segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Contratações - o papel do treinador

O papel do treinador nas contratações é uma eterna discussão entre adeptos (e não só).

Dizia um colega meu (Mário Faria) num artigo anterior que "Os treinadores treinam e a SAD é a quem cabe por inteiro (com toda a justeza) as tarefas de alocação do investimento".

E’ uma opinião; pessoalmente, discordo veementemente - nomeadamente quando diz "com toda a justeza". No valor total a investir sim; na alocação desse investimento, não.

Para mim o ponto fundamental é simples: ou a SAD tem confiança na competência do treinador que escolheu, ou não tem (e nesse caso mude-se o treinador).

Ora se tem confiança (e à partida terá que ser sempre o caso, mesmo que isso mude com o tempo), então cabe acima de tudo ao treinador definir as prioridades para contratações: por exemplo, "preciso acima de tudo de um bom PDL/médio ofensivo/def esquerdo (idealmente com as características x, y ou z), e em segundo lugar um jogador para a posição w, etc".

Eu acho que cabe à SAD satisfazer esse pedido do treinador o melhor possível e apresentar-lhe portanto possíveis soluções ao seu pedido em função da prospeção do mercado (tarefa em que são eles acima de tudo os responsáveis - embora o treinador possa dar algumas dicas sobre jogadores que tenha observado, mas isso já é valor acrescentado).

Cabe ao treinador por sua vez compreender e aceitar alguns princípios gerais da SAD, nomeadamente o limite total disponível para contratações e um ou outro principio básico que tenha sido estabelecido à partida (por exemplo, não gastar-se imenso dinheiro em jogadores com idade avançada, já que é preciso pensar no futuro e em potenciais mais-valias; outro exemplo hipotético sera comprar jogadores cujo salário venha a ser muito mais elevado que o salário mais elevado do plantel nesse momento).

A decisão final (após potenciais opções apresentadas ao treinador pela SAD após prospeção) deverá ser tomada em conjunto por treinador e SAD da forma mais consensual possível, mas com a opinião do treinador a ter o maior peso (a palavra final).

A excepção a essa regra será apenas contratações especulativas e de valor relativamente baixo para jogadores que não vão sequer ficar necessariamente no plantel na 1ª época (as ditas “oportunidades únicas de negócio”). Essas compreendo q sejam tomadas unilateralmente pela SAD, mas na condição de que os principais pedidos do treinador sejam simultaneamente satisfeitos. Eu diria que Djalma ou Kelvin encaixam neste tipo de contratação, tal como possivelmente um Iturbe ainda que em menor medida (o seu custo já foi algo considerável, mas não tão elevado como isso).

De qualquer forma é normal que hajam iterações neste processo. Por exemplo: à partida a SAD dirá ao treinador q tem 15 a 20 milhões para gastar no total, mas acrescentará numa 1ª iteração passado 2 semanas que "afinal há agora uma boa proposta de venda para o jogador x", o que levaria a que haveria mais dinheiro para contratações mas também a um novo buraco no plantel (e ver o que o treinador tem a dizer sobre isso).

Isto, em suma, é o que eu defendo. Não sei (nem sabe o comum adepto) como é que as coisas se passam em concreto no FCP e especificamente no último Verão. Sei apenas que em geral parece-me que na prática haverá um desvio claro destes princípios em favor de maior peso para a direção da SAD em detrimento do treinador; e que – a meu ver, e já o digo desde Agosto – atacamos mal as prioridades no ultimo Verão, investindo pouquíssimo para a posição à partida mais frágil (ponta de lança) enquanto investíamos como uns loucos para outras posições, algumas delas em que estávamos bem servidos (por exemplo, médios de transição – falo de Defour que, sendo um jogador que me agrada em certa medida, certamente não era uma prioridade tendo já nós Moutinho, Souza, Guarin e Castro e custando ele uns 8 milhões; o mesmo poderá ser dito de Alex Sandro, que custou um balúrdio para aquecer o banco ao A. Pereira).

Para concluir, um modelo em que a SAD tem maior peso fará ainda menos sentido num clube como o FCP que tem um modelo de gestão oportunista e especulativo e em que muito pouco se aposta na prata-da-casa. Quando assim é, (ainda) mais liberdade deve ser dada ao treinador nas contratações já que não há - nem poderá haver - sequer um modelo de jogo padrão em que os jogadores estão rotinados ao longo de anos (ao contrário de por exemplo um Barcelona).



PS – para simplificar usei a linguagem do adepto comum neste artigo, logo onde esta' escrito 'SAD' deve-se ler 'direção da SAD' (administradores + A. Henrique); e' que se quisermos ser correctos tecnicamente, são todos funcionários da SAD (treinador e jogadores incluídos).

15 comentários:

littbarski disse...

"O treinador disse que o jogador não tinha características para o jogo do FC Porto. Ficou declarado e comunicado ao empresário que estava a tratar disso que o jogador não interessava"

Pinto da Costa, a propósito da falada contratação de Teo Gutiérrez.

Pedro disse...

A contratação do Alex Sandro, do Mangala e do de Four só podem ser atribuídas ao treinador por manifesta desonestidade.

O técnico diz o quer, o Presidente negoceia como pode. O Alex foi comprado porque provavelmente havia expectativa de vender o Álvaro (o chelsea sentiu a necessidade do Porto e esticou a corda ... o Porto já a havia esticado antes e deu no que deu). O de Four foi comprado porque provavelmente se pensava que alguem bateria a cláusula (ou próximo disso) do Guarin e o Mangala porque talvez não houvesse garantia de segurar o Otamendi.

Só para recordar - a venda do Meireles no ano passado foi uma sorte tremenda por aparecer um comprador vindo do nada. Visto agora à distância pode pensar-se que foi um grande negócio - a troca do Moutinho pelo Meireles ... mas o facto é que as coisa só aconteceu assim porque o Liverpool na última hora se chegou à frente com 13 milhões.

Não se comprou o Damião porque o negócio do Falcão se atrasou. Nestes detalhes podem as transferências custar uns milhões a mais ou a menos. As coisas correram mal nos timings e com os clubes compradores. Acusar o técnico de ter responsabilidade em termos excessos em algumas posições e fragilidades noutras parece-me um pouquinho de má fé.

O treinador joga com o que o clube pode. Simples assim, até porque o Porto não é o Barcelona.

Pedro disse...

E sobre o Danilo diria que por conta da expectativa de venda de 2/3 jogadores por preço alto, a SAD entendia que se podia esticar com um lateral de eleição em ambos os lados. Na direita não estamos tão bem servidos como na esquerda.

O que a SAD provavelmente pensou foi que o Alex Sandro seria tão bom substituto ao Álvaro, como este último foi ao Cissokho. Só faltaria um lateral direito de igual qualidade. Se vendessem o Álvaro por um valor perto da cláusula, talvez conseguissem pagar os dois novos laterais.

O problema é que o PdC não é único que sabe negociar no mundo. E o facto de ser um negociador duro às vezes dá nisto. Acabou a ficar com três laterais caros, dos quais até à data só se consegue aproveitar um (precisamente aquele que talvez se pensasse em vender).

E sinceramente acho que só acederam em vender o Falcão porque não encontravam comprador para pagar o que o Porto queria para os outros. E assim sendo não há como fugir ... aliás mesmo com esta venda, têm acontecido graves situações de ruptura de liquidez. Ou seja não havia mesmo outra solução - ou despachavam o Álvaro e mais um ou dois por metade (ou menos) da cláusula, ou vendiam o Falcão, ou então teriam situação de tesouraria ainda mais comprometida.

Miguel Magalhães disse...

O que o José Rodrigues defende é um modelo de Manager que é o que se verifica p.ex. em Inglaterra e com o qual também concordo.
No entanto, noPorto não creio que seja assim. A SAD gere as contratações em função do que considera serem bons negócios numa óptica de compra e venda, e só assim se compreendem os desiquilibrios que existem actualmente no plantel com excesso de investimento em defesas laterais, o excesso de esquerdinos e a ausência de um ponta de lança compatível com as exigências da equipa.
Num clube como o Porto, que é hoje em dia mais um negócio de compra, valorização e venda de jogadores do que um clube de futebol, deixar o ponto inicial do negócio nas mãos de um treinador seria um risco tremendo para o modelo de gestão adoptado.
No Porto há o ciclo de valorização do jogador que dura em média 3 épocas entre a compra e a venda com lucro. E há o ciclo do treinador que, salvo o caso do prof. Jesualdo, dura por norma duas épocas. Não só os ciclos não coincidem na maior parte das vezes (praticamente coincidiram no tempo do Mourinho que foi o que mais se assemelhou ao Manager, dado que fez uma equipa à sua imagem que se desfez quando ele foi embora) como o Porto não teria capacidade para fazer e desfazer equipas em função das vontades dos treinadores.
A SAD contrata dentro das oportunidades do mercado, e das necessidades da equipa, e ouvindo a opinião do treinador, este treina numa perspectiva de valorização dos activos (por norma contratados jovens e com elevada margem de progressão) e a SAD vende quando surgem oportunidades para tal de forma a poder reinvestir e reiniciar o ciclo. A responsabilidade é total da SAD.

Pedro Reis disse...

E esta novela do Danilo já começa a cheirar mal... parece que alguém andou ou anda a dormir no FCP!

José Rodrigues disse...

"O que o José Rodrigues defende é um modelo de Manager que é o que se verifica p.ex. em Inglaterra"

Por acaso nao e' (embora se aproxime disso). E' um modelo intermedio: no modelo de que falas o treinador tem mais autonomia (quase total, como no Man Utd) do q no modelo q defendo (em q ha' varios principios q terao q ser respeitados, e dei 2 ou 3 exemplos; e com a SAD a ser quem apresenta resultados de prospecao ao treinador como opcoes).

' deixar o ponto inicial do negócio nas mãos de um treinador seria um risco tremendo para o modelo de gestão adoptado'

Desde q se respeitam os principios de q falei, o risco e' minimo. Acho alias q e' certamente mais baixo do q investir forte em jogadores em cuja contratacao o treinador pouco (ou nada) teve a dizer (e q podem nao ser uteis para o modelo de jogo do treinador). Por ex, Diego com Co Adriaanse; ou Ibarra; e tantos outros (mais baratos) ao longo dos anos.

Entretanto muda-se de treinador? Ok, a primeira coisa a estudar pela SAD e' se ha' alguma incompatibilidade fundamental entre o plantel existente e o treinador, antes mesmo de o escolher; e em segundo lugar, os tais principios da SAD nas contratacoes terao q ser compreendidos e aceites pelo treinador, antes mesmo de assinar contrato (sabendo q tera' no entanto possibilidade na mesma de contratar uns POUCOS jogadores de forma cirurgica para moldar o plantel um bocadinho mais 'a sua imagem).

José Rodrigues disse...

Pedro disse: 'Acusar o técnico de ter responsabilidade em termos excessos em algumas posições e fragilidades noutras parece-me um pouquinho de má fé'

Nao sei onde e' q o Pedro leu isso (seja no artigo, seja nos comentarios).

No q me diz respeito, repito q nao sei quem e' q tomou quais decisoes nas contratacoes no ultimo Verao, entre treinador e SAD. Sei apenas q ou um, ou outros (ou uma mistura) nao foram competentes na formacao do plantel, ponto final paragrafo.

José Rodrigues disse...

E para concluir: um clube com as limitacoe$ do FCP nao se pode dar ao luxo de querer sistematicamente comprar um substituto antes de vender o titular - ACIMA DE TUDO quando se quer comprar jogadores bastante caros para substituto (como Defour, A. Sandro ou Danilo).

'As vezes sim, e' possivel *e* desejavel. Mas sistematicamente e por atacado (como tera' sido eventualmente o caso no ultimo Verao) e' ma' ideia.

Mais: quando a SAD envereda por negociacoes numa venda deve tentar decidir-se 'a partida se a negociacao tem apenas como objectivo maximizar o encaixe (decidindo 'a partida q o jogador e' mesmo para vender), ou se e' so' para vender se a oferta for irrecusavel; as contratacoes de substitutos caros devem ser por antecipacao acima de tudo no primeiro caso, nao no segundo.

Luís Negroni disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luís Negroni disse...

Miguel Magalhães disse...
"Num clube como o Porto, que é hoje em dia mais um negócio de compra, valorização e venda de jogadores do que um clube de futebol"

Isso só seria verdade, se o Porto não fosse um clube ganhador desde que implementou essa política. Só que, desde que implementou essa política, o Porto não só é ganhador, como é até dos clubes mais ganhadores do mundo. Logo, a afirmação citada acima, não faz sentido, porque não corresponde à realidade.

Pedro disse...

Pedro disse: 'Acusar o técnico de ter responsabilidade em termos excessos em algumas posições e fragilidades noutras parece-me um pouquinho de má fé'

Nao sei onde e' q o Pedro leu isso (seja no artigo, seja nos comentarios).


Peço desculpa!

Foi um erro de interpretação. A ideia que tinha é que a intenção do post era alocar a responsabilidade das más contratações ao treinador, sendo que a minha opinião é que o modelo de gestão me parece bem descrito pelo Mário Faria (independentemente de ser certo ou de eu próprio concordar com esse modelo).

José Rodrigues disse...

Pedro disse: "A ideia que tinha é que a intenção do post era alocar a responsabilidade das más contratações ao treinador"

Por acaso a intencao do post nao era alocar responsabilidade de mas contratacoes a quem quer q seja (nem a treinador, nem 'a direcao da SAD), mas sim discutir (dando eu o mote) qual o modelo mais eficaz / preferido pelos adeptos.

Pedro disse...

Por acaso a intencao do post nao era alocar responsabilidade de mas contratacoes a quem quer q seja (nem a treinador, nem 'a direcao da SAD), mas sim discutir (dando eu o mote) qual o modelo mais eficaz / preferido pelos adeptos.

Certíssimo José. Como lhe disse, o comentário inicial decorria de um erro meu de interpretação.

Sendo agora outra a interpretação, naturalmente entendo a intenção do post (coisa que não havia entendido antes).

Sobre essa discussão; ainda que possa entender que a sua perspectiva é a correcta, é de facto difícil de a implementar num clube como o nosso (ou como em qualquer outro em Portugal).

É que só dá para ter atletas de qualidade acima do que o nosso mercado Português pode suportar, através deste jogo de transferências que tem, como é óbvio, enormes riscos.

José Rodrigues disse...

Negroni disse: "Só que, desde que implementou essa política, o Porto não só é ganhador, como é até dos clubes mais ganhadores do mundo. Logo, a afirmação citada acima, não faz sentido, porque não corresponde à realidade"

De facto concordo q o FCP nao e' um negocio de compra e venda de jogadores, sendo tambem sem duvida um clube de futebol (i.e. competitivo).

Dito isto, la' por sermos ganhadores nao quer dizer q tudo e' perfeito e contribuiu para isso, comecando por... o processo de decisao (e em particular o balanco SAD/treinador) na compra de jogadores. Uma hipotese e' q ganhamos titulos APESAR disso (outra e' q nao ha' nada fundamentalmente errado nesse processo, mas que ele pode ainda ser refinado e optimizado - q a bem dizer e' a minha opiniao pessoal).

Eu acho bem q o FCP contrate acima de tudo jogadores relativamente jovens com elevado potencial de progressao (mas sem fundamentalismos: se houver uma posicao carenciada e houver um bom candidato de 28 ou 29 anos q nao seja caro, porque nao... desde q seja mais a excepcao do q a regra).

Eu acho bem q a SAD faca algumas contratacoes unilaterais (i.e. sem dedo do treinador) e especulativas "para o futuro" - mas desde q nao se gaste muito dinheiro nisso, e sem impor ao treinador q fique sequer com o jogador no plantel na 1a epoca (quanto mais utiliza-lo).

Acho apenas q a grande maioria do investimento deve ir para as prioridades definidas (desportivamente) pelo treinador, e q deve ser este a ter a ultima palavra na escolha do jogador (mas cabe 'a SAD nao so' ter uma palavra como apresentar-lhe um leque de opcoes, idealmente de meia duzia de jogadores - nem muito mais, nem muito menos).

Miguel Lourenço Pereira disse...

Partilho totalmente da linha de raciocinio do José Rodrigues.

O modelo da Premier só é valido por assenta numa cultura de proprietários que apostam em figuras a longo prazo que rapidamente se identificam com o clube, é algo que transportado para o Continente é muito complicado (só me lembro do Guy Roux com um perfil similar ou o Lobanovsky).

Um treinador que não tenha poder na definição do plantel não é um treinador, é um simples técnico de campo que tem de se apanhar com o que há, que tem de fazer omeletes sem ovos e que depois leva com a culpa quando as coisas correm mal. Uma SAD ou direcção deve estar atentas aos melhores negócios e ter uma palavra a dizer, sobretudo na mais valia de jogadores comprados com um objectivo claro. Mas é ao técnico quem deve competir formar o plantel, determinar altas e baixas e, sobretudo, encontrar jogadores com o perfil que quer para o seu modelo de jogo.

um abraço