segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

O saber do estilo

Na era da comunicação, aos treinadores é exigido que saibam passar a mensagem, prioritariamente junto dos seus grupos alvos. Ao treinador não se pede o impossível, mas exige-se a perfeição: no treino, no balneário, no banco, na comunicação, na capacidade de motivar o grupo, de o compreender, analisar, aconselhar, ensinar, aturar e assumir as suas falhas. Um líder que se preza não é Deus, mas tem de andar lá próximo. Na minha vida profissional lidei com alguns tipos que se julgavam uma espécie de deuses (apenas um degrau abaixo), só que não dispunham de tal gama de qualidades. Às vezes essa arrogância era apenas uma forma exterior de camuflar as fragilidades. Aliás, a TV (e a CS em geral) está cheia de gente com perfil idêntico.

Mas, não basta ao treinador ser um bom profissional, saber da matéria, ser sério e competente a liderar o grupo. Exige-se-lhe um auto-domínio exemplar em todas as fases: quando ganha, não vence ou perde e sempre assertivo nas reacções e nas palavras. O tom tem de estar conforme, e as palavras a condizer com o momento. Além disso, e este item é relativamente novo: tem de ter bom aspecto. O modo de vestir, a forma como se apresenta, o penteado, o ríctus facial, a harmonia dos gestos, o tom seguro, o discurso coerente e variado, conforme o momento exige.

Tem de ser autor, actor e artista. Não pode ficar mal na fotografia: esse é o primeiro passo para a vaia. O resto vem por decréscimo até chegar ao enterro.
As principais críticas que tenho ouvido a propósito da equipa técnica do FCP vão um pouco neste sentido. São todos low profile. Alguns intelectuais portistas têm sido arrasadores para com o treinador, baseados um pouco nalguma falta de jeito em comunicar de VP, que essas figuras exploram de forma algo cruel, pois é a área em que trabalham e são hábeis, mas que não lhes confere direitos especiais para avaliarem os dotes de um profissional de futebol, nomeadamente de um treinador cujo trabalho principal é invisível para os espectadores em geral.

VP tem que mudar o estilo. Nem que ganhe. Se ganhar, a dúvida resistirá ao sucesso. Um pouco como aconteceu ao Ivic, Fernando Santos, Jesualdo ou Adriansse, apesar de terem ganho muita coisa. VP está na calha para ter idêntico futuro, ele que só ganhou a Super Taça a um VG de baixo perfil, e já saiu da taça e da CL de forma pouco abonatória. Com resultados tão duvidosos e a denúncia (tornada verdade) de ausência de carisma, ficaria espantado se sobrevivesse.

Conheço intelectuais brilhantes que não conseguem expressar virtuosismo igual perante os holofotes televisivos. Vasco Pulido Valente é um deles, Eduardo Lourenço é outro, embora com registos bem diferentes. Saber comunicar não é despiciendo para maioria das profissões e para quem tem postos de comando. Mas não é tudo, nem o mais importante, salvo para os profissionais de comunicação. E, até estes, não raramente se escondem na repetição de lengalengas embrulhadas de sofisticação para explicar temas que são bem simples. Mas, tudo tem de parecer complexo, porque uma boa maioria acha que ligar o complicómetro é um sinal seguro de reconhecida boa interpretação e/ou explicação dos factos.

VP não tem estilo e esse é o seu maior pecado. Tentou mudar, mas não convenceu. Tem um ar sofrido que é interpretado como uma falta de capacidade para ler e superar os problemas e dar a volta por cima. Não tem estilo, logo não sabe. Provavelmente não vai continuar mas, ainda assim, desejo-lhe o melhor.

12 comentários:

Nuno Nunes disse...

Na era da comunicação, aos treinadores é exigido que saibam passar a mensagem, prioritariamente junto dos seus grupos alvo.

A primeira frase diz tudo. AVB fê-lo de forma exemplar na época passada.

VP não sabe passar a mensagem, nem sequer junto do seu grupo alvo. Um exemplo disto foi a sua primeira reacção ao afastamento da CL depois do empate com o Zenit. A equipa fez uma exibição muito esforçada, embora com pouca clarividência, e saiu do Dragão sob fortes aplausos.

VP, aos microfones, começa por dizer que agora o objectivo seria reconquistar a LE. Reconquistar a LE?! Era essencial saber hierarquizar objectivos. Depois de afastados da LC o nosso objectivo é o campeonato e é preciso passar essa mensagem aos jogadores a todo custo. Na passada sexta-feira, na antevisão do jogo com o BM, VP voltou a cair no erro de dizer que agora quer reconquistar a LE.

É um treinador intelectualmente fraco, pouco perspicaz, vaidoso e nada humilde. Acha que liderança é tratar os jogadores abaixo de cão. O FC Porto continua na frante no campeonato, apesar de VP.

nobigdeal disse...

bravo, muito boa análise.

acrescento apenas uma referência ao bigode do adjunto que, como é sabido, é responsável (o bigode) por algumas das nossas piores exibições esta época.

cumprimentos

Luís Negroni disse...

Nuno Nunes disse...
"É um treinador intelectualmente fraco, pouco perspicaz, vaidoso e nada humilde."

Tenho de concordar. Embora já tenha afirmado em comentário anterior, que estou disposto a engolir muito do que disse acerca de VP, se o Porto continuar no rumo dos 4 últimos jogos e a melhorar, é evidente que este treinador é pouco inteligente e tão ou menos perspicaz. E embora pareça humilde, por ser reservado e até tímido, na verdade é bastante vaidoso e não se enxerga (ambiciona alto demais para as capacidades que tem).

Todo aquele paleio no início da época, do futebol à Barcelona e mais isto e mais aquilo, para além de insensato - contribuiu muito para os jogadores acharem que já não precisavam de se esforçar - era também muito vaidoso, ainda por cima em alguém que está a começar uma carreira. Compare-se com o discurso de André Villas-Boas, que sendo sem papas na língua, motivador, aguerrido, era verdadeiramente humilde e sensato.

Luís Negroni disse...

Off Topic: E na Madeira, para não haver bailinho, houve vermelho andor em todo o seu esplendor; Mais um vermelho de Paredes em prol do clube mais levado ao colo do mundo (ressalvando, talvez, o real madrid do "meirinho"). E ainda havia ingénuos que pensavam que o Porto ia ficar isolado na liderança!

Amphy disse...

Concordo com o que foi escrito, mas o problema do Vítor Pereira não é só falta de estilo.

Parece-me que a dificuldade que tem em influenciar o destino do jogo a partir do banco também é notória. Este ponto é crucial num bom treinador.

Estrategicamente, também me parece muito limitado. Não vejo nenhuma inovação táctica na equipa, nem nenhuma mutação digna de registo, em adaptação à mudança de estilo do adversário. A equipa e o estilo de jogo são previsíveis. Básicos mesmo. De um estilo que já não se usa no futebol moderno. Julgo que é mesmo uma visão afunilada do que deve ser uma equipa de futebol e o seu estilo de jogo.

Admito que possa desenhar uns bons treinos, mas isto não chega para ser bom treinador principal. Para um adjunto razoável ainda dá.

A falta de liderança e a falta de perfil motivador também são óbvias.

Continuemos a travessia no deserto com a esperança que melhores dias virão. Temo que um a um os objectivos vão caindo. Com a chegada dos jogos grandes, com maior pressão, parece-me que não vai dar para continuar na frente.

Bem hajam.

Mário Magalhães disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mário Magalhães disse...

Concordo integralmente com o post publicado, há muito afirmo aqui e na praça pública que este treinador tem os dias contados.
Ainda no sábado perguntei-me depois do jogo e durante a conferência de imprensa se o treinador do Porto viu o mesmo jogo que eu vi...
Este treinador não tem mística, e tem um grave problema de comunicação, com todos os meios que o nosso clube tem já podia ter melhorado e muito este problema.
Cada vez me convenço mais que esta mudança de atitude por parte dos jogadores se deve ao nosso presidente e não ao treinador, a ele só lhe cabe colocar os jogadores em campo e mesmo isso faz com imensas dificuldades.
A melhor prenda que poderia ter neste natal era a sua saída do cargo técnico…

Ozzy Bluesky disse...

Plenamente de acordo com a opinião. Neste mundo multi média, é cada vez mais "olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço".
Quanto ao Rui Quinta, a culpa não é dele, é da SAD. Já lhe deveriam ter dito que bigode, fato de treino e sapatos, nem na Merdaleja hoje em dia se usa...

Daniel Gonçalves disse...

Excelente post Mário Faria. Um tema amplo e controverso.

O discurso titubeante de Vítor Pereira é, na minha opinião, reflexo de uma personalidade indecisa, de pouca assertividade e pouco corajosa. Se ele não consegue comunicar com o balneário ou passa nas palestras a mensagem errada para os jogadores é um problema. Sabendo que liderar significa mobilizar pessoas com vista à concretização de um objectivo, ter o dom da palavra fácil e um discurso motivador é essencial para um treinador actual, qualidade que o Vítor Pereira - ainda - não possui. Como a natureza humana só é moldável até determinado limite, transfigurar uma personalidade é um trabalho moroso, complicado e nem sempre possível.

"este item é relativamente novo: tem de ter bom aspecto. O modo de vestir, a forma como se apresenta, o penteado, o ríctus facial, a harmonia dos gestos, o tom seguro..." Aqui discordo, não é fulcral ser-se isso, nos tempos actuais, para ser um bom treinador. Claro que o marketing procura impor essa condição aos treinadores como factor de vantagem no "mercado", e estabelecer simultaneamente as regras do "establishment" social/cultural actual, mas alguns treinadores fogem a esse condicionalismo, e conseguem mesmo impor o seu próprio estilo. Claro que um treinador definido de acordo com os parâmetros que o Mário Faria salientou terá sempre uma imprensa (a cor-de-rosa incluída) amiga e com os holofotes da fama virado para si, mas tal não é sinónimo de competência ou qualidade desportiva.

Daniel Gonçalves disse...

Nuno Nunes disse "É um treinador intelectualmente fraco, pouco perspicaz, vaidoso e nada humilde." Na mouche. E alterar, no sentido de acrescentar virtudes ou alterar defeitos, uma personalidade é um trabalho moroso e de resultado incerto, ou mesmo em alguns casos impossível. Vítor Pereira tem muito a melhorar nestes aspectos.

"Acha que liderança é tratar os jogadores abaixo de cão." Exactamente, neste aspecto está mais próximo de Octávio Machado do que de Andrè Villas Boas, liderança não é sinónimo de autoritarismo. Um treinador tem de compreender os seus jogadores, de forma a tirar proveito das suas capacidades em prol da equipa.
Para testar a qualidade de um líder/treinador temos de determinar se o seu contributo torna a equipa mais eficaz no cumprimento dos objectivos comuns, ou seja, alcançar vitórias e boas exibições. Fazendo o paralelismo com a temporada passada, com o mesmo lote de jogadores - excluíndo Falcão - até esta altura do campeonato actual, os mesmos jogadores renderam mais e sentiam-se mais motivados na temporada passada. Claro que nos últimos jogos do FC Porto já se nota outra atitude dos jogadores, resta saber se tal facto se deve à motivação dada pelo VP e pelo seu trabalho ou foi fruto de outras circunstâncias: palavras do Presidente; consciência do valor desportivo e financeiro da continuação da equipa na Champions.

Daniel Gonçalves disse...

Mário Faria disse "VP não tem estilo, logo não sabe"

Não concordo com esta afirmação, Vítor Pereira tem um estilo próprio ou típico de determinado tipo de treinadores, comuns em equipas portuguesas do meio da tabela, ou de outros escalões.
Mas esse estilo comunicacional, de que ele é portador, não é adequado a um treinador de uma equipa de topo, sobretudo numa equipa que quer vingar e vencer no futebol internacional. Um treinador vencedor tem de transmitir confiança, motivação e persuadir os outros, quer com a palavra, quer com o comportamento não verbal, ou seja tem de demonstrar saber (que o Mário Faria refere) quando fala. Tal não é o caso de Vítor Pereira. E para tal não é preciso vestir fatos italianos ou feitos em Saville Row, nem usar gravatas de seda do Oriente, ser-se escravo da moda não significa competência. Pedroto usava um boné peculiar que seria reprovado pelo ditames da moda actual, mas era competente no seu trabalho; raramente vemos Van Gaal de fato e gravata no banco de suplentes.

José Rodrigues disse...

“VP não tem estilo e esse é o seu maior pecado.”

Discordo em absoluto do Mario neste ponto (e em geral com o espirito do artigo).

O maior pecado - de longe – do VP nao tem nada a ver com o “estilo” (q de facto nao ajuda, mas e' totalmente secundario), mas e’ pura e simplesmente q ele e’ um treinador mediocre (no maximo...), ponto final paragrafo.

Ou seja, o problema e’ mesmo o conteudo da caixa, e nao o embrulho.

Discordo tambem q os adeptos esperem perfeicao do treinador, e q seja esse o problema do VP.

Sim, os portistas sao exigentes (e ainda bem), mas muitissimo menos do q o Mario escreveu. Pegando num exemplo: considero-me um adepto bastante exigente, mas dei muito mais beneficio da duvida ou credito a treinadores como Co Adriaanse ou J Ferreira do que dou a VP.

Naturalmente isso nao e’ porque o VP me tenha feito pessoalmente algum mal (nao o conheco de lado nenhum e desejo-lhe tudo de bom), e tambem nao e’ certamente por causa do estilo (Co e Jesualdo tambem estavam longe de terem um estilo q empolgasse os adeptos... o primeiro era autista e abrasivo, o segundo demasiado amorfo). E’ porque^ entao?

Pura e simplesmente pelo q vou vendo do VP semana a semana, jogo a jogo, dia a dia. Nao lhe peco q seja campeao europeu nem q ganhe o campeonato com 10 pontos de avanco, muito longe disso; mas acho q nao era pedir muito q nao fossemos eliminados da LC e da Taca por culpa de decisoes dele, q nao tivessemos ja’ perdido pontos no campeonato por culpa de decisoes dele. Entre outras coisas.