sábado, 24 de janeiro de 2009

O centro e a criatividade


Portugal é um país que tem uma grande atracção pelo centro, fazendo jus ao ditado de que no centro é que está a virtude.
No futebol parece acontecer o mesmo. Na velha Albion, pátria do dito, não acontece nada de muito diferente: 45 a 50% do tempo do jogo (pelas estatísticas que tenho tirado do campeonato inglês) a bola anda na zona de projecção entre as linhas superiores que delimitam as grandes áreas.

É aí a zona nevrálgica: era normal ouvir falar na batalha pela conquista do meio campo ou que ganhar o meio campo era essencial para ganhar a guerra. Ontem como hoje, dominar essa zona do terreno era (e é) crucial. E não foi, por acaso, que passou a ser mais habitada com os treinadores a privilegiarem a concentração de jogadores nessa zona do terreno. O problema que se põe é como utilizar esse domínio num ataque continuado, como se impõe a uma equipa como a do FCP, pelo menos ao nível caseiro.

Não há sistema ou processo que dispensa a criatividade e esta é uma condição que no futebol como nas artes abriga um conjunto vasto de talentos (quase sempre) autónomos. O pintor, não tem que ser tenor nem bailarino ou escritor. No futebol há jogadores criativos com características diferentes: Messi, Ronaldo, Káká, Xavi, Roberto Carlos, Maicon, Baresi, Pilro, Torres, Madjer, Quaresma, Lucho ou Pedro Moutinho são jogadores criativos mas com uma identidade própria e que nunca pode ser expressa com total liberdade porque não competem individualmente. Dependem sempre de terceiros.

Para além disso, não são dispensados de ter um perfeito domínio técnico, táctico e uma boa capacidade física. E, sem, isso não há criatividade que chegue. E, cada vez mais, ao jogador de futebol se exige que domine todas as vertentes do jogo: saiba defender, atacar, passar, rematar, centrar, correr, ocupar espaços e não esquecer que é apenas uma parte do todo.

Se a isto tudo o atleta juntar um ritmo alto de forma consistente e for suficientemente privilegiado para ultrapassar os seus adversários com as suas habilidades e decidir jogos, então estamos perante um artista. No FCP será difícil poder ter alguém desse tipo nas nossa fileiras.

Hulk é criativo? Lucho é criativo? Lisandro é criativo? Rodriguez é criativo? Tarik é criativo? Guarín é criativo? Tomás Costa é criativo? Bruno Alves é criativo?
Não sei, mas acho que alguns são muito bons jogadores e acho que a criatividade (a improvisação) é importante sob pena do jogo se tornar demasiado rotineiro, mas a potência, a rapidez, a capacidade de execução, a desmarcação, a marcação, a mobilidade, o aproveitamento das bolas paradas, a certeza no último passe e o poder de remate são qualidades que se aperfeiçoam e não exigem necessariamente um alto grau de improvisação. Exigem que os gestos técnicos sejam aperfeiçoados ao extremo, e quando o domínio desses dotes atingirem um bom nível estamos muito próximos de poder criar – na base do treino – muitos lances de excelência.

Dizia um actor que não há nada que dê mais trabalho que a improvisação. No futebol acho que se passa um pouco do mesmo, e como diria qualquer gestor (treinador) o caminho do êxito requer 90% de transpiração e 10% de inspiração.

Não creio que um treinador do FCP prepare a sua equipa para jogar em contra-ataque. Seria um incompetente, e não creio que JF o seja. Agora que a transição rápida seja muito rotinada sempre que seja possível o contra golpe, não só é adequado como é desejável. E que o FCP crie um conjunto de condições para favorecer essas transições rápidas, também me parece muito avisado. Mas, o jogo do FCP não pode ser só isso. O JM que privilegia bem mais a posse de bola tem sentido enormes dificuldades em Itália e esta semana levou um baile táctico do Del Neri.

É futebol. Sobre o contra-atque, e retirado do Planeta Futebol, transcrevo um breve resumo da evolução táctica nos primórdios do futebol, a importância do WM que Bella Gutman projectou em Portugal nos anos 50 no FCP e SLB, já quando o 4x2x4 de Otto Glória e Yustrich parecia vingar sobre os demais processos tácticos.

“Depois dos rudimentares 2-2-6 e 2-3-5, surgiu nos anos 30, o grande fundador da dinastia táctica do futebol mundial: Herbert Chapman.
No fundo, dizem os estudiosos, Chapman tinha descoberto a raiz do contra ataque, grande arma futebolística do futuro. Sábio, porém, também percebera que a eficácia de qualquer sistema dependeria sempre da qualidade dos seus jogadores.

Estudioso e sagaz, Chapman criaria então o famoso WM, assim chamado porque a formação dos jogadores em campo lembrava as pontas de ambas as letras, o sistema que serviria de base a toda a evolução táctica que ciclicamente marcou o século do futebol. Basicamente, o novo sistema alicerçava-se no recuo de dois dos cinco jogadores do ataque, que assim passavam a ocupar postos que seriam designados por interiores.

Ao mesmo tempo, com o recuo de um médio centro para o meio da defesa, criando o stopper, enquanto os dois médios ala flectiam no terreno, ficava desenhado um quadrado a meio campo que garantiria todo o equilíbrio da equipa, pelo que também chamaram ao sistema o “Quadrado Mágico de Chapman”. Passava-se a jogar em 3-2-2-3, a grande figura permanecia o avançado centro, mas pela primeira vez na história do futebol havia equilíbrio entre o número de defesas e avançados. O onze tornava-se um bloco mais coeso.”

Coesão, eis pois a questão e que todos os treinadores perseguem, sem desprezo por uma escolha critreriosa dos melhores jogadores (possíveis) para cumprirem as diferentes tarefas que são cometidas a uma equipa de futebol.

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