domingo, 5 de julho de 2009

Ei-los que partem



O defeso no FCP é sempre (para mim) um tempo de mágoa, porque sei que vamos deixar de ter alguns jogadores que já faziam parte da casa e que vão ser substituídos por outros tantos que não conhecemos nem sabemos se vamos gostar. Reconhecemos que o clube tem de negociar, infelizmente, os seus melhores jogadores, mas é minha convicção que um clube de futebol se fragiliza perdendo sistematicamente as suas referências, se não cuidar dos efeitos que pode produzir no grupo.

Há um núcleo de jogadores que gostava fosse mantido : obviamente Lucho faz parte desse grupo. Porém do léxico do futebol, há muito desapareceu o “amor à camisola” por parte dos jogadores, que as entidades patronais passaram a tratar como activos. Novos conceitos de marketing passaram a acolher o futebol como uma indústria, os clubes como marcas e o jogo como o produto que vendem. É o reforço da notoriedade da marca e do produto que apelam à formação de uma equipa competitiva e ganhadora, e que no caso do FCP só é possível conseguir através de um hábil jogo de vendas e compras que cirurgicamente temos levado a cabo nas últimas épocas, pois as receitas ordinárias estão longe de cobrir os custos de exploração que tendem a aumentar. A formação não forma e tem tido pouca serventia, salvo para os empréstimos a terceiros.

“Para comprovar a teoria, um jornal catalão realizou uma listagem com as principais vendas do FC Porto desde a saída de Jardel para o Galatasaray, em 2000. Desde então, os dragões facturaram um total de 289 milhões de euros apenas com as principais transferência (18, no total), tendo gasto apenas 43,5 milhões para adquirir esses mesmos jogadores. Ou seja, o clube registou um saldo positivo de 245,5 milhões de euros.”


O negócio é essa palavra mágica que legitima quase tudo, às vezes até algumas que se situam no limite da legalidade. E não é só no futebol. Ao interesse dos clubes, junta-se a dos jogadores e empresários e parece que não há perdedores neste ciclo que faz movimentar o mercado, porque no início de cada época todos parecem muito felizes e certos do futuro. Dirigentes, vendedores, compradores, intermediários e jogadores todos se apresentam de bem com a vida, salvo Bruno Alves pela voz de seu pai. Não há inocentes neste processo. Provavelmente nem pecadores. É o negócio e a lógica do mercado a funcionar, mais nada.

O FCP tem tido sucesso desportivo e opera bem no mercado. A sua política está caucionada pelo êxito. O resto são minudências. O dirigente não chora na hora de cumprir a sua missão, pois está certo que novos Luchos entrarão no Dragão para gáudio dos seus inúmeros adeptos. O ciclo completa-se sem dor e sem perdas. O grupo forma-se, transforma-se e continua a ganhar. O resto, é o folclore habitual que anima este período em que a bola não pincha. Haverá muitas conversas no café, alguns escritos nos blogs, enfim o ruído do costume que os homens com tarimba não estranham. Não tremem nem hesitam, por isso. A estratégia há muito estava traçada. As peças é que podem mudar em função da procura.


O ano passado, depois de alguma tremedeira, tudo se recompôs e fizemos a dobradinha. Os resultados sossegaram a malta e reforçaram a confiança. De tal forma, que hoje muitos acreditam que chegaremos ao penta e ao hexa.

As ondas de choque que estas mudanças provocam junto dos adeptos, têm sido ultrapassadas porque a politica do clube é assumida pelo Presidente que é merecedor de um grande crédito junto dos sócios e adeptos. Por outro lado é reconhecido que não há volta a dar. Temos que vender para continuar. A estrutura de custos do FCP assim o obriga. Não podemos de repente parar ou declarar um qualquer lay off e mandar às malvas uma série de contrapesos que temos por aí. E, muito menos, estamos em condições de repetir um prejuízo de 30 milhões para manter o plantel praticamente intocável.

A estratégia é a evolução na continuidade. A formação pode inverter o ciclo, mas vai demorar. Para o ano serão outros tantos a sair, e infelizmente serão os que mais se notabilizarem, pois são esses que têm mercado. Hulk na primeira linha se fizer a campanha que está ao seu alcance.


Não vale a pena chorar. Fica a saudade e a memória que tende a valorizar o melhor do passado. O FCP duas vezes campeão europeu, chegou ao cimo da montanha com equipas formadas maioritariamente por jogadores portugueses. Tem de ser esse o novo paradigma antes que o mercado nos vire as costas ou entre em forte retracção.

Vivamos o dia à dia, esperando ansiosamente que as anunciadas boas notícias sejam mesmo boas. Queremos acreditar. O futebol, a ilusão, os golos, os casos, as figuras, dão um pouco de sabor ao amargo vida. Tenho saudades de ver a bola a correr e de ir ao Dragão. O defeso é uma eternidade, que se preenche e alimenta de mexericos que dão um jeito do caraças nesta altura para nos desanuviar das tontices da vida.

Lucho ei-lo que parte, buscando a sorte noutras paragens . Outros muito provavelmente o seguirão. Nós por cá continuaremos bem. Haja golos !

5 comentários:

Nelson Carvalho disse...

Só mesmo o Mário Faria para conseguir expressar de forma tão plena por palavras os sentimentos que devem ser comuns à esmagadora maioria dos adeptos neste periodo do defeso.

Queria destacar o seguinte excerto do artigo, que me parece "terrivelmente" real, no futebol dos dias de hoje:
«Ao interesse dos clubes, junta-se a dos jogadores e empresários e parece que não há perdedores neste ciclo que faz movimentar o mercado, porque no início de cada época todos parecem muito felizes e certos do futuro. Dirigentes, vendedores, compradores, intermediários e jogadores todos se apresentam de bem com a vida, salvo Bruno Alves pela voz de seu pai. Não há inocentes neste processo. Provavelmente nem pecadores. É o negócio e a lógica do mercado a funcionar, mais nada.»

O futebol é paixão. A paixão dos adeptos e amantes da modalidade e dos seus clubes. E é a partir dessa paixão que Dirigentes, vendedores, compradores, intermediários e jogadores vão explorando as nossas "fraquezas" para levarem as suas vidas sumptuosas. Confesso que é algo que cada vez mais me causa urticária.

HULK 11M disse...

Se me permitem proponho para "reflexão do dia":
- Se a proximidade entre políticos e futebol é má, segundo Rui Rio, entre os mesmos e o automobilismo é boa?

Anónimo disse...

Isso é mesmo obsessão, ó Hulk!;-) Quem é que estava a falar do Rio?

Anónimo disse...

Mário,

O seu excelente artigo fez-me recordar um poema da grande poetisa galega Rosalia de Castro, recordada numa estátua na Praça da Galiza. Este poem, intitulado "Pra Habana!" descreve - e chora - a emigração galega e foi entre n´so popularizado numa balada de Adriano Correia de Oliveira.

Aqui fica:

"Este vaise i aquel vaise,
e todos, todos se van.
Galicia, sin homes quedas
que te poidan traballar.

Tés, en cambio, orfos e orfas
e campos de soledad,
e pais que non teñen fillos
e fillos que non tén pais.

E tés corazós que sufren
longas ausencias mortás,
viudas de vivos e mortos
que ninguén consolará."

Anónimo disse...

Para ouvir a balada:

http://www.youtube.com/watch?v=i5YkO1TY9xA