sábado, 17 de janeiro de 2009

O Centro da Questão

Por Luís Carvalho

Em que moldes pode um meio-campo ser avaliado de forma justa?
Fácil é aferir a qualidade de um guarda-redes e/ou de um sector defensivo pelo número de golos que sofre ou de um ataque pelo número de golos que obtém. São números exactos e redondos que, dessa forma, aniquilam qualquer argumento que tenha por base a subjectividade de quem avalia.
Já no sector intermediário, por definição a "zona cerebral'' de qualquer equipa, a subjectividade impera.

Como se define, afinal, um bom meio-campo?

Na componente defensiva, raramente ou nunca um médio é apontado a dedo por um qualquer golo adversário. Mesmo que num dado lance seja bem visível o seu erro, haverá sempre o argumento que, atrás, existiria ainda (ou deveria existir) toda a muralha defensiva e o guarda-redes.
Alguém se lembra de algum golo com culpas unanimemente atribuídas a um Fernando?
E a um Assunção? Ou mesmo a um Costinha?
Muito, muito raro.
E então, se não forem "trincos", os médios podem mesmo, descansadamente, levar toda uma carreira sem qualquer medo de aparecerem, destacados, nos jornais pelas piores razões…

Na outra vertente do jogo, a ofensiva, também aqui pouco há a recear: se a equipa não marca, é seguramente culpa dos avançados.

Um médio é, assim, apenas recordado pela sua contribuição positiva, nunca pela negativa: "fez aquele corte primoroso"; "fez aquele magnífico passe a rasgar".
Tudo muito bem, mas a questão é:
- Quantos "cortes primorosos" deve ele fazer, em média, por partida? 1? 2? 6? 10?
- Quantos "passes a rasgar toda a defesa contrária" são aceitáveis, por época, para um médio que joga numa clube pleno de ambições como o nosso FCP? 5? 30? 100?

Pois é, não existe resposta científica para tais perguntas. Reina a subjectividade de cada um.

E é assim que se perpetua um dado meio-campo. No nosso caso, e durante as últimas duas épocas e meia, a fórmula dos '2 trincos e meio' de Jesualdo.


Não havendo números objectivos, e tendo o FCP obtido sucesso no campeonato (que não nas restantes competições), dá-se como bom que este ordenamento táctico deve ser mantido ad eternum.
Há, porém, que ter cuidado. Permanece bem actual aquela velha característica da nossa liga: pode-se enganar muita gente durante muito tempo (vide Boavista-campeão com Pacheco e o slb de Trapattoni).

Para uma avaliação mais rigorosa há, portanto, que ler bem nas "entrelinhas": sejam elas o "teste do algodão" que são os jogos da Liga dos Campeões, sejam elas aqueles encontros que estão difíceis de serem desbloqueados.
É aqui que se revela a verdadeira natureza do nosso meio-campo:
- Muito pouca posse de bola para uma equipa de primeiro plano;
- Preocupação exageradamente defensiva (o trinco, seja ele Assunção ou Fernando, renuncia a toda e qualquer missão ofensiva. O próprio Meireles, praticamente só avança nas bolas paradas, aqui também devido a algum deficit técnico);
- Pobre imaginação na hora de encontrar novas soluções.

Mesmo assim os resultados internos são satisfatórios?
Talvez, mas imaginem o que teriam sido estes últimos 2 anos e meio se, em vez de termos contado com três avançados de grande nível (Quaresma, Lisandro e Hulk), tivéssemos apenas tido uns que fossem "bonzinhos"...

Não andaremos um pouco distraídos apenas com a questão do lateral-esquerdo?

Com o actual desenho táctico, sem qualquer médio criativo, a equipa não conseguirá mais do que aquilo que tem realizado: sequências interessantes de vitórias na Liga e grandes dificuldades (e derrotas) contra equipas "grandes" e contra adversários menores mas que se sabem fechar (precisamente os jogos nos quais mais se exige a um meio-campo).
É uma táctica que atingiu o seu ponto de saturação. Não encontra, definitivamente, soluções para problemas mais bicudos.

Mas haveria algum mal em abrir o jogo de equipa a novas nuances criativas, utilizando um "playmaker"?
Teremos, porventura, vergonha das épocas em que, com muito sucesso, utilizávamos um jogador com essas características?
Poderíamos, ao menos, ter no plantel um futebolista assim?
Será pedir muito?

Rodriguez, supostamente recuado num meio-campo a quatro, não tem feito grande diferença, pois não chama a si o jogo (mal geral de todos as nossas presentes opções para aquela zona nevrálgica).

A nossa dimensão futebolística está praticamente reduzida à inspiração dos nossos jogadores de frente. É neles que este futebol de Jesualdo aposta tudo. Felizmente, dado o excelente valor dos nossos desequilibradores das linhas mais avançadas, os troféus têm continuado a cair na nossa rede.
Nada, porém, é eternamente garantido. As "inspirações", quando individuais, podem secar repentinamente, sem razão aparente. Há que mexer antes que a isso sejamos obrigados pelas circunstâncias. Demos, pois, qualidade e imaginação ao nosso meio-campo o quanto antes. A tal dimensão superior de um meio-campo que "age" e que não apenas "reage". Um meio-campo que "está" em vez de só "aparecer" a espaços.

Mas, afinal, que ambições queremos verdadeiramente ter?
Por favor, não me venham falar em orçamentos e receitas...


Queremos mesmo, algum dia, voltar a ser grandes na Europa?

Nota final: O 'Reflexão Portista' agradece ao Luís Carvalho a elaboração deste artigo.

3 comentários:

sirmister disse...

Deixo um comentario aos 2 ultimos artigos.

Quanto ao outro acho que é dificil fazer uma avaliação acertada, porque a equipa alem de ter sofrido muitas alterações, teve um problema grave nas laterais que condicionou todo o jogo da equipa e teve jogadores em claro sub rendimento como o lucho lisandro e rodrigez, agora começa-se a ver o que a equipa pode fazer.

Quanto aos medios acho que o facto de o trinco não avançar nao é preocupante desde que de liberdade aos outros medios que estão á sua frente, alem disso acho que temos um playmaker no plantel internadcional argentino de seu nome lucho.

José Correia disse...

«Preocupação exageradamente defensiva (o trinco, seja ele Assunção ou Fernando, renuncia a toda e qualquer missão ofensiva.»

O Fernando é um jogador que me vem surpreendendo pela positiva.

Se continuar a evoluir como deu mostras nestes primeiros meses de FC Porto, é um jogador que pode atingir patamares superiores ao Paulo Assunção.

Um dos aspectos onde o Fernando em parece com mais potencial é precisamente na capacidade de "esticar" mais o jogo, isto é, de passar a linha do meio-campo e em aproximar-se mais da área contrária do que fazia o Paulo Assunção.

rui disse...

O porto só triunfou na europa pk tinha o maior e melhor playmaker da década de 00 - Deco. Ele foi o factor decisivo...e jogadores desses é muito dificil de encontrar...digamos que ao porto saiu-lhe a sorte grande...