sábado, 14 de abril de 2012

As vontades não se moldam


A gesticulação descontrolada que Álvaro Pereira perpetrou quando verificou o seu número exibido na placa de substituições ao minuto 63 em Braga, fez-me trazer à ideia as muitas e calorosas discussões entre nós, adeptos portistas, sobre qual o modelo de gestão mais sustentável para a SAD nas épocas imediatamente seguintes onde se ganhou tudo o que havia para ganhar. Manter tudo ou renovar, é pois, um dilema eterno.

Um dos factores mais apontados pelo pesadelo vivido no “ano horribilis” de 2005, após a partida de Mourinho, foi o desbaratar de grande parte do plantel de sucesso, em especial os elementos que sustentaram as conquistas gloriosas de 2003 e 2004, deixando a equipa à mercê dos que não conseguiram bilhete de embarque, e seus baixos humores por verem a sua carreira e carteira não evoluir como os que se foram. Pressão sobre treinadores, as suas escolhas, indisciplina dentro do campo e fora dele, de tudo se viu ao longo desse período.

A inesperada partida de Villas-Boas no fim da época passada adensou as dúvidas sobre a ambição de Pinto da Costa em segurar o seu conjunto ganhador e, apesar de muita cobiça (e muitos escritos, também), salvou-se quase todo o recheio da casa, sucumbindo apenas Falcão após um negócio mais vistoso do que lucrativo pareceu ser. Entre todas as figuras proeminentes da equipa as declarações de interesse em sair não foram uniformes, mas constata-se que aqueles que mais ambicionavam e mais próximos estiveram de partir, são, simultaneamente, os que sofreram uma abrupta quebra no rendimento desportivo.



As portas de saída foram abertas a alguns elementos no passado mês de janeiro. Agora parece estar a ser mostrado o mesmo caminho a Rolando e Álvaro Pereira. Naturalmente, além da desmotivação refletida em campo, que não nos permite traduzir o número de pontos extraviados em campo – mas foram alguns, certamente - provavelmente haverá maior dificuldade da administração da SAD em vir a conseguir obter um encaixe financeiro desejado por estes atletas.

Um “produto” que era apelativo e com um potencial de retorno económico elevado, transformou-se desinteressante, tudo porque as aspirações dos jogadores, na sua ótica, não lhes foram atendidas. O nosso mercado é o que temos, curto, de imagem limitada e bolsa rota. Lá fora, aos jogadores lhes espera tudo isto em ponto grande. E não há volta dar, por mais prestígio que tenha e mais títulos que ganhe, o FC Porto estará umbilicalmente ligado à sua realidade. E se essa realidade tornar-se pequena para todos os que servem o clube, então melhor será indicar-lhes o seu caminho, antes que a sua ambição delapide a nossa.

5 comentários:

ℕℯℓsση ℳαcℎα∂σ disse...

Concordo com o post e acrescento que se calhar, para não se voltar a ver cenas como as que se têm visto esta época (Rolando, Alváro, Guarin, Cristian Rodriguez, Belluschi) seria caso de levar mais a sério a aposta na formação.

Acho que quem sente mesmo a camisola e quem sabe a importância do clube não se comportaria assim nunca. Mesmo que queiram sair ou que estejam aborrecidos com algo a nível interno, aqueles que crescem na casa que lhes dá oportunidade de chegarem ao mais alto patamar do futebol profissional, nunca têm coragem de mostrar em público a ingratidão. É uma questão de bom senso e lógica.

E seriam também estes quem deviam passar aos estrangeiros o valor e o sentimento que trespassa quem segue e trabalha para o FC Porto e nunca "gente de fora" que tem muitos anos de futebol mas que não cresceu com o sentimento do clube e que quando muito dirá coisas do género: "Não levanta onda não cara. O clube tem condições maravilhosas, a gente ganha bem prá caramba e se um dia tivé oportunidade tu vai gánhá mais dinheiro noutro clube noutro campeonato. Tenha cauma cara que tudo se resolve."

Quando o que deviam de ouvir era algo como: "Aqui dá-se litro pelo clube e pelos colegas e não pelo dinheiro. Aqui luta-se para se elevar ainda mais o nome do clube, dentro e fora de Portugal. Aqui, se tiveres sorte, coragem e ambição poderás, um dia, ver o teu nome associado à história deste clube. Só tens que dar o teu melhor em todos os jogos e se todos o fizermos, juntos havemos de ter um dia a oportunidade de ouvir as pessoas na rua gritarem pelo nosso nome. E gritarão porque nos apoiam e nos consideram merecedores desse apoio incondicional. E quando esse dia chegar vais ver que o dinheiro nunca te pagará a enorme alegria e satisfação que é a de teres milhares de pessoas a gritarem o teu nome e ver os sorrisos nas suas caras pela alegria que lhes proporcionaste".

Amphy disse...

Nelson Machado, curiosamente o único jogador que passou pelo FC Porto nos últimos anos que tinha potencial para dizer algumas das palavras por si escritas foi o Falcão e esse nem era português, nem era da formação. Era sim um excelente profissional com uma cultura e educação acima da média.

Em relação a este caso, não sei porque o Paulinho Santos não deu um "cachaço" (ou "calduço") ao Álvaro Pereira. Os próximos jogadores com os mesmos pensamentos pecaminosos ponderavam bem a próxima vez que um acto deste estilo lhes cruzasse a mente. Na sociedade em que vivemos estas princesas deviam ter vergonha de cuspir no prato que lhes dá de comer. Fartamente, entenda-se.

Duarte disse...

"constata-se que aqueles que mais ambicionavam e mais próximos estiveram de partir, são, simultaneamente, os que sofreram uma abrupta quebra no rendimento desportivo."

Esta teoria de culpabilização absoluta dos jogadores, para se fazer a desresponsabilização total do treinador tem apenas uma pequena (grande) pedra na engrenagem: Fernando.

Nelson Carvalho disse...

Caro Duarte,

Não é minha intenção fazer passar a mensagem com este artigo - nem sequer isso lá é induzido - uma desresponsabilização do treinador do que tem ocorrido ao longo da época.

Isto é apenas um explanar da minha visão da forma como no futuro se deverão tratar casos em que os jogadores manifestem vontade de sair. Por isso é que no artigo expus um padrão da situações identicas no passado, comparando-as com as mais recentes. Mas existem sempre excepções, como é o Fernando, que em concreto mencionou.

No que ao treinador diz respeito, diga-se, que considero elemento com responsabilidades relevantes em situações menos felizes que vivenciamos ao longo desta temporada, mas está longe de ser o único responsável. Porventura nem será o maior.

Mas definir quotas de responsabilidade é sempre dificil para quem observa de fora.

Duarte disse...

Nesse caso, peço desculpa por esta minha má interpretação, mas são raríssimas as vezes em que temos assistido a críticas abertas a Vítor Pereira nos posts colocados na blogoesfera azul e branca. Pelo contrário, devem ser mais as vezes em que é feita a sua defesa. Daí, talvez, este meu enviesamento interpretativo.

"está longe de ser o único responsável"

Concordo.

"Porventura nem será o maior"

Aqui já estou em total desacordo.