segunda-feira, 13 de abril de 2009

O Sistema ao longo dos anos

1996, Os fundos do futebol português

«Paulo Autuori, treinador do Benfica, sentenciou anteontem à noite – investido da aura e do par de asas a que a circunstância aconselhava – que o futebol português bateu no fundo do poço. Como metáfora, é banal. Como verdade, é das que todas as semanas se repetem. (...)
Se algo houve no jogo de anteontem que possa sustentar as palavras de Autuori foi o modo vergonhoso como os jogadores do Benfica reagiram a uma decisão – justa – do árbitro. Um grande clube como o Benfica não pode ver-se arrastado na lama por quem, ao menos pelo ordenado que ganha, devia envergar-lhe com dignidade os símbolos. Não foi, por isso, o futebol português que bateu no fundo: foi o Benfica.»
Jorge Marmelo, PUBLICO, 06/11/1996


1999, O poder das Associações

«Falava-se do “sistema”. E o que era, esse tal “sistema”?
O poder, no futebol, era repartido pelas Associações. A Associação de Futebol do Porto era a mais forte; e, aliada a mais uma ou duas, tinha maioria, mandava, ou então, como dizia, empante, o seu presidente, “dava chitos”. Escolhia o homem da arbitragem da Federação, se possível o da Disciplina e – dizia-se – o FC Porto ganhava com isto.
Forma de acabar com o “sistema”?
Óbvio, explicavam: acabar com o poder das Associações, da Associação do Porto em particular; criar uma Liga onde cada clube tivesse um voto (ao contrário das Associações, que tinham votos em função do número de clubes que representavam nos diversos escalões, e daí a força da Associação do Porto); fazer a Arbitragem avançar até ao sorteio dos árbitros; e, de preferência, não ter ninguém do FC Porto nos órgãos dirigentes da dita Liga. Assim, continuavam a explicar, o sistema ruiria, os portistas perderiam o poder que tinham e começariam inevitavelmente a perder, também, os campeonatos.
Como se viu: a Associação do Porto foi como se tivesse acabado; a Liga onde o FC Porto tem um voto como todos os outros clubes, e onde a presidência do Executivo, da Arbitragem e da Disciplina não lhe pertencem; fez-se o sorteio dos árbitros também; Pinto da Costa avançou até para a fórmula que, para muitos, ia matar o seu clube (porque ia matar o espírito clubista), e refiro-me obviamente à SAD; o “sistema” pois morreu; só que as vitórias no campeonato continuaram a empilhar-se nas Antas até ao “penta”, o que estranhamente não impede contudo que gente como o presidente do Benfica continue a dizer a este respeito os maiores disparates como se dissesse coisas sérias, invertendo completamente o aforismo segundo o qual contra factos não há argumentos. Porque, para essa gente, pelo visto, contra argumentos (os seus) é que pode não haver factos...
Um discurso virtual, e que no entanto ainda há quem adira!»
António Tavares Telles, Record, 01/06/1999


2004, Dias da Cunha e os moinhos de vento

«O principal problema da argumentação de Dias da Cunha – que até pode ter razão em algumas coisas – é que mete as contrariedades todas no mesmo saco, desvalorizando os assuntos sérios por oposição aos moinhos de vento. Perdeu-se um jogo? É o sistema! Os adeptos não compreendem a política desportiva? É o sistema! O FC Porto e o Benfica dominam o mercado português? É porque são do sistema! A SAD sportinguista foi forçada a reduzir o capital social e a desvalorizar as acções? Deve ser porque deixou de ser do sistema e, com isso, deixou de ganhar.»
António Tadeia, Record, 01/06/2004


2009, A Cigarra e a Formiga

«(...) Os processos Apito Dourado e Apito Final decorrem já há quase 4 anos, o que tem colocado os árbitros sobre grande pressão e o futebol em permanente vigilância até das autoridades judiciais.
E o que tem acontecido?
O FC Porto continua a ganhar o campeonato todos os anos.
Então a quem serve o sistema?
É claro que, para quem perde, o sistema é uma desculpa fantástica.

No ano em que o Luís Filipe Vieira dizia que o Benfica tinha o melhor plantel dos últimos 10 anos e que nem queria ser treinador do Benfica pois este deveria ter problemas em dormir para formar a equipa, tal era a qualidade dos jogadores, o que é aconteceu?
Esse treinador que devia ter problemas de sono foi despedido no final da 1ª jornada.
Depois veio o amigo Camacho, com quem Luís Filipe Vieira tinha passado essas férias de verão, tendo a época acabado com Chalana à frente da equipa, pois Camacho, quando se apercebeu que tinha um jogador no plantel que na prática já era seu chefe, achou que já era palhaçada a mais e foi-se embora.


E qual foi o resultado de tudo isso? O Benfica ficou em 4º lugar, a 23 pontos do Porto, e fora da Liga dos Campeões.
E o que fez o Benfica?
O habitual.
Queixou-se muito do sistema. Chegou até a ir para a UEFA apresentar queixa contra o FC Porto e tentar conseguir na secretaria o que não conseguiu em campo.

E este ano o Benfica vai pelo mesmo caminho.
O Benfica já vai em 3º lugar, o que a suceder nos deixará, de novo, fora da Liga dos Campeões. Para além disso, o Benfica teve uma presença triste na Taça UEFA e foi eliminado muito cedo da Taça de Portugal.
No entanto, como colocou Rui Costa como Director Desportivo, Luís Filipe Vieira pensa que pode lavar as mãos de toda a responsabilidade como qualquer Pilatos.
Para além disso, Luís Filipe Vieira tem ainda o sistema como desculpa.
De facto, o sistema serve principalmente para branquear a gestão desportiva catastrófica e desastrosa que existe há muitos anos no Benfica. (...)

Deixem-me que vos diga, eu acredito não apenas num sistema, mas em dois.
Parece-me claro que no futebol português existem 2 sistemas: há o “Sistema da Cigarra” e o “Sistema da Formiga”.

No “Sistema da Cigarra” canta-se demasiado em Agosto e chora-se muito em Maio.
No “Sistema da Cigarra” promete-se muito, vendem-se todas as ilusões, mas trabalha-se pouco, não se planeia, está tudo mal organizado e depois, é claro que os resultados não aparecem.
No “Sistema da Cigarra” compram-se jogadores pelos nomes, mesmo que estejam numa fase descendente da carreira há já muito tempo.
No “Sistema da Cigarra” os jogadores chegam em jactos privados, em ambiente de grande festa, e dão logo muitas entrevistas fazendo elogios pouco credíveis ao clube que os contratou.
No “Sistema da Cigarra” apresentam-se dois “números 10” na mesma época como se isso fosse normal.
No “Sistema da Cigarra” pagam-se salários incomportáveis aos jogadores e depois nada se lhes exige.
No “Sistema da Cigarra” nenhum treinador serve porque ninguém é solidário.
No “Sistema da Cigarra” há muita gente vaidosa, que gosta muito de aparecer e falar.
No “Sistema da Cigarra”, os Directores de Comunicação tendem a dar muitas entrevistas e a falar muito, quando o seu papel seria fazer com que a mensagem dos verdadeiros protagonistas passasse correctamente na comunicação social.
Mas nos clubes que adoptam o “Sistema da Cigarra” falam todos.
Vice-Presidentes são comentadores desportivos, Directores de Comunicação são estrelas mediáticas e Assessores Jurídicos são apresentadores de televisão.
O “Sistema da Cigarra” é muito alegre e colorido, só tem um problema: é que com ele não se ganha nada.

Depois há outro sistema: o “Sistema da Formiga”.
No “Sistema da Formiga” fala-se pouco e trabalha-se muito.
No “Sistema da Formiga” está tudo milimetricamente organizado, as coisas são pensadas e está tudo bem planificado.
No “Sistema da Formiga” compram-se os jogadores que são necessários para as posições em que foram detectadas necessidades.
No “Sistema da Formiga” descobrem-se jogadores que tanto podem estar a jogar num clube do nosso País como pode estar a jogar num qualquer clube japonês.
No “Sistema da Formiga” não se compram jogadores pelos seus nomes famosos que depois são incapazes de se entregarem de alma e coração aos jogos.
No “Sistema da Formiga” são preferidos jogadores jovens cheios de vontade e talento que depois podem ser vendidos com grandes proveitos.
No “Sistema da Formiga” os jogadores chegam de forma discreta ao clube que os contratou, não dão entrevistas e são protegidos até se sentiram integrados na nova equipa.
No “Sistema da Formiga”, os Directores de Comunicação não são protagonistas nem falam à comunicação social.
No “Sistema da Formiga” os Vice-Presidentes não são comentadores desportivos nem os Assessores de Comunicação apresentam programas de televisão.
O “Sistema da Formiga” não está pensado para promover pessoas ou vaidades, mas sim para ganhar títulos.
No “Sistema da Formiga” os foguetes não são lançados em Agosto, mas sim lá para Maio.

Agora, peço apenas que façam um pequeno exercício: atribuam um nome de um clube português que pensem que se identifique com o “Sistema da Cigarra” e façam o mesmo relativamente ao “Sistema da Formiga”.
Infelizmente, não deve ter sido um exercício difícil.
Confesso que acho triste a facilidade com que seguramente acertaram porque demonstra bem onde as coisas chegaram.»

Bruno Carvalho, Director do ‘Porto Canal’, pré-candidato à presidência do SLB
in blog 'Novo Benfica', 26/03/2009

3 comentários:

condor disse...

Este Bruno Carvalho se dependesse de mim nunca seria presidente do glorigoso!
O homem tem uma visão completamente distorcida daquilo que é a realidade do futebol cá do burgo!
Vem com balelas do sistema da cigarra!do sistema da formiga!
Um colete de forças para este pseudo
benfiquista!
O que vale é que eu tenho a certeza de que os verdadeiros benfiquistas vão estar atentos e impedir a eleição deste lacaio de Pinto da Costa,que quer infiltrá-lo no glorigoso para assim começar a destruir o clube de dentro para fora!Ele é cada mentcapto!!!

José Correia disse...

Estou de acordo.
Se dependesse de mim e, estou certo, da esmagadora maioria dos portistas, o Bruno Carvalho, quanto muito, será acessor do Director de Comunicação do SLB...

Já que o Vale e Azevedo anda fugido, que o LFV continue por lá muitos e bons anos...

Anónimo disse...

Autor
José Mário Silva

Gostava de começar por esclarecer uma coisa: eu tenho perfeita noção
dos riscos que corro por ter escolhido o título que acima podem ler.
Se me encontrarem pendurado num candeeiro (lá para os lados da nova
«Catedral») ou no fundo do Tejo, com um tijolo de cimento atado aos
pés, não se admirem. Há heresias que se pagam caro. E no nosso país a
heresia maior é dizer mal do Benfica. Uma pessoa pode vociferar contra
o primeiro-ministro, contra a Justiça, contra a renda de bilros,
contra os Jerónimos, contra o Papa, contra o Inverno, contra o
«sistema» ou contra o Camões, mas contra o Benfica é que não. O
Benfica é sagrado, é intocável é o verdadeiro tabu colectivo. Como
ouvi certa vez um taxista: «O SLB não é um clube, o SLB é Portugal».
Ora o problema reside precisamente aqui, nesta confusão espúria.
Portugal não é, felizmente, o Benfica. Porque se fosse, estaria ainda
pior do que está. Querem um exemplo:

As eleições para a presidência do clube, marcadas para ontem (31 de
Outubro) e cujo desenlace ainda ignoro no momento em que escrevo esta
prosa. Aliás, o resultado é irrelevante, porque de há muitos anos a
esta parte que a escolha do líder benfiquista se faz entre os
candidatos muito maus e os candidatos ainda piores. Desde construtores
civis especializados em negócios obscuros e declarações de IRS
fraudulentas, até demagogos baratos, vendedores de banha da cobra e
vigaristas com a PJ à perna, tem havido de tudo. O primeiro sinal da
decadência do Benfica é este: há décadas que não passa por ali uma
direcção com pés e cabeça, com uma estratégia coerente e um projecto
para o futuro. E o mais cruel é que tão depressa não passará, porque o
Benfica vive na urgência de recuperar a grandeza perdida e a urgência
é inimiga da lucidez.

Assim se explicam os grandes equívocos da «pátria benfiquista». Para
começar, os mitos. A velha história dos seis milhões de adeptos, por
exemplo, um manifesto exagero que se tornou uma verdade supostamente
consensual, mesmo sem base científica que a sustente. A megalomania
estende-se depois a todos os aspectos da vida do clube. O estádio
nunca pode ser só um estádio - tem que ser uma «catedral». O clube
nunca é bom ou excelente – é «Glorioso». E a equipa não joga futebol
de ataque – joga «à Benfica». A figura de estilo preferida na Luz, da
tribuna VIP ao Terceiro Anel, sempre foi (e há-de continuar a ser) a
hipérbole.

A culpa, no fundo, é de uma equipa que fez miséria por essa Europa
fora nos idos de 60. A culpa é de Eusébio, Coluna e companhia. Porque
no imaginário dos adeptos, mesmo aqueles que nasceram muitos anos
depois, o Benfica é um colosso que só pode aspirar à glória. A
tragédia benfiquista resume-se a esta cegueira, à incapacidade de ver
que os tempos mudaram, que não houve outro Eusébio e que o SLB tem que
se resignar, como as restantes equipas portuguesas, a uma sofrível
mediania. O principal adversário do Benfica não é o Futebol Clube do
Porto ou o Sporting: é a sua história. Os triunfos passados a pesarem
cada vez mais sobre os fracassos recentes. Se continuarem o jejum, de
campeonatos, como é previsível, os benfiquistas estão condenados à
nostalgia e ao sebastianismo. Nada disto seria particularmente grave
se não se atribuísse ao Benfica um desmesurado peso mediático, sem
correspondência com a sua verdadeira importância. Outros clubes também
recebem uma atenção excessiva, admito, mas nada que se compare à
omnipresença do Benfica na vida pública do país). Excluindo o trabalho
com os jovens e as modalidades amadoras, o que é que faz o Benfica de
tão extraordinário para merecer rios de tinta na imprensa e horas de
emissão nos canais televisivos? Para que é que serve, afinal, o SLB?
Chegámos, parece-me, ao busílis da questão. O SLB não serve para nada
– ou serve para muito pouco. O que o salva é a sua condição de totem:
um referente identitário que convém ao poder instituído (veja-se o
tratamento de favor que lhe prestam os governos e mesmo a inflexível
ministra Ferreira Leite). Já convinha a Salazar, continua a fazer
jeito em democracia. Quando as crises apertam, o Benfica alegra,
unifica ou angustia o povo, mas sobretudo distrai-o. Enquanto se
entretém nas ruidosas Assembleias Gerais, ou nas romarias aos
estádios com a parafernália vermelha e branca, ou no folclore das
Casas regionais, ou nos cíclicos entusiasmos como os novos craques e
as sucessivas «equipas maravilha», ou na euforia de uma inesperada
vitória, o povo não pensa na crise económica, no desemprego, na retoma
que nunca mais chega, nos salários cada vez mais curtos e nas
insuficiências todas de que o país padece. Mais do que o televisão ou
a igreja, o verdadeiro «ópio do povo» é o Benfica – uma certeza que se
reforça, sobremaneira, se tivermos presente a mui singela referencia
às «papoilas saltitantes», no hino cantado por Luís Piçarra…

Por muito que esta evidência magoe os benfiquistas, a relação
preço-beneficio do SLB não compensa. Custa-nos os olhos da cara – em
milhões de euros gastos em infra-estruturas exageradas ou em impostos
que ficaram por cobrar – e dá pouquíssimo em troca. A verdade é que
não precisamos dele. Lembram-se daqueles adeptos que nos debates
televisivos disparam a frase assassina: «Se o Benfica acabasse, havia
uma revolução neste país»? Também por isso, acho que já era tempo de o
Benfica deixar de existir.