terça-feira, 17 de março de 2009

Mourinho e a Maldição de Béla Guttmann


Não tenho grande paciência para os eufemismos da moda “politicamente correcta”, devo dizer. Entre nós essa moda até o próprio futebol já impregnou, e quem ousar desafiá-la poderá até, conforme os casos, ser considerado um pária ou um traidor à pátria.

Na galeria dos intocáveis do discurso politicamente correcto futebolístico português destaca-se o inefável José Mourinho, o auto-denominado “Special One”, personagem que, especialmente nos media lisboetas, que o execravam quando treinava o F.C. Porto, chega a levar ao êxtase quem dele fala ou escreve. A cada intempestiva e agressiva (normalmente descrita pelo eufemismo “frontal”) declaração do homem – e são muitas em cada época futebolística – lá vêm os clichés dos basbaques: “Mourinho Igual a Si Próprio!”, “Mourinho Responde à Letra!” (esta última, então, é particularmente curiosa, pois é ele quem normalmente dá início às provocações).

A semana passada, vergado ao peso da eliminação (mais uma) da Liga dos Campeões, ei-lo que se sai com esta na conferência de imprensa pós-jogo: “Se ganhar o campeonato de Itália esse será o melhor prémio da minha carreira!” Ninguém obviamente acredita na sinceridade desse propósito. Muitos, pelo contrário, lerão nas suas palavras o eco da proverbial raposa de La Fontaine: “estão verdes, não prestam; só os cães as podem tragar!” Além disso, essa frase é uma bofetada nos adeptos do F.C. Porto, pois parece retirar o devido relevo ao triunfo na Liga dos Campeões em 2004, já para não falar nos do Chelsea, cujo clube não era campeão desde 1955 quando Mourinho lá chegou, e que decerto considerarão o título de campeão inglês de 2004/05 mais importante que aquele que o Inter provavelmente conquistará esta época em Itália.

Mas essa frase teve o condão de despertar em mim a recordação de uma “maldição” sobre ele lançada por alguns portistas após as suas fitas no termo da célebre Final de Gelsenkirchen, em que praticamente se recusou a participar nos festejos e na euforia geral. Esses portistas, entre os quais garbosamente me encontro, inspirando-se no mago Béla Guttmann, lançaram-lhe a seguinte praga: “Este gajo nunca mais ganhará a Liga dos Campeões, a não ser que algum dia regresse ao FC Porto” (coisa pouco provável). Convém aqui recordar que o célebre treinador austro-húngaro, cujo nome honra também a história do F.C.P., ao abandonar o cargo de técnico do Benfica, depois de lá ter ganho as duas Taças dos Campeões Europeus que se sabe, terá declarado: “Sem a minha pessoa estes gajos nem daqui a cem anos voltam a ser campeões europeus!”

E, de facto, ano após ano os percursos de José Mourinho na Liga dos Campeões estão a tornar-se um verdadeiro calvário. Este ano sucumbiu até bastante cedo, logo nos oitavos-de-final. Teve azar com o adversário – dirão alguns. Mas este argumento despreza o simples facto de que, se lhe saiu tamanho adversário, tal se deveu à pobre carreira do Inter na fase de grupos, onde teve de defrontar, além do Werder Bremen, os gigantes Panathinaikos e Anorthosis Famagusta. E na época passada foi despedido do Chelsea precisamente depois de um comprometedor empate em casa na fase de grupos contra o Rosenborg. Ironia das ironias, foi pela mão do sucessor de Mourinho, Avram Grant, que o Chelsea acabaria por atingir a Final de Moscovo, onde só perdeu por penalties. Estava escrito que a equipa não seria dirigida naquele jogo pelo “melhor treinador do mundo”, título frequentemente atribuído ao rabugento sadino pelos nada chauvinistas media portugueses.

Nesta altura levantam-se algumas dúvidas acerca da continuidade de “Mou” (como afectuosamente lhe chama a imprensa transalpina) à frente do Inter na próxima época. Uma coisa é certa: clube que pense em contratá-lo fará melhor em ler este artigo primeiro!

17 comentários:

Nuno Nunes disse...

A partir do dia 26 de Maio de 2004, quando esse senhor decidiu não festejar a vitória na final da Champions League, para mim (e para a maioria dos portistas, estou certo) transformou-se em persona non grata. Não nego as suas reconhecidas capacidades tecnico-tácticas e motivacionais fora do comum mas de resto, poucas ou nenhumas qualidades lhe reconheço. Em 2 anos e meio dentro do FC Porto não aprendeu a ser homem - caso muito raro.

Com essa fita depois da final ganhou o respeito de um país que se debatia com uma azia que queimava como carvão - o treinador que levou o clube ao topo da Europa saía e minimizava o feito alcançado, podia então começar o namoro com todo o país anti-portista. Um "vendido".

Depois começaram os ataques baixos ao clube que fez dele o que ele é hoje (note-se que Mourinho é um produto do FC Porto e não o contrário, como muito se quer fazer passar). Foram as bocas a dizer que ia ao Porto e levava seguranças porque quando ia a Palermo também levava, entre outras.

Ultimamente, no Inter, esta é já a 2ª vez em que tenta desprezar o FC Porto. A primeira foi na conferência de imprensa de antevisão ao jogo com o Manchester em que os jornalistas italianos o confrontaram com o facto de ter eliminado os Red Devils com o FC Porto em 2004. Mourinho respondeu que essa era a equipa dele, uma equipa de miúdos feita apenas por ele o que não acontece com o Inter actual. Mentira: Vitor Baía, Jorge Costa, Deco e Ricardo Carvalho não foram "feitos" por ele. Se calhar o seu problema actual é levar-se em tão grande conta e depois leva nas orelhas na Champions League nos últimos anos.

Sinceramente não o queria no FC Porto nunca mais, nem oferecido e pintado de azul e branco.

Anónimo disse...

E ainda há pouco tempo dizia a uma televisão inglesa que amava o Chelsea, que era adepto do clube e que torcia pelo seu sucesso. Isto é claramente mais uma desconsideração para com o FCP. Ele pode amar o Chelsea à vontade, mas não se percebe que não diga o mesmo do FCP. Só há uma explicação, de carácter freudiano: o gajo acha-se tão bom que não pode admitir o papel do FCP na sua subida ao galarim. Pata que o pôs!

Mestre Alves disse...

O que eu sei é que o menino pelo segundo ano consecutivo vai ver o FC Porto na Champions, no plasma lá de casa.

Ele melhor que ninguém sabe que deve ao nosso clube o que é hoje.

Também devo relembrar que na época em que foi despedido, Mourinho disse que no FC Porto tinha uma estrutura directiva que o apoiava incondicionalmente, e que jamais encontrará outro clube com tal característica.

dragao vila pouca disse...

Eu gostava do Mourinho, mas a minha grande desilusão acerca dele, começou antes, no dia em que o F.C.Porto que estava em estágio no Tivoli do Foco, se sagrou campeão nacional, com a derrota do Sporting em Leiria.
Nunca mais me esquece esse dia porque eu vinha do Hospital de S.António - por razões pessoais - e quando liguei o rádio do carro, estava a Antena 1 a entrevistar o Mourinho no Hotel e ele, num dia de festa, com os adeptos já na rua a festejarem o título, resolveu dizer que precisava de novos desafios, que tinha várias propostas, que o seu ciclo no F.C.Porto, tinha terminado, etc.
Para mim ele varreu ali e o Zé - quando ele era adjunto do Robson eu tratava-o assim - desiludiu-me completamente. Só tive pena de não ter tido a oportunidade de lho dizer pessoalmente.
Estas desilusões que ele está a ter, em clubes com um potencial económico, muito superior ao F.C.Porto e que lhe colocam nas mãos o que há de bom e de melhor, provam que ao contrário do que disseram alguns, foi o nosso clube que fez o Mourinho e não o Mourinho, que salvou o F.C.Porto de uma travessia de deserto, que já se vaticinava.
Com excepção da época seguinte - de transição - já vamos em três campeonatos e o quarto está bem encaminhado.

Um abraço

bLuE bOy disse...

"...essa frase é uma bofetada nos adeptos do F.C. Porto..."

No que a mim me toca, esse Senhor a mim não me dá bofetadas nenhumas, porque quem lhas dá, é o próprio FC Porto que continua a ganhar e a vencer, não precisando dele para nada... enquanto cá esteve, foi o maior... a partir do momento que resolveu sair do modo como saiu, meus caros, boa viagem, que fosse pela beirinha. Passou a ser um traidor e um cobarde... e desse rótulo, a mim, nunca mais escapará.

Posso dizer com orgulho tb que eu sou um daqueles que lhe lançou um mau olhado... estou para ver quantos mais anos passará ele a ver as finais europeias... no sofá, que é onde ele está bem.

Na própria Itália, já começam a ficar fartos deles... não tarda nada, um dia, vai ficar num beco qualquer a falart sozinho, pq ninguém o estará para aturar.

O efeito surpreso do que diziam ser um "special one", já era, já se foi, já se espumou... agora, é como os outros, ou seja, não é domingo todos os dias.

Domingo, domingo, era no FC Porto...

6012 - Azul desde 1971- disse...

Pois meus amigos clubisticos...eu tenho uma opinião diferente...eu gosto do Mourinho mesmo sabendo que ele não esteve, nem está, à altura do FCPorto. Mas não esqueçamos que o Porto teve umas épocas fantásticas com ele como treinador. E ele sabe que deve muito ao clube. Não o diz. Mas ele, sempre que adormece, deve contar os títulos ganhos e seguramente não conseguirá ultrapassar nunca a estatística azul e branca em igual período noutro clube qualquer. Ele sabe. Agora, não podemos exigir que um homem dê aquilo que nunca foi dele...humildade e reconhecimento! Talvez daqui a uns anos, já com a idade a pesar ele reconheça finalmente a mão que lhe deu de comer e peça perdão por tê-la mordido de forma tão pouco nobre. Mesmo assim continuo a pensar que gosto dele pois conduziu o clube numa saga de titãs da melhor forma e ...quase até ao fim! Foi ele quem perdeu por não se ter juntado aos festejos. Foi ele quem perdeu por ter dito as coisas que disse. Afinal, foi ele quem perdeu a amizade e o carinho dos melhores adeptos do mundo.E isso não há dinheiro que pague...

José Correia disse...

Eu não gosto do Mourinho-homem.

Eu admiro o Mourinho-treinador.

Eu recordo com nostalgia a super-equipa que o Mourinho montou no FC Porto, com base em alguns jogadores que já cá estavam, mais uns quantos contratados em 2002/03 na "loja dos 300".

HULK 11M disse...

E não se esqueçam que ele já deu a perceber algum arrependimento, quando, referindo-se ao facto de não ter ganho a "Intercontinental" declarou mais ou menos isto: Não volto a deixar aquela competição para outro treinador ganhar...
Espero que ele nunca mais venha a ter essa oportunidade... embora me sinta reconhecido pelo excelente trabalho que ele desenvolveu no FCP. Foram duas épocas e meia fantásticas...

Nuno Leal disse...

Por acaso também já tinha feito esta comparação na minha cabeça. Embora não lhe tivesse desejado o mesmo na altura. Mas sabe bem e cada vez melhor vê-lo sem maiks nenhuma liga dos campeões, para que nunca esqueça quem lhe deu a mão e o projectou no mundo. De resto, eternamente grato a ele e aos jogadores (ex-ninja e ex-postiga incluídos) por aqueles 2 anos e pouco fulminantes.

PABAR 76 disse...

José Mourinho tem uma necessidade muito grande em ser falado. Amado ou odiado o que lhe interessa é estar nas "bocas do mundo" talvez por falta de atenção que tenha tido em tempos idos. O Mourinho merece, por parte dos portistas, um desprezo em tudo idêntico ao que ele teve para com a conquista da Liga dos Campeões, que queira ou não minorizar, será sempre o título mais importante de clubes que terá no Curriculo. Não esqueço o bom trabalho que fez no F.C. Porto, mas também não esqueço, que teve um suporte directivo como nunca terá em clube algum. Nunca o achei um mestre da táctica achei sim, que ganhava os jogos psicológicos que são muito importantes para a confiança dos jogadores e para as vitórias dentro de campo. Hoje já muita gente conhece a "táctica" mental dele... e continuará cada vez mais a perder importância...
Acho que não é necessária nenhuma maldição... basta o desprezo que os resultados pouco serão vistos

Pedro Mota disse...

Ao ler até pensei que estava num Blog Benfiquista...Não podemos criticar o Mourinho ser engrato com o Porto,recorrendo nós próprios á ingratidão para com ele...Irei sempre admirar o Mourinho,e estar grato pelos bons anos de futebol e titulos que ele me proporcionou...E espero que ele tenha muito sucesso no exterior...Os Portugueses são de facto um povo muito invejoso...

Jorge Aragão disse...

A época Mourinho será inesquecível.
Foi épica...
O Homem saiu sentido ..
Será que não houve culpas de alguém nesse processo?
( embora isso não apague a cena lamentável na final. Estava chateado, dsfarçava e depois ia à vida dele.)
Mas serei sempre um admirador do Mourinho treinador.

Azulantas disse...

O problema é que onde há muito dinheiro a motivação é menor, a margem de manobra é muito menor, o "ego" dos jogadores é bastante superior, tudo ingredientes que "minam" o "modus operandi" de JM.

Vai ser campeão? Sim. Mas o Maldini também foi. O futebol das suas equipas é francamente desagradável ainda que muito eficiente.

Unknown disse...

Sempre e eternamente grato.

Desde que não colidam com os interesses do FCP, dá-me gozo que as equipas do Mourinho ganhem.

Mas é verdade, que em termos exibicionais tem sido sempre a descer, mesmo no FCP a época da Taça UEFA foi bem melhor que a da Liga dos Campeões.

Mefistófeles disse...

Que há algo mal resolvido entre Mourinho e o FCP ( ou alguém do FCP ), isso é por demais evidente.

Se bem que ache que Mourinho, ao FCP só tem que estar muito grato. E o FCP a Mourinho. Por isso, só pode haver qualquer coisa mal resolvida com alguém do FCP. O que não nos diz respeito.

Será que algum dia se saberá ? Não é importante, o FCP é centenário e todos nós, incluíndo Mourinho, difícilmente o seremos.

Os actos ficam com quem os pratica.

Desejo que um dia seja seleccionador.

João Perfeito disse...

Parece que o Mourinho já foi campeão europeu pelo Inter...

Esta maldição já está vencida por ele...

A do Guttman continua que é:

" Nem daqui a 100 anos um clube português vencerá duas Taças/ Ligas dos Campeões seguidas"

Anónimo disse...

Quem conta um conto acrescenta, sempre, um ponto.

"O Benfica não voltará a ganhar uma final europeia sem mim"

“Sem a minha pessoa estes gajos nem daqui a cem anos voltam a ser campeões europeus!”

" Nem daqui a 100 anos um clube português vencerá duas Taças/ Ligas dos Campeões seguidas"

As aspas e a superstição estão sempre presentes ao longo da narrativa; aliás sustentam-na. Já a realidade, coisa sem benevolência, tem uma mania de aparecer nos momentos mais inusitados de modo a fazer mossa aos contos do papão.