domingo, 8 de setembro de 2013

O capital dos Bancos e os clubes da Capital


O director do Jornal de Negócios, Pedro Santos Guerreiro, é um conhecido comentador de assuntos económicos mas, como colunista (e benfiquista!), escreve também sobre futebol, numa coluna publicada às quintas-feiras no jornal Record.
No dia 7 de Março de 2013, numa das suas crónicas no jornal desportivo do grupo Cofina, escreveu o seguinte:

«É difícil perceber como há bancos que emprestaram tanto dinheiro a clubes que ficariam falidos. Mas assim foi, o que demonstra também incompetência desses bancos. Há muitos casos perdidos, sendo o maior deles o Sporting. Por isso se fala há muito de uma reestruturação da dívida, que é uma forma educada de dizer “perdão”. E por isso Luís Filipe Vieira saiu a terreiro dizendo que se o Sporting tiver perdão de dívida, o Benfica também quer.
Vieira é esperto que nem um alho e, para mais, tem razão: se um clube (ou uma empresa) quebra e é perdoado, então a sua má gestão é compensada, em detrimento de quem geriu sem ajudas.
Mas a reclamação de Vieira também trará água no bico: ao Benfica não caía mal uma folga da banca. O clube da Luz, além de ter o maior passivo bancário, tem também sido forçado a reduzi-lo, o que tem feito através de receitas de jogadores vendidos e através de emissão de obrigações (cujo encaixe na prática serve para pagar dívida aos bancos).»


Na passada segunda-feira, dia 2 de Setembro, o Jornal de Negócios publicou uma notícia acerca do Plano de reestruturação do Banco Comercial Português (BCP), em que é dito o seguinte:

«A Direcção Geral da Concorrência da Comissão Europeia aprovou de forma final o plano de reestruturação do Banco Comercial Português (...)
Deste modo, o BCP vai desinvestir em várias das actividades que mais imparidades provocaram nos últimos trimestres nas contas do banco, tais como empréstimos para compra de títulos, crédito fortemente alavancado, crédito à habitação bonificado histórico e crédito a certos segmentos associados a construção, clubes de futebol e promoção imobiliária.»


Três dias depois, no dia 5 de Setembro, novamente na sua crónica semanal no jornal Record, Pedro Santos Guerreiro escreveu o seguinte:

«Já aqui escrevi que, como Portugal tem de obedecer à troika, o Sporting tem de cumprir as ordens dos bancos credores. Ora até as ordens são mais ou menos as mesmas: reduzir despesa permanente e vender ativos para baixar a dívida. (...)
na Luz dinheiro parece não ser problema. Não porque o tenham a rodos, mas porque o mesmo banco que aperta o Sporting dá largas ao Benfica: o Banco Espírito Santo.
Esta semana, o BCP confirmou oficialmente uma notícia do “Jornal de Negócios” de há uns meses, de que vai deixar de financiar o futebol, depois das perdas acumuladas em vários clubes. Um deles foi o Sporting, onde BCP e BES foram sucessivamente forçados a reestruturar a dívida, perdendo dinheiro.
Mas o BES é gato que não se escalda. E estará a amparar tanto Luís Filipe Vieira que este afirmou, sem medo, na entrevista de há duas semanas à Benfica TV que, se fosse preciso, aumentaria a sua dívida. Foi preciso. Este ano o Benfica comprou mais do que vendeu


Para além de ser diretor do Jornal de Negócios, Pedro Santos Guerreiro é também colunista da Sábado, do Record, da Rádio Renascença e da RTP e comentador convidado na CNN e na Aljazeera.
Por outro lado, é alguém que já deu provas de estar bem informado acerca da situação da Banca portuguesa e, particularmente, da relação entre alguns Bancos e os clubes de futebol.

Tudo isto para dizer que os textos que reproduzi em cima são altamente preocupantes, porque são indiciadores de que pode estar em curso uma operação de perdão de dívidas selectiva, envolvendo dois dos maiores bancos portugueses e os clubes da 2ª circular. E, como é óbvio, isso é algo que tem consequências na capacidade desses dois clubes em investirem, no presente e no futuro, nas respectivas equipas de futebol. A confirmar-se, não tenho dúvidas que isto se traduzirá na maior viciação de sempre da competição futebolística em Portugal.

Esqueçam os árbitros que gostavam de “fruta” ou os que preferiam as meninas do Elefante Branco.

Ignorem as almoçaradas em Canal Caveira ou os jantares no Sapo.

Isto é de outra dimensão, envolve a alta finança que circula nos corredores do poder e muitos, muitos milhões de euros (basta ter em conta o valor crescente dos passivos financeiros das SAD’s do sporting e benfica).

Segundo Pedro Santos Guerreiro, BCP e BES foram sucessivamente forçados a reestruturar a dívida do Sporting, perdendo dinheiro.
Quantos milhões de euros já foram perdoados?
Ou, se preferirem, estamos a falar de quantas contratações milionárias?

Em Março passado, sem revelar qualquer pudor, Luís Filipe Vieira veio a público dizer que queria idêntico tratamento para o Benfica ("Se houver perdão, tem que haver perdão para o Benfica também").
E Domingos Soares Oliveira, administrador da slb SAD acrescentou: “É difícil entender que bancos intervencionados com os nossos impostos possam utilizar dinheiro dos contribuintes para perdoar dívida, seja a quem for.”

Sabe-se agora, através do benfiquista Pedro Santos Guerreiro, que o Banco Espírito Santo estará a “amparar o Benfica”.
O que significa este “amparar”?
Não se sabe ao certo mas, no imediato, permitiu que a slb SAD investisse cerca de 40 milhões de euros em 15 novas contratações para esta época, sem ter necessidade de fazer vendas significativas (encaixou menos de 15 milhões de euros em vendas e empréstimos), isto é, a slb SAD pôde investir fortemente em reforços, sem ter de se desfazer dos melhores jogadores que tinha (e tem) no seu plantel.

Mais. Graças a este “amparar” da banca, o benfica pode dar-se ao luxo de, após o fecho do mercado, ter ficado com um plantel de 31 elementos (Artur, Paulo Lopes, Oblak, Maxi Pereira, Sílvio, Luisão, Garay, Jardel, Steven Vitória, Mitrovic, Siqueira, Bruno Cortez, Matic, Enzo Pérez, Fejsa, Ruben Amorim, André Almeida, André Gomes, Gaitan, Djuricic, Sulejmani, Markovic, Salvio, Ola John, Lima, Rodrigo, Cardozo, Funes Mori, Carlos Martins, Djaló, Urreta), enquanto que o principal rival, o FC Porto, reduziu o seu para 24 elementos.

Numa altura em que há bancos a interferir na competição desportiva desta maneira, “amparando”, reestruturando pagamentos e até perdoando dívidas de milhões a uns clubes e não a outros, por onde andam os arautos da "verdade desportiva"?

Sim, eu sei que estes bancos são privados, mas recordo que a generalidade da banca portuguesa teve de recorrer a significativos apoios do Estado (12 mil milhões de euros do empréstimo da ‘Troika’ ao Estado português tinham como destino a recapitalização dos bancos) e, portanto, o próprio Estado deveria ter uma palavra a dizer.

Espero que os dirigentes do FC Porto estejam atentos e, se for caso disso, denunciem publicamente esta situação e intervenham junto das entidades competentes.

P.S. Em comunicado divulgado na CMVM, a Sporting Clube de Portugal - Futebol SAD informou o mercado que registou perdas 43,81 milhões de euros no ano fiscal compreendido entre 1 de Julho de 2012 e 30 de Junho de 2013, quando no período homólogo anterior os prejuízos tinham ascendido a 45,94 milhões de euros.
Eu sei que o Sporting tem sido governado por gente ligada aos bancos. E também sei que José Maria Ricciardi, presidente do BES Investimento, pertenceu durante muitos anos aos órgãos sociais do Sporting mas, mesmo assim, como é possível haver bancos que, ano após ano, continuam a suportar este tipo de perdas? Quem vai pagar estes sucessivos prejuízos brutais? Quando?

Nota: Os destaques no texto a negrito são da minha responsabilidade.

28 comentários:

Anónimo disse...

O bes foi intervencionado?

Joao Goncalves disse...

Caro José,

Eu partilho desta sua preocupação.

Tudo o que tenho ouvido da reestruturação da dívida, passa por puxar a dívida mais para a frente adiado o seu pagamento.

Ora o problema não é adiar o pagamento da dívida mas o perdão dos juros que daí adveem que é o que me parece ser o maior problema corrente dos clubes (e do pais).

Portanto isso a estar a acontecer aos clubes de Lisboa e FC Porto não se pode por em bicos de pés e deixar isto passar em claro, tem de fazer pelo contrário... fazer-se de virgem ofendida e exigir, no mínimo, o mesmo tratamento e depois quero ver onde a banca vai parar.

Isto é mesmo muito preocupante...

RBN disse...

No dia 2 de setembro, escrevi aqui isto, que não englobava o ex-porting, mas que segue mais ou menos a mesma linha deste post, onde o tema é "donde vem tanto dinheiro?".

"Sei que este blog não gosta muito de off-topic, mas surgiu uma coisa na cabeça que tive que vir aqui comentar:a benficatv pode mascarar uma coisa que à princípio não está à vista de todos e que poderá ser muito difícil de provar no futuro.

Sabendo-se que o orelhas é um mafioso por excelencia, deve estar há muito tempo em várias negociações com clubes ditos pequenos da 1ª e 2ª ligas para futuras transmissões de tv, como já é o caso do Farense da 2ª liga, que segundo dizem, vendeu os direitos televisivos à estação das galinhas.

Sabendo-se que os ditos pequenos esperam a visita dos grandes no seu estádio para "fazer caixa", e o orelhas sabe disto melhor que ninguém, provavelmente e hipoteticamente já pensou em adiantar (ou dobrar) o "caixa" aos ditos pequenos e ainda ganhar dinheiro com isso, o que significa matar 2 coelhos com uma cajadada só.E com "caixa" garantido pela enchente e transmissão televisiva, o dito pequeno hipoteticamente não será tão duro nem tão competitivo com quem lhe paga o "ordenado", certo?E esta teoria também deverá servir para a taça e para a taça lucilio batista, certo?

Pois bem, se o Farense sobe à 1ª liga, como é que fica?

Se a coisa for deste jeito, os ditos pequenos ficam nas mãos do orelhas, que terá "poder" sobre os seus "contratados" usando sempre o argumento de que "eu pago os vossos orçamentos da época inteira com as verbas das transmissões televisivas e ofereço mais que a sportv", ou seja, será um suborno totalmente legal!!!

Suponhamos que entre os 16(ou 18) clubes da 1ª liga, a slbtv compre os direitos televisivos de 5 clubes, já imaginaram a "verdade desportiva"?Hipoteticamente são 15 pontos garantidos no galinheiro, mais 15 pontos fora do galinheiro, porque a equipa adversária "contratada" não terá problemas de salários em atraso, sem problemas financeiros, estarão todos satisfeitos dirigentes aos jogadores, e tudo graças....à benficatv!!!

É tudo suposição, mas e se é mesmo isso que o orelhas pensa em fazer e vira realidade em 2014 ou 2015?Era um golpe de génio, uma falcatrua nunca vista em lado nenhum no futebol e tudo dentro da legalidade:dar aos pequenos o que eles mais precisam, que é dinheiro em caixa, mas como ninguém dá nada de borla a ninguém, o que viria em troca?Mais audiencias e mais assinantes de clubes com massas associativas que mal enchem o Dragão caixa?

Desculpem o off-topic, mas que há muito mais coisas do que apenas transmissões televisivas na lampiãotv, isso há...pra já é tudo suposições, mas..."

Filipe Sousa disse...

A fanfarronice do slb, não está restrita ao relvado - afecta tudo, inclíndo os negócios. Eles não fizeram vendas significativas, não porque as quisessem evitar mas porque ninguém quer as suas pseudo-estrelas a peso de ouro. Nem o Cardozo a preço de saldo conseguiram despachar.

Anónimo disse...

E que tal enviar este artigo para diversos órgão de comunicação social, a começar pelo Portocanal sem esquecer o FCP?

José Correia disse...

O passivo da sporting SAD (não confundir com o passivo global do grupo Sporting) aumentou em 38,8 milhões, para um total de 258,8 milhões de euros, e os capitais próprios passaram a ser de 119 milhões negativos.

Volto a perguntar: quem vai pagar e quando?

José Correia disse...

«No ano em que o Estádio da Luz vai receber a final da Liga dos Campeões, a SAD decidiu dar todas as condições a Jorge Jesus para conquistar o 33.º título de campeão nacional e, ao mesmo tempo, fazer uma campanha positiva na Champions. Para alcançarem estes objetivos os responsáveis encarnados não só seguraram os principais ativos do clube, como ainda investiram perto de 40 milhões de euros no reforço do plantel.»
in record.pt

Estaremos a falar do Sport Lisboa e Benfica ou do Sport Lisboa e Banca?

João disse...

Já se falou disso aqui noutro post.

Pedro Albuquerque disse...

Se algum dos bancos perdoar a dívida seja de que clube for, Porto, Benfica ou Sporting, só pode assumir que a Banca Portuguesa é gerida por incompetentes. Podem estar com prejuízos nos últimos anos, mas se perdoarem dívidas esses prejuízos serão ainda maiores, pois nunca verão esse dinheiro.

Se o Benfica ficar de fora na fase de grupos da Liga dos Campeões ou afastado da luta pelo título em Dezembro, veremos um desmembrar da equipa do Benfica. Jogadores como Matic, Gaitan, Cardozo ou Garay serão vendido, e não será pela cláusula de rescisão.

Já o Sporting se conseguir chegar à Champions League terá receitas que provavelmente não estariam no orçamento e terão uma pequena folga, mas se tal não for atingido o Sporting passará a ter um grande problema.

Sportinguista da Cedofeita disse...

Que engraçado! E qual é o passivo global do grupo porto (não confundir com o passivo da Porto SAD)?

Anónimo disse...

Não. Foram o bcp, bpi e banif. A caixa também acho que foi mas não tenho a certeza.

Nuno de Campos disse...

O BES faz as coisas por outro lado...

Pedro Albuquerque disse...

217 Milhões. Bem abaixo dos 258 milhões do Sporting.

Sportinguista da Cedofeita disse...

Sabes o passivo do "Grupo Porto"? O do Sporting é de 482 milhões actualmente, mas ainda com 224 de 2012, falta saber se houve alterações em 2013!

José Correia disse...

«O que se está a passar no Sporting é mais simples do que parece: uma negociação entre um devedor e os seus credores. O que não é simples é a forma de negociação. Porque o devedor tem uma força especial por ser um grande clube de futebol; e porque a mediatização faz parte do braço-de-ferro.
Bruno de Carvalho está a fazer o que se esperava: a radicalizar a negociação. E está a encostar os bancos a um canto que não esperavam, o de maus da fita. Os presidentes do BES e do BCP devem estar com a cabeça de molho, pois o que lhes deve apetecer fazer – mandar passear um devedor que trata mal quem o sustenta há anos – é impensável. Essa é a força de Bruno de Carvalho, a força da massa associativa. E ele não só está disposto a usá-la, como já está a usá-la.
Na conferência de imprensa de ontem, o presidente do Sporting deixou ameaças implícitas. Uma é de que o clube só existirá se os credores quiserem, uma vez que “está tudo dado de garantia”: se forem inflexíveis, o banco segue para processo de insolvência ou, no limite, de execução. Obviamente, isto nunca acontecerá. A outra ameaça é a da auditoria de gestão: ela significa que podem ser descobertos negócios e negociatas que envolvem “históricos” sportinguistas, em comissões de compra e venda de jogadores ou em contratos de fornecimentos.»
Pedro Santos Guerreiro
11-04-2013
in record.pt

José Correia disse...

Comunicado do Sporting

«Nos termos e para efeitos do cumprimento da obrigação de informação que decorre do disposto no artigo 248º, nº 1 do Código dos Valores Mobiliários, vem a Sporting Clube de Portugal - Futebol, SAD informar o seguinte:
A Sociedade informa que foram concluídas as negociações entre o Grupo Sporting e os Bancos financiadores, Banco Espírito Santo SA e Banco Comercial Português SA no âmbito das quais foram definidas as bases gerais do plano de reestruturação financeira.
A reestruturação financeira é crucial para o Grupo Sporting, e em concreto para a Sporting SAD, na medida em que permitirá à Sociedade, por um lado, elevar os seus capitais próprios, criar condições para assegurar o cumprimento dos requisitos do Fair Play financeiro exigidos pela UEFA para a participação nas competições europeias e, por outro lado, dotar a Sociedade dos meios necessários à gestão da sua actividade.

Lisboa, 12 de Abril de 2013»

Paulo Marques disse...

Investigar o quê? A banca pode legalmente fazer o que lhe apetece, com os dinheiros que lhe apetece e quem diz alguma coisa em sentido contrário é um comunista radical que quer destruir o nosso modo de vida.

O que resta fazer é barulho, mas enquanto a maior parte das pessoas gostar destas regras não há muito a fazer.

meirelesportuense disse...

Quem vai suportar esta Gestão Bancária incompetente?...Fácil:-Os Funcionários Públicos e os Reformados!

Nuno Leal disse...

O Pedro Santos Guerreiro é sportinguista.

Anónimo disse...

A peca fica melhor se for benfiquista e anima mais o pessoal, estes meloes servem para muita coisa sabes!

José Correia disse...

O Pedro Santos Guerreiro é benfiquista.
Sobre isso não há qualquer dúvida, foi o próprio que já o assumiu.

Nuno Leal disse...

tem toda a razão caro José Correia, já encontrei artigos que o provam. Não sabia e muita gente também não. Ele escreve imenso sobre o sporting, engana bem.

Pedro Albuquerque disse...

Jornalista de economia + empresas mal economicamente = Peças jornalísticas sobre o Sporting.

É a par do José Gomes Ferreira o melhor jornalista de economia em Portugal actualmente.

David Duarte disse...

"Os presidentes do BES e do BCP devem estar com a cabeça de molho, pois o que lhes deve apetecer fazer – mandar passear um devedor que trata mal quem o sustenta há anos – é impensável."

José Correia, a coisa não é assim tão linear.

1. Certo, é mais dificil para os bancos mandar passear uma instituição devedora que representa bem mais do que uma simples pessoa fisica ou empresa. Trata-se do caso dos clubes ou ainda Estados. São ainda mais do que uma pessoa moral pois representam algo no imaginario social que pode mesmo levar a tumultos.

2. Faz parte do interesse dos credores que os devedores tenham condições de pagamento... até porque é do interesse dos primeiros reaver algum do dinheiro investido quando o todo é impossivel. Não interessa à banca estabelecer condições de pagamento que de qualquer das formas não serão cumpridas devido à incapacidade dos devedores em pagar.

Uma reestructuração financeira é isto mesmo. Um acordo em que finalmente se consegue estabelecer os principios necessarios ao cumprimento dos deveres de quem deve. E muitas vezes, para tal cumprimento, é necessario efectivamente perdoar uma parte da divida que de qualquer das formas jamais serà paga.

Não estou aqui a desculpar o que quer que seja. Quero apenas levar um ponto que finalmente levanta ainda mais problemas. Pois imaginemos que o perdão da divida acontece realmente :

1. Serà a caixa de Pandora que se abre! A partir do momento que a banca aceita perdoar a uma instituição, as outras exigem muito naturalmente igual tratamento (dai a reacção do Benfica). Nessa situação é a propria banca que se mete em dificuldades. Ao perdoar uma parte da divida para que nem todo o dinheiro seja perdido, ela entra num circulo vicioso que a prejudica. Situação complexa!

2. Mas mesmo esta situação em que a banca "ampara" os clubes não é positiva para estes. Finalmente é uma situação em que a "bolha" cresce, por assim dizer, em que se adia o inevitavel que é que a bolha acabarà por rebentar : é finalmente o que a gestão do Vieira està a fazer ao Benfica. Ao vermos o seu R&C o que vemos é uma bolha que não pàra de crescer e que a médio termo colocarà o Benfica numa situação em que a crise da segunda metade dos anos 90 parecerà um jogo de crianças.

Ora, isto tudo para dizer o quê? Que a situação da generalidade dos clubes actualmente não é em nada distinta da dos Estados endividados, tal como a situação da banca. O perdão de uma parte da divida parece-me inevitavel pois não sei até que ponto os clubes podem efectivamente pagar a totalidade do que devem. Sobretudo porque a linha que separa o endividamento sustentavel da bancarrota é muito ténue. Imaginemos o Porto sem Champions durante 2 anos. Teria o clube meios para subsistir depois da venda inevitavel dos seus principais activos? Estamos no terreno das hipoteses, mas vemos que os clubes estão bastante fragilizados.

Agora isto levanta porblemas. Perdoando a um, a banca terà que perdoar a todos. E sobretudo, extrapolando para a sociedade, a partir do momento que a banca perdoa os clubes, com que moral continuarà esta a não perdoar uma parte da divida dos Estados?

Toda esta situação vai muito além do mero campo desportivo...

José Correia disse...

David Duarte disse...
Faz parte do interesse dos credores que os devedores tenham condições de pagamento... até porque é do interesse dos primeiros reaver algum do dinheiro investido quando o todo é impossivel.


As receitas operacionais da sporting SAD caíram de 40,7 para 32 milhões, enquanto os custos operacionais se mantiveram na casa dos 66 milhões.

É a quinta temporada seguida em que a SAD do Sporting apresenta prejuízos.

A última vez que a SAD leonina obteve lucros aconteceu em 2007-08 (600 mil euros).

O passivo do Sporting aumentou 38,8 ME para 258,8 ME.

Num cenário destes, como é possível haver bancos que perdoam parte da divida e continuam a emprestar dinheiro?

Por que razão, estes mesmos bancos, não fazem o mesmo em relação a PME's em dificuldades, mas que devem muitissimo menos dinheiro e não apresentam prejuizos brutais há cinco anos consecutivos?

David Duarte disse...

"Num cenário destes, como é possível haver bancos que perdoam parte da divida e continuam a emprestar dinheiro?"

Penso que coloca a questão em termos errados. A questão não é essa, mas a da negligência dos bancos que durante anos emprestaram dinheiro sem precaver o facto de uma parte desse dinheiro acabar por ser perdido.

Dai a minha comparação com o que aconteceu à banca em 2008. Na relação com o futebol a banca reproduz os mesmos erros : empresta, empresta, empresta até que aquele a quem empresta , de tão endividado que està, acaba por não ter meios dee pagamento. Resultado : o perdão da divida torna-se inevitavel.

Atenção! Não estou a dizer que a culpa disto tudo é exclusiva à banca. Deveriam ser os clubes os primeiros interessados em não entrar neste circulo vicioso. Mas a verdade é que uma boa parte deles parece não estar consciente da situação em que se encontram.

"Por que razão, estes mesmos bancos, não fazem o mesmo em relação a PME's em dificuldades, mas que devem muitissimo menos dinheiro e não apresentam prejuizos brutais há cinco anos consecutivos?"

Ora ai està a razão pela qual dizia que se a banca perdoar efectivamente parte das dividas dos clubes (como eu aho que farà pelas razões que jà apresentei) então entramos numa situação de perversidade extrema. OK, sabemos o que representa o futebol em Portugal (mas esta situação não se limita a Portugal), mas que crédito terà a banca aos olhos dos investidores economicos se ela perdoar a divida aos clubes enquanto, no estado economico em que se encontra o pais, não faz o mesmo pelas empresas? E sobretudo, como é possivel que o sistema financeiro perdoe as dividas dos clubes quando està a fazer tudo para não perdoar a dos Estados?

Vivemos num periodo dificil e todos os campos sociais são tocados pela crise, uns mais cedo que outros. Penso que o que aconteceu ao Sporting é um sinal claro de que a crise chegou efectivamente aos clubes. Os clubes têm que ter consciência disso. Sobre aqueles que dirigem o Benfica temo que eles não tenham compreendido o sinal de alarme (alias, ao querer ter o mesmo tratamento que o Sporting o que o Benfica quer é finalmente ganhar oxigénio para seguir na mesma logica, não é para sair do circulo vicioso). Sobre o Porto, o José Correia falarà melhor que eu.

David Duarte disse...

Devo dizer que não tenho competência em economia, por isso não tenho pretendo fazer de autoridade no que estou a manifestar.

Rui Mendes disse...

Olhe José Correia, eu nem costumo gostar dos seus posts mas a este tiro-lhe o chapéu. Pôs o dedo na ferida, mostrou o que as pessoas parecem querer ignorar ou não vêem.

É um assunto que é preciso aprofundar e expor publicamente.