quarta-feira, 29 de abril de 2009

O próximo passo

Por Hugo Mocc


Aqui há umas semanas atrás escrevi sobre o assunto da Superliga Europeia, que para muitos é uma inevitabilidade e para outros tantos uma aberração. Agora que o FC Porto concluiu a sua participação na Liga dos Campeões, edição 2008-09, e tendo a Liga Sagres à sua mercê, apetece-me reflectir sobre a falta de competitividade interna que assola o nosso clube em Portugal e numa particular solução para esse problema.

Ao contrário do que muitos pensam, eu não considero a liga portuguesa muito inferior às suas congéneres Espanhola, Italiana, Francesa ou Alemã. Num momento da história do futebol em que os principais clubes Ingleses dominam por completo o topo da pirâmide por via das obscenas montanhas de dinheiro que as cadeias televisivas injectam na Premier League, poder-se-á afirmar que o restante das ligas europeias estarão de um modo geral, na vertente desportiva, mais próximas que nunca, Liga Portuguesa incluída.

Mas se dentre as 10 ligas de top na Europa - Inglaterra, Espanha, Itália, Alemanha, França, Rússia, Ucrânia, Holanda, Roménia, Portugal, (Turquia, Grécia, Escócia, vêm logo a seguir a Portugal – se observam claramente 2 escalões (top 5 e os restantes) isso deve-se muito claramente à importância dos montantes gerados pelas transmissões televisivas e não tanto à qualidade de futebol praticada bi-semanalmente nos relvados europeus.

Obviamente existem diferenças de estilo e, no geral, Portugal segue a escola italiana, que, ao longo dos anos, tem privilegiado o aspecto defensivo do jogo. Tenho para mim que qualquer equipa Espanhola ou Inglesa de topo teria imensas dificuldades para ser campeã em Portugal. E o mesmo se poderá dizer de qualquer equipa portuguesa nos campeonatos Inglês ou Espanhol. Não porque as equipas portuguesas sejam inferiores - embora por regra vivam com esse complexo - mas essencialmente pelas diferenças culturais do jogo nos diferentes campeonatos.


Sendo que a questão da Superliga Europeia se baseia num ideia de elitismo financeiro que pretende fechar os clubes europeus de top numa redoma impenetrável - ao estilo das ligas americanas NFL, NBA e NHL - a UEFA terá que defender os interesses do desporto em si, seja por via de integração - o actual modelo da Liga dos Campeões é o melhor exemplo desta estratégia de integração como resposta ao desejo dos clubes em formar a tal Superliga Europeia - ou por via da exclusão, repudiando futuras movimentações nesse sentido que levarão à secessão e provável formação de um novo futebol, autónomo da UEFA e da FIFA.

Pessoalmente não acredito muito na segunda hipótese, ainda que seja possível e, para muitos adeptos de clubes "menores", provavelmente desejável. Creio que a integração continuará a evoluir, mas em que moldes?

Desde 2007 que se têm ventilado rumores acerca de uma possível amalgamação das várias ligas nos Balcãs, sendo Michel Platini, aparentemente, um dos promotores da ideia. Similarmente, não é nova a ideia de integrar os dois maiores clubes da Escócia na Premiership inglesa, tal como não é nova a vontade de Russos e Ucranianos fundirem os seus campeonatos. Tendo dois campeonatos europeus sido organizados em conjunto por duas nações com relativo sucesso, e com a experiência adquirida com a fusão dos campeonatos alemães (Este e Oeste), tenho para mim que antes de uma qualquer Superliga Europeia, iremos assistir a integração regional de diversas ligas nacionais.

Assim, a médio e longo prazo, a UEFA garantirá a sobrevivência do desporto ao mesmo tempo que garante viabilidade financeira e competitividade para os clubes de topo. Creio que o próximo passo poderá ser dado em breve (dentro de 5-10 anos) com os clubes de top de ligas secundárias como a Portuguesa, Escocesa ou Grega a serem incorporados nas ligas Espanhola, inglesa e italianas, respectivamente. Isto sendo apenas o estágio anterior a uma integração completa das respectivas ligas profissionais.

Não me admirarei muito se por volta de 2025 houverem cerca de 10 ligas profissionais regionais na Europa - Ibérica, Escandinava, Britânica, Franco-Belga, Germânica, Boémia, Balcânica, Leste Europeu, Russo-Ucrâniana e Mediterrânica - e apenas uma competição Europeia transversal a todas elas.

Para o FC Porto e demais clubes portugueses isto seria a estocada final no moribundo "sistema" politiqueiro do futebol "tuga" que apesar de nos fazer campeões todos os anos, nos continua a limitar em termos da competitividade e oportunidades de crescimento que (não) nos proporciona.

Eu penso que nós, FC Porto, estaríamos à altura de um novo e maior desafio, mas enquanto que, por exemplo, Rangers e Celtic aparentemente aceitariam integrar uma sub-divisão da Premiership numa primeira instância, não creio que nós nos contentássemos com menos do que um lugar na mesma tabela do Barcelona e do Real Madrid. O desafio seria enorme e a competitividade faria de nós um clube muito mais forte, mas estaríamos nós prontos para deixar de sermos campeões recorrentes para sermos apenas “outsiders”? Seria este um passo atrás na evolução e na história do nosso grandioso clube?

Num momento em que o balão competitivo esvaziou com a saída da Liga dos Campeões, a quase certa revalidação do título e a presença na final do Jamor, com mais ou menos lesões, o FC Porto é, por falta de competição à altura, o seu pior inimigo. A complacência instala-se e a equipa baixa os braços e joga apenas para cumprir calendário.

Com uma competição regional, manter-se-ia a identidade local dos clubes, manter-se-iam os "derbies" locais, aumentariam os "clássicos", ao mesmo tempo que se aumentavam os índices competitivos para todos os clubes. Ter-se-ia que ajustar o sistema de subidas e descidas de divisão, criando dois ou três escalões de futebol profissional, sendo o mais baixo dividido por sub-regiões (Andaluzia, Catalunha, Galiza e País Basco, Portugal, etc.). O calendário seria competitivo até ao fim e haveria um significativo aumento de verbas para os clubes portugueses graças a maiores receitas provenientes dos direitos das transmissões televisivas dos jogos e de toda a publicidade associada.

A meu ver os benefícios são claramente superiores aos custos, quer em relação a manter o actual figurino, quer em relação a avançar para um esquema americanizado de Superliga Europeia. Numa altura em que o Benfica pensa no assunto pelos motivos mais errados, o FC Porto deve também reflectir se isto é algo que lhe interessa. É que politiquices à parte, cada vez menos os clubes profissionais portugueses conseguirão competir a sério, isto é, para ganhar, com os seus equivalentes Europeus se a situação actual se mantiver.

14 comentários:

José Rodrigues disse...

Da mesma forma que os numerosos clubes escoceses (para alem de Rangers e Celtic) nunca aceitarao um tal modelo por ser a sua "morte", da mesma forma os clubes portugueses (para alem daqueles q integrariam o topo da Liga Iberica) nunca aceitarao tal proposta. E sem o "buy in" dos clubes da Liga e da FPF (q por sua vez depende dos clubes em geral), isso nunca irá acontecer.

Sendo assim penso que é escusado alimentar tais cenarios utópicos e irrealizáveis, sinceramente, mesmo que seja um exercício teórico interessante.

Rui disse...

Não gosto muito da ideia de fazer uma liga com os maiores clubes europeus, penso que só teria vantagens a nivel financeiro.

De resto ia matar todos os clubes médios e pequenos, que deixavam de ter um espaço para competir, o que a longo prazo, seria a morte do futebol.

Azulantas disse...

Caro José Rodrigues,

É tudo uma questão de preço. Se o preço for o certo, os clubes, ligas e federações entram na jogada. Seja na Escócia ou em Portugal.

A ideia da irredutibilidade da tradição cairá por terra quando o futebol profissional tiver que decidir se quer ir à falência ou se quer romper com o modelo actual (tradicional) para sobreviver. Foi assim com o aparecimentos das SAD.

Alimentar cenários utópicos é pensar que as coisas serão sempre como são agora.

Tal como o Porto já se está a precaver para a provável instituição da regra dos 6+5, havendo movimentações no sentido da viabilização da Superliga Europeia, não vejo em que seja utópico e irrealizavel pensar em alternativas que viabilizem o nívelamento das competições sem fechar os competidores numa rodoma sem subidas e despromoções (NBA), mesmo que isto venha apenas a acontecer num futuro ainda muito distante (20-30 anos)

Daniel Teixeira disse...

Off topic

Recentemente recebi esta foto no email que desconhecia....simplesmente inacreditável...

http://i43.tinypic.com/e8sx2e.jpg

HULK 11M disse...

Quanto a esta foto aqui deixada pelo "Daniel" realço a atenção para a vergonha na cara demonstrada pelas duas pessoas que acompanham o presidente do slb, em flagrante contraste com o ar feliz deste...
Se fosse o nosso PdC a ter um tal gesto, com os cachecóis que, infelizmente, também temos, de certeza que a imagem iria abrir telejornais e alimentar 1a. páginas...

Luís Carvalho disse...

Hugo,

Em Portugal, nem sequer se conseguiu fundir os 3 clubes da Madeira num só, quanto mais um dia nos juntarmos (todos?) à liga espanhola...

Repara que na Madeira, os adeptos do União (que serão uma dúzia e meia, como se sabe) preferiram mergulhar para sempre no anonimato de uma divisão secundária, a lutar por lugares de topo no escalão principal (e que orçamento gigante esta fusão a 3 traria!).

E já nem falo em Gaia e Gondomar, que deveriam ter apenas um clube, mas que preferem andar a brincar aos "derbies" locais que nem a meia-dúzia de carolas interessam...

Muito longo caminho a percorrer até chegarmos a essas coisas todas, Hugo...

Azulantas disse...

Luis,

Concordo contigo, e isto não é coisa para acontecer nem amanhã, nem daqui a 5 anos.

Também não é caso para dizer que o campeonato Português tem de ser abolido. Apenas se tem de encontrar um formato que nivele a competição.

No caso Escocês (Celtic e Rangers integrarem a Premier League) as opiniões estão divididas entre se é bom porque sem eles a competição passa a ser mais nivelada ou se é bom por ambos clubes vão para uma competição mais em linha com a sua própria dimensão.

Eu bem sei que as mentalidades são diferentes, mas não creio que sejam tão diferentes assim.

Haverá sempre lugar para os clubes de bairro e para os derbies locais, mas importa pensar se o futebol local ganha alguma coisa com crónicos vencedores ou se é preferível estender a competitividade de cada prova ao nívelar os participantes.

A Uefa poderá mesmo intervir nesse sentido, pois neste momento o domínio dos clubes Britânicos na Champions parece inabalável, ao contrário do que aconteceu com os domínios Espanhol e Italiano que o precederam.

Quanto à questão dos clubes Madeirenses, é perfeitamente legítima. Nenhum clube pode ser forçado a fundir-se com outro. A acontecer, uma fusão tem que partir da vontade de ambos os clubes.

Da mesma forma, a decisão de participação numa competição é sempre do clube. Mesmo que um dia venha a existir a Superliga Europeia, o FC Porto estará sempre no seu direito de recusar-se a participar nela, escolhendo manter-se na competição nacional.

Paulo Marques disse...

A ideia da irredutibilidade da tradição cairá por terra quando o futebol profissional tiver que decidir se quer ir à falência ou se quer romper com o modelo actual (tradicional) para sobreviver. Foi assim com o aparecimentos das SAD.Há uma solução muito mais simples, deixar de pagar balúrdios a toda a gente.

José Rodrigues disse...

"É tudo uma questão de preço. Se o preço for o certo, os clubes, ligas e federações entram na jogada."

Mas que preço?? Quem fica de fora (isto é, no - agora - secundário campeonato português) só fica a perder.

Já hoje têm os estádios às moscas, imaginem se não receberem os grandes; as TVs passavam a oferecer para aí 10% do que oferecem hoje pelas transmissões; e aí por diante com as restantes receitas.

Ora se já hoje os clubes andam com a corda na garganta, com esta medida das duas, uma: ou iam à falência, ou passavam a ter orçamentos de clube amador (com tudo o q isso implica para o espectáculo e para a sua competitividade perante os "ricos").

O dinheiro extra eventualmente "re-encaminhado" pelos FCP, SCP e SLBs para a FPF e para os restantes clubes tugas como "compensação" NUNCA na vida seria o suficiente para compensar essas perdas.

Sendo assim, arrisco afirmar que esse cenário nunca terá lugar pelo menos por 50 anos (para não dizer 100).

Já o cenário de uma única Superliga Europeia, parecendo-me também como sendo muito pouco provável, é bastante mais provável do q uma Liga Ibérica.

Azulantas disse...

Nightwish disse...
"(...) Há uma solução muito mais simples, deixar de pagar balúrdios a toda a gente."

De acordo. Mas quem é que vai nessa cantiga?

Azulantas disse...

José Rodrigues disse...
"(...) Mas que preço?? Quem fica de fora (isto é, no - agora - secundário campeonato português) só fica a perder.

Já hoje têm os estádios às moscas, imaginem se não receberem os grandes; as TVs passavam a oferecer para aí 10% do que oferecem hoje pelas transmissões; e aí por diante com as restantes receitas. (...)"

Compreendo a apreensão, mas eu penso de maneira diferente. Sem os 3 grandes o campeonato fica bastante mais competitivo, com vários clubes a poderem competir pelo título.

Ora isto, na minha perspectiva, leva a 2 coisas: (1) mais interesse pelo futebol e, se as coisas forem bem feitas, mais gente nos estádios a apoiar o clube da sua terra; (2) manutenção do interesse nas transmissões televisivas, agora com um espectáculo mais imprevisivel.

Mais a mais, mantendo a possibilidade de promoções e despromoções, seria muito mais fácil a um Guimarães, Marítimo ou Belenenses participarem numa hipotética Liga Ibérica do que numa Superliga Europeia.

O preço, esse teria de ser acordado à partida e teria de precaver a perda de receitas dos clubes que jogam com os 3 grandes regularmente (Liga Sagres) por um periodo de 2 - 3 anos. A partir daí cada clube teria de se adaptar e lutar pelos seus objectivos da melhor maneira que pode e sabe. E os 3 grandes ainda poderiam participar na Taça de Portugal.

Anónimo disse...

Gostei do artigo, mas perdoem-me um desabafo: Liga Ibérica??? Pata que pôs os espanhóis. Proporia uma Liga com os principais clubes portugueses, galegos e bascos. Já era interessante e evitar-se-ia o simbolismo da "iberização" do futebol português. Já basta o que se vê noutros campos, às claras ou nem tanto.

José Correia disse...

«O principal accionista e membro do conselho de administração do Celtic, Dermot Desmond, afirmou que a inclusão da equipa na Premier League inglesa é "inevitável" e deverá ser uma realidade "nos próximos dez anos". O milionário de origem irlandesa acrescentou que a entrada do Celtic e do Rangers beneficiará a liga inglesa em termos de receitas televisivas. "Além disso, o Celtic tem a vantagem de ser um clube sem passivo. Somos provavelmente um dos clubes mais independentes em todo o Reino Unido e Irlanda. Nos próximos meses, dez ou 11 clubes serão declarados insolventes - e não me surpreenderia se três ou quatro deles forem da Premiership", disse Desmond durante uma entrevista à rádio local Newstalk. A recente edição da "Sunday Times Rich List" coloca o patrão do Celtic no quarto lugar do ranking dos mais ricos da Irlanda, com uma fortuna avaliada em 1600 milhões de euros.»
in O JOGO, 01/05/2009

Azulantas disse...

Segundo uma notícia publicada no jornal inglês The Guardian, os clubes da Série A em Itália decidiram em quase unaninidade criar uma Liga independente da Série B, numa tentativa de copiar o modelo da Premier League Inglesa.

Os clubes primodivisionários em Itália estavam fartos da dependência dos clubes secundários para tomarem decisões importantes ao nível financeiro.

http://www.guardian.co.uk/football/2009/apr/30/serie-a-b-european-football-italy