Rui Barros ou Lima Pereira de outras eras. 
Esse modelo de gestão, complementado por alguns dos melhores jogadores estrangeiros da liga (os Drulovic, Zahovic e companhia) e alguns estrangeiros de grande qualidade como apostas certeiras da direcção (de Kostadinov a Jardel) funcionou até ao virar do século em que o abandono da formação se tornou evidente. Desde o ano 2002 que o FC Porto deixou de produzir jogadores de elite para passar a ser exclusivamente uma marca de importação. Primeiro de consumo nacional no biénio de José Mourinho (Maniche, Paulo Ferreira, Nuno Valente, Bosingwa, Raul Meireles, César Peixoto, Ricardo Fernandes, Pedro Mendes) para depois passar a ser exclusivamente um projecto de consumo externo. Desde 2002, quando Hélder Postiga se estreou na primeira equipa, os jogadores da formação quase que se tornaram personas non gratas para o Clube. 
Seguiu-se, brevemente, Hugo Almeida e Bruno Alves, hoje já instalados na casa dos 30, e depois as sucessivas gerações desaproveitadas dos Bruno Vale, Zé António, Ivanildo, Vierinha, Paulo Machado, Hélder Barbosa, Candeias, Ventura e companhia.

Qualidade pobre dos jogadores, poucos minutos na equipa A, predilecção por estrangeiros de qualidade duvidosa, falta de trabalho competente na base?
Tudo está certo e ainda sim tudo é manifestamente insuficiente para explicar a razia de jogadores da casa na primeira equipa. A criação do Projecto Visão 611 deveria servir para mudar a situação mas acabou por piorar ainda mais o esquema. Enquanto o Sporting se consolidava internacionalmente como a "cantera" por excelência do futebol português e o Benfica ia, pouco a pouco, "recrutando" alguns dos melhores olheiros e técnicos do Sporting para desenvolver o seu projecto, no Olival tudo continuou na mesma. Paralelamente o clube tem investido bastante em recrutar jovens promessas sub-18 espalhadas pelo Mundo. 
Sul-americanos (Kelvin, Victor Garcia, Caballero, Roniel, Elvis, Lichnovsky), europeus (Pavlovski, Djim, Johanssen) e africanos (Ba, Atsu, Mikel, Kaymbe) foram sendo integrados aos escalões de formação e à equipa B. Ainda nenhum com resultados excepcionais mas que dão conta de uma clara tendência de gestão. Parece-me, desde já, uma aposta extremamente inteligente da SAD. 
Não há dinheiro para continuar a gastar recorrentemente mais de 10 milhões de euros em Reyes, Herreras, Alex Sandro, Danilos ou Mangalas eternamente e fintar um mercado cada vez mais caótico e lotado de candidatos que oferecem melhores condições do que nós (o caso Bernard é exemplar) e descobrir essas promessas uns anos antes pode supor um desembolso infinitamente menor e um lucro desportivo e financeiro maior a médio prazo. É uma aposta sensata, inteligente e que seguramente dará frutos no médio prazo. Mas é insuficiente. 

O FC Porto não deve nem pode continuar a negligenciar o que devia ser o seu mercado primordial, o nacional. Num país capaz de produzir de forma surpreendente jogadores de elevada qualidade para a sua percentagem de população e atletas federados, Portugal é cada vez mais um mercado apetecível lá fora. Há olheiros de clubes franceses, italianos, ingleses e espanhóis a pescar futuros internacionais portugueses entre os 15-18 anos. Jogadores que podiam perfeitamente estar na nossa formação e que, inexplicavelmente, não estão. 
Bruno Fernandes, Marcos Lopes, Edgar Ie, Ruben Vezo são apenas exemplos de uma tendência crescente no mercado europeu. Paralelamente, enquanto é aceitável que seja difícil (e caro) recrutar atletas ao SL Benfica e Sporting, continua a não ser lógico que emblemas como o Vitória de Guimarães (Paulo Oliveira, Josué, Ricardo), Sporting de Braga (Rafa), Nacional da Madeira (Miguel Rodrigues) ou Maritimo (José Sá, Danilo) sejam capazes de produzir com regularidade jovens promessas e que esses jogadores escapem aos olheiros do FC Porto.


Tendo em conta os futebolistas portugueses que podem singrar na próxima década entre aqueles que contam com mais de 15 anos actualmente, o FC Porto conta com muito poucos. Rafa, Tozé, Tomás Podtawski e Gonçalo Paciência são as nossas melhores perspectivas de sucesso. Quase nenhum teve ainda minutos na primeira equipa nem convocatórias acumuladas. O Sporting pode apresentar, na mesma geração, jogadores que vão desde Ricardo Esgaio, Bruma (já transferido), João Mário, André Martins, Tobias Figueiredo a Alexandre Guedes, e o Benfica a Bernardo Silva, André Gomes, João Cancelo, Ivan Cavaleiro, Bruno Varela ou Nelson Oliveira.
Muitos desses jogadores entraram nos escalões de formação dos respectivos clubes entre os 14 e 16 anos, tendo antes feito a formação em clubes onde os olheiros do FC Porto se podiam ter antecipado. André Gomes e Alexandre Guedes são casos ainda mais paradigmáticos. O primeiro passou pela formação azul-e-branca e foi dispensado. O segundo foi recrutado aos 15 anos pelo Sporting do Arcozelo de Vila Nova de Gaia, o mesmo concelho onde a equipa treina. Ter olheiros no Grande Porto - ou na Grande Lisboa - não deveria supor nenhum gasto particular para os cofres do clube e em contrapartida poderia reproduzir significativos lucros futuros. Ter um onze titular futuro com jogadores formados em casa tem vários aspectos positivos. Máximo lucro em vendas, maior prestigio internacional na formação, cimentar uma cultura de balneário local que ajuda a integração das contratações estrangeiras que foi perdido com as saídas de Bruno Alves e Raul Meireles e jogadores formados localmente em número suficiente para garantir a inscrição constante de 25 jogadores nas provas da UEFA.

Não se trata de maior ou menor bairrismo, de querer uma "sportinguização" do FC Porto ou de deixar de apostar naquele que tem sido o core business da SAD de forma compulsiva. Trata-se de reinventar uma fórmula ganhadora, algo que a SAD já está a fazer com a sua aposta em sub18 estrangeiros. O que não me parece lógico é que o maior clube português, que graças ao sucesso obtido nos últimos trinta anos tem agora adeptos espalhados por todo o território nacional e milhares de miudos desejosos de vestir a camisola azul-e-branca, continue a negligenciar de forma tão evidente a prospecção e o treino da sua própria formação nacional. O futuro do futebol português não é tão negro como os catastrofistas pintam e não é motivo para o clube abandonar totalmente a prospecção local por outros (e interessantes) mercados. Ter um onze nos próximos sete anos competitivo com meia dúzia de jogadores portugueses é perfeitamente possível. Como também o é com jogadores formados em casa se esses forem recrutados antes que os nossos rivais e directamente em clubes com um bom trabalho na área. Ter um novo Ricardo Carvalho, Rui Barros, Domingos Paciência ou Vitor Baía não é só altamente desejável. É também possível. Basta fazer as coisas bem!

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Que queremos para o nosso Porto?

É nos momentos mais dificeis que os grandes clubes se fazem sentir. Quando a crise bate à porta, seja ela grande ou pequena, de resultados ou de jogo, de ideias ou de apoio externo, os grandes clubes sabem sempre encontrar a fórmula de reinventar-se. E nós, Futebol Clube do Porto, somos um grande clube.

Temos a imensa sorte de viver o ciclo de ouro da história do nosso clube. Não se enganem.
Quando este ciclo acabar - e pode acabar daqui a dois anos ou daqui a dez - será irrepetível tudo aquilo que vivemos. É parte da história. Não significa que deixaremos de ganhar, de celebrar. Mas seguramente não tantas vezes. E quando o façamos será mais difícil. Mais sofrido. Como no passado. Passou a todos. O Barcelona viveu nos anos 60 e 70 um hiato abismal. Teve um pequeno ciclo deprimente a final dos anos oitenta e na viragem do século. Voltou sempre mais forte. O Liverpool reinou durante 30 anos sobre o futebol inglês. Agora está há mais de vinte à espera da sua oportunidade. O Sporting já foi a maior potência portuguesa. Há mais de meio século. E o Benfica, até ao 25 de Abril, jogava num mundo à parte. Agora têm dois títulos de campeão nacional por década nos últimos vinte anos. Algum dia fomos nós, algum dia podermos voltar a sê-lo. Vale por isso bem celebrar o momento. Celebrar as pessoas que o conseguiram. Celebrar os adeptos que fizeram o clube crescer. Mas celebrar, desfrutar e sentir-se grande não chega. Os ciclos só se perduram no tempo porque quem está no topo continua a evoluir para não ser apanhado. Se não tivesse chegado Mourinho, talvez o ciclo tivesse acabado com o Penta. Mas não. Fomos mais longe. E quando ele e meia equipa se foram e um título se perdeu sem se saber como, a nossa resposta foi, bem, ganhar mais quatro seguidos. E agora vamos a caminho do mesmo. Vamos?

Este artigo não é um ataque a ninguém.
Nem aos dirigentes, nem ao staff técnico, nem aos jogadores nem aos adeptos. É o oposto. Uma consciencialização do que estamos a viver e do que nos espera. Do que queremos fazer para manter este ciclo vivo. Porque se os adeptos não têm o poder neste clube (e cada vez menos, em geral, no mundo do futebol) é nosso dever apontar o caminho, dizer bem alto o que queremos e esperar que nos levem a sério. Quando Pedroto e Pinto da Costa ajudaram os andrades a libertarem-se das correias psicológicas para transformarem-se em dragões, criaram um pequeno "monstro", exigente e eternamente insatisfeito. É bom sinal. Os adeptos do Real Madrid, do Barcelona, do Manchester United e do Bayern Munchen também o são. É o sinal de que vencer é o nosso destino e o como - e sobretudo, o como - importa. As equipas que ganham pouco contentam-se em ganhar. As que repetem e repetem querem diferenciar as suas vitórias em algo. Durante os anos 80 foi um grito de guerra contra o Sul. Na década de 90 foi o triunfo de um modelo de negócio. Na última década foi o sucesso europeu que nos diferenciou em toda a Europa. E agora, entrada nesta década, que nos espera?



O FC Porto tem um grande presidente, um dos maiores da história deste desporto.
Tem também uma massa adepta fiel, instalações top, conexões privilegiadas com mercados importantes, uma rede de scouting espantosa e desfruta de uma hegemonia interna nunca vista em Portugal. Foi preciso lutar muito para chegar até aqui, construir tudo isso. Dormir à sombra da bananeira não nos levará a nenhum lado. Procurar crescer sim. Como o podemos fazer?

A SAD, na preparação para as últimas temporadas, tem colocado o ênfase em três objectivos:
- reduzir o passivo através da venda cíclica de jogadores
 vencer o título nacional e, se possível, uma prova interna a eliminar
- alcançar os oitavos de final da Champions League

Esta tem sido a nossa rota, estabelecida desde os escritórios do Dragão. É para ela que se trabalha, é pensando em nela que se preparam os planteis e se define o staff técnico. Há condicionantes que a motivam, a começar pelo significativo passivo que temos e que aumenta a passo de caracol. Há também a vontade imensa da maioria dos jogadores de utilizar o clube como um poiso temporal. E também o aparecimento de fortunas por toda a Europa que preenchem os papeis de favoritos para ir mais além na Europa. Muito bem, são argumentos com a sua lógica e com muitos (e legítimos) defensores entre os adeptos.

No entanto, a situação que estamos a viver actualmente, e que tanto critica tem levantado, parte precisamente dessa política desportiva.
Temos um staff técnico inexperiente porque essa tem sido a nossa linha recente (desde 1995 o FC Porto teve oito treinadores - em onze - quase sem experiência: António Oliveira, Fernando Santos, Octávio Machado, José Mourinho, José Couceiro, André Villas-Boas, Vitor Pereira e Paulo Fonseca). Não há qualquer novidade nessa escolha e se Paulo Fonseca for campeão nacional - que pode perfeitamente sê-lo - encaixará no padrão. O que não elimina que seja um treinador muito fraco, muito fraco!

Contamos com um plantel com muitas falhas, especialmente nas faixas, tanto nas laterais (não há suplentes pós-exclusão Fucile, que era a única opção) como nos extremos. Não há uma alternativa a um número 6 que acaba contrato e já disse por activa e por passiva que não vai renovar. E no entanto há 18 milhões gastos em dois rookies mexicanos, um dos quais sem minutos de jogo e outro que já demonstrou precisar de amadurecer o seu jogo. Um overbooking posicional na medular onde se acumulam projectos de jogador (que entram nessa política de comprar e vender rapidamente, desde Reyes e Mangala a Herrera a Quintero) que denunciam que muitas das compras do FC Porto são feitas primeiro como uma oportunidade de negócio futuro e só depois como uma necessidade real do plantel (quem não trocaria o Reyes por um extremo?). Mais uma vez, uma continuação da política recente (e que tantos frutos tem dado nas vendas, cada vez menos nas compras já que os preços têm encarecido muito), sem novidades. E claro, se o Ghilas custava 8 milhões a 100% de passe jogando no despromovido Moreirense (nós só pagamos metade, menos mal...irony mode on) então resta saber se alguém aqui ainda procura realmente jogadores do perfil de Cissokho (e os benditos 600 mil euros que custou). Talvez não! Ou se calhar não são rentáveis!

E por fim, a questão dos títulos. O FC Porto continua a ser, para mim, o máximo favorito para ser campeão, nem que seja por defeito. Não vejo o Sporting ainda com plantel para ambicionar com algo tão grande e o Benfica encontra-se numa situação similar internamente. E na Europa o resultado negativo até ao momento não é tão diferente do que temos vivido. Vitor Pereira falhou o apuramento no seu primeiro ano, Villas-Boas nem sequer teve a oportunidade de disputar a prova pela péssima última época de Jesualdo e desde 2009 que os oitavos não se ultrapassam.



Dito isto, parece-me claro que o cenário actual não é tão diferente do que temos vivido nos últimos seis, sete anos.
2011 foi uma overdose. A Liga Europa foi uma prova menos difícil de conquistar do que a nostalgia nos faz lembrar, as vitórias (goleada e reviravolta incluída) com o Benfica deram uma aura especial ao sucesso e a qualidade de jogo em grande parte do ano foi de alto nível. E já está. Tanto o antes como o depois tem-se pautado por bases similares, a base em que se move o FC Porto. Joga-se muito mal este ano? Joga-se. O staff técnico parece ser indigno da cadeira de sonho? Sem dúvida. O plantel tem lacunas? Claro que tem. A desorganização dentro e fora de campo tem sido maior? Claro que sim. E que temos a dizer em relação a isso. É essa a base de clube que queremos, como adeptos, ou está na altura de mudar algo e esta situação não é mais do que um alarme de despertar para todos?

Paulo Fonseca parece-me um fraco líder, um fraco técnico e uma opção errada da SAD.
O mesmo me pareceu Fernando Santos, Jesualdo Ferreira e Vitor Pereira. Mas venceram. Porque a máquina azul-e-branca sabe vencer apesar de e não por culpa de. O plantel tem falhas mas é melhor que muitos dos que Jesualdo teve nas mãos e tem mais opções (outra coisa é que não as usem ou que tenham sido demasiado caras para o que são) que o do ano passado. Continuam-se a perfilar vendas interessantes no Verão e seguramente haverá já miúdos apalavrados para o seu lugar. E o ciclo continua. E continuará se não quisermos algo diferente. Algo que não se enfoque tanto na gestão empresarial do plantel (não do clube). Algo que não mudará até que um treinador com mais poder (não todo o poder, cuidado) possa desenhar um projecto desportivo mais sólido. Algo que recupere o espírito de jogadores da casa, uma linha medular estável que faça de ponte entre os jovens que entram e as estrelas que saem. Não é necessário que sejam portugueses, da formação mas que estejam lá quando Helton e Lucho nos faltem. E, sobretudo, temos de pensar em novos desafios. Vencer já não chega e isso tem de ser encarado entre todos como um bom sinal. Ninguém pode apontar nada a uma liderança que tenta e falha.

Manter o título português é uma obrigação tal como está o futebol português mas se um remate de um puto brasileiro no minuto 92 não entrar não é preciso pedir cabeças imediatamente. Sonhar em ser algo mais na Europa sim, devia ser parte do nosso plano. Não uma obrigação mas uma ambição. Para isso é preciso trabalhar bem e a médio prazo, algo que há muito tempo que não se faz. Encontrar um rumo dentro do balneário entre técnico e jogadores de um perfil que carecemos. Fazer das fraquezas, forças. Se não temos o orçamento do Zenit, Shaktar, PSG ou Monaco, usemos a nossa experiência, a nossa fortaleza doméstica e montemos um onze sólido, não apenas composto por jogadores com a cabeça noutro lado. Se não procuramos esses desafios, vamos entrar num ciclo fechado e perigoso. Nunca estaremos contentes com nada do que se ganhe em Portugal porque saberá a pouco. Estaremos nas mãos de treinadores inexperientes e que duram dois anos até dar o turno ao próximo e continuaremos a ter de esquecer rapidamente o nome dos jogadores que queremos memorizar tão rápido se vão. Acho que o nosso modelo de negócio agora chegou a uma encruzilhada.

Nem tudo mal e o trabalho feito não pode ser deitado pela borda fora. Mas desta vez, talvez, como passou em 2006, 2002, em 1995, em 1985 ou em 1977, ao chegar a este cruzamento, mais vale seguir pela direcção que ninguém espera. Só assim fintaremos uma rotina que pode acabar por ser auto-destrutiva a curto prazo e subiremos outro degrau para fazer com que este ciclo seja mais longo do que qualquer um de nós poderia alguma vez sonhar!

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Que fazemos aos nossos míudos?

Bruno Vale, Rui Sacramento, Ventura, Tiago Maia, Kadu, Ricardo Dias, Bruno Alves, André Pinto, João Pedro, Rui Pedro, Nuno Coelho, Tengarrinha, Ivo Pinto, Tiago Ferreira, Paulo Machado, Josué, Nuno André Coelho, Castro, Helder Barbosa, Sérgio Oliveira, Ivanildo, Bruno Gama, Vieirinha, Diogo Viana, Ukra, Atsu, Rabiola, Abdollaye, Yero, Vion, Hugo Almeida...

Em 8 anos o FC Porto fez estrear, em jogos mais ou menos relevantes, 31 filhos do sistema de formação. Uma média de quase quatro “canteranos” por temporada, que não seria má de todo. Mas olhem para a lista outra vez. Com atenção. De todos esses jogadores, só 4 foram internacionais neste período e apenas dois deles, Bruno Alves e Bruno Vale, ao serviço do FC Porto. De todos os 31 só dois (Yero e Vion) estão no plantel desta época e ambos para fazer número, pondo as coisas no seu sitio. A maior parte destes jogadores foi forçada a embarcar numa espiral de empréstimos que esgotaria a paciência a um santo. E hipóteses na primeira equipa, nem vê-las. Muitas promessas, muito dinheiro invertido na requalificação da antiga Constituição e como resultado, um clube nu e destirpado da sua essência, os jogadores da casa. E um clube sem jogadores formados in loco é um clube sem chama interna, sem identidade e, sobretudo, com um excessivo gasto em contratações, comissões e salários que seriam paliados seguramente por uma aposta no producto made in Porto.



Antes que alguns dos leitores habituais venham com a reflexão sobre o pragmatismo da aposta do clube em jogadores nacionais, falando mais na vontade de ganhar já com compras com potencial de venda na América do Sul do que em estar a perder tempo e dinheiro em formar ou até mesmo com o argumento da “xenofobia” com jogadores estrangeiros, que fique claro que a mim importa-me pouco que os miúdos venham do Burkina Faso, da Nova Caledónia ou da Sé. Pessoalmente preferiria que fossem portistas, e hoje em dia para ser-se do Porto já não faz falta ser da Ribeira. A demografia da Invicta também já não permite esses sonhos e muitos dos heróis dos últimos 30 anos vieram do Grande Porto (Leça, Maia, Gaia, Amarante, Vila do Conde, Espinho, Matosinhos) mais do que das próprias ruas da cidade.

A questão é mais importante do que muitos adeptos imaginavam e está na altura de que a direcção do clube e a administração da SAD tomem medidas práticas e não persistam em politicas para tapar os olhos. Não sou seguramente o membro deste painel mais apto para falar de economia mas não é preciso ser um “expert” para analisar a diferença entre comprar um jogador a outro clube (com comissões), formá-lo, vender percentagens a fundos, pagar os seus salários (incluindo comissões por renovar contratos) e depois vender e formar um jogador do zero, pagar um salário evidentemente inferior e vendê-lo com lucro a 100%. Há muito tempo que o FCP abdicou de lucrar a 100% com um negócio por interesses externos ao clube que têm causado sérios problemas nas nossas contas. Por cada Anderson, Pepe, Hulk, Lucho, Lisandro ou Falcao sucedem-se dezenas de erros de casting. Souza, Walter foram os últimos enganos sérios da SAD mas nos últimos anos representam apenas uma gota no oceano.

Durante este período de tempo o FC Porto venceu 2 campeonatos de Juniores, 2 campeonatos de juvenis e 3 campeonatos de iniciados. Isso diz mal do futebol de formação português em geral mas também não explica porque é que uma equipa capaz de coleccionar tantos títulos é incapaz de exportar para a primeira equipa jogadores de nível.

Sou a favor da aplicação da lei 6+5 da UEFA e para adaptar-se a estes tempos e na circunstância actual os Dragões teriam muitos problemas em cumprir a normativa. Como adepto romântico do jogo gosto de sentir alguma identificação com as equipas. Como adepto racional do meu clube gosto de transparência e contas saneadas. Uma aposta clara na formação permite-me desfrutar de ambas. Ninguém me convence que um plantel com Souza, Bracalli, Cebolla Rodriguez, Djalma ou Walter é melhor que um que tenha Castro, Atsu, Ventura, Helder Barbosa, Bruno Gama, Vieirinha ou Palmo Machado, jogadores da casa que pertencem ou já pertencerem aos quadros do clube. Jogadores mais baratos, que sentiriam a “Mistica” do clube provavelmente mais do que as aquisições citadas e, sobretudo, em número suficiente para cumprir qualquer normativa europeia. O clube poupava dinheiro, reforçava o papel do produto da casa e, sobretudo, devolvia a imagem de um clube involucrado com o futebol local.


O FC Porto sempre foi berço de grandes jogadores que chegaram de outras paradas e sempre o será. Mas todos tinham detrás um núcleo duro da casa que desapareceu totalmente como espelho da politica auto-destructiva desta SAD. Começa a ser necessário, especialmente depois dos evidentes problemas de liquidez que o Standard Liège e o Santos fizeram públicos, pensar com mais cabeça no futuro desportivo e económico do clube e menos nos negócios paralelos que têm deixado muita gente na SAD feliz e nos círculos que a rodeiam mas que diminuem consideravelmente o potencial de crescimento e consolidação do clube para a próxima década. Não pode ser um cenário a repetir que o FC Porto arranque para uma nova época sem um único jogador formado em casa ao mesmo tempo que gasta milhões em contratar jogadores que depois nem se revelam opções tácticas regulares.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Os sócios e a SAD

O FC Porto sempre viveu sob a influência, maior ou menor, dos sócios. Essa influência é renovada de três em três anos (podendo ser estendida por mais um ano se não existirem listas concorrentes) de modo democrático através de eleições para os órgãos administrativos do clube.
A SAD veio introduzir um novo actor neste sistema: o accionista. O accionista investe o seu dinheiro na SAD (do futebol ou de outra modalidade) e mediante os estatutos da mesma pode ou não ter poder suficiente para decidir quem são os administradores da SAD.

Com a cada vez mais eminente saída de Pinto da Costa do FC Porto (os anos passam, e infelizmente o Presidente não fica mais novo), e como consequência do Conselho de administração da SAD, começo a preocupar-me seriamente com o rumo que o futebol do FC Porto possa vir a tomar. A minha preocupação não tem a ver com a maior ou menor capacidade das pessoas que possam ser nomeadas para esses cargos, mas com o facto de poder deixar de representar tudo aquilo que esperamos de uma equipa do FC Porto.

De momento o FC Porto tem 40% do capital da SAD. Este capital é suficiente para garantir, até ao momento, o controlo da mesma. Mas os tempos e as situações também mudam... E se por ventura aparece um Americano ou Russo multimilionário com interesse em "investir" no FC Porto, Futebol SAD? E o que acontece se esse investidor se esquecer do FC Porto, Futebol SAD ou achar que não faz sentido existir o FC Porto, Futebol SAD? É nessa altura que nos devemos preocupar, ou devemos começar já?

Os sócios devem começar a pensar seriamente se querem correr estes riscos! É possível fazer alguma coisa para o evitar? Claro que é! Para começar os sócios devem participar activamente na vida do clube (e por força da representação dos 40%, na SAD), participando nas AGs e nas eleições. Podem pensar em qual será o perfil das pessoas que queremos à frente do Clube, que garantam que o mesmo vai ter sempre a maioria das acções da SAD, e que estas não vão ser alienadas.

Nesta perspectiva, vejo com bom olhos qualquer iniciativa que vise agregar as vontades dos sócios e adeptos (à semelhança do que aconteceu por exemplo em Inglaterra com o Man. Utd., que foi criada uma associação de adeptos/accionistas), que tivesse como único interesse o sucesso do FC Porto, Futebol SAD associado ao Clube. Por muito poucas que sejam as acções detidas por sócios/adeptos, conjugadas com as do Clube, podem fazer a diferença.

Da minha parte, vou fazendo o que posso para estar preparado para tomar as minhas decisões: frequento assiduamente as AGs do clube, adquiri acções do FC Porto, Futebol SAD, e vou falando com/ouvindo outros portistas.