sábado, 22 de agosto de 2009

Uma equação de resolução complicada


O treinador do FC Porto enfrenta nesta altura uma equação de resolução complicada. Os problemas são muitos, o tempo para construir uma equipa com diversos jogadores novos é pouco e, como habitualmente, a paciência dos adeptos portistas é nenhuma.

Quais são então os principais problemas?

1) A saída da melhor dupla argentina que passou pelo futebol português

Para além da qualidade individual que possuem, o nível de entendimento entre Lucho e Lisandro era tal que já quase jogavam de olhos fechados o que, claramente, tornava esta dupla argentina mais do que a soma das partes. Além disso, faziam parte da coluna vertebral da equipa, são jogadores que privilegiam o colectivo e, entre golos e assistências, o seu papel foi sempre absolutamente determinante. Na minha opinião, constituíram o esteio fundamental onde o tetra foi alicerçado.

Por tudo isto, por maior que seja a capacidade do treinador e por melhor que sejam as adaptações dos novos jogadores, quanto tempo será necessário para os novos jogadores atingirem a mecanização e eficácia que existia na dupla Lucho-Lisandro (se é que algum dia isso vai acontecer)?


2) O substituto do Lucho e o modelo de jogo

Fernando Belluschi foi contratado e apresentado (pela comunicação social) como sendo o substituto do Lucho. Ora, por aquilo que já vi, tenho muitas dúvidas que algum dia possa vir a sê-lo. Não porque Belluschi tenha falta de qualidade (no pouco tempo que cá está já mostrou pormenores muito interessantes), mas porque não tem o físico do Lucho (mede menos 16 cm!), não cobre a mesma amplitude de relvado que el comandante e, sem bola, falta-lhe a intensidade e agressividade competitiva do ex-capitão.

Além disto, parece-me que Belluschi é muito mais um número 10 do que um número 8 e, até por ser um jogador que remata bastante bem, a posição ideal para ele seria o vértice mais adiantado de um losango no meio campo, jogando mais perto dos avançados e da área contrária. O problema é que o FC Porto tem um plantel pensado e estruturado para jogar em 4-3-3..., ou será que este ano iremos ter um modelo alternativo?


3) Revoluções sucessivas no plantel

Tal como na época passada, o plantel azul-e-branco voltou a sofrer uma profunda alteração, tendo sido contratada uma equipa completa:
Beto, Miguel Lopes, Nuno André Coelho, Maicon, Álvaro Pereira, Prediger, Valeri, Belluschi, Varela, Orlando Sá e Falcao.

Ora, se somarmos a estas mudanças as entradas de há um ano atrás, verificamos que apenas cinco jogadores de campo - Fucile, Bruno Alves, Raul Meireles, Mariano e Farias - têm mais do que um ano de casa e só os três primeiros são titulares indiscutíveis.
E se falarmos em referências, eu diria que sobra o Bruno Alves, faltando saber qual será o seu estado psicológico após a desilusão que foi não dar o salto para um dos grandes da Europa.


4) A integração dos jogadores sul-americanos

«Nenhum jogador sul-americano (designadamente os que não tenham tido na Argentina um trajecto muito seguro) tem capacidade para chegar ao FC Porto ou a um clube europeu de grande exigência e impor-se logo em definitivo. As excepções só confirmam a regra. Independentemente das qualidades humanas e técnicas desses jogadores, existem questões de natureza táctica que criam dificuldades à sua integração.»
Jesualdo Ferreira, PUBLICO, 05/06/2009

No total são 14 - Helton, Fucile, Maicon, Álvaro Pereira, Prediger, Tomás Costa, Valeri, Guarin, Belluschi, Mariano, Rodriguez, Hulk, Farias e Falcao – com o balneário dividido entre portugueses, brasileiros, argentinos, uruguaios e colombianos.
E falta o Lucho que, segundo se dizia, era muito importante no enquadramento do clã argentino. Em sua substituição, O JOGO de ontem anunciou que "Mariano já é um dos capitães de equipa do FC Porto. O médio argentino vai partilhar essa responsabilidade com o guarda-redes Nuno, o central Bruno Alves e o médio Raul Meireles preenchendo o lugar deixado vago pela saída de Lucho González".
Na mesma linha de raciocinio, O JOGO acrescenta que "com o plantel principal praticamente dividido ao meio entre jogadores de língua portuguesa e hispânicos a escolha de um argentino para suceder a Lucho González faz todo o sentido, servindo de ponte entre os jogadores sul-americanos e a equipa técnica".

Evidentemente, o Mariano não tem o perfil, nem o estatuto do Lucho e nem sequer me parece que vá ser um titular indiscutível. Vamos ver o que isto vai dar.


5) Os jogos e viagens das Selecções

Numa altura em que seria fundamental trabalhar diariamente com os jogadores, particularmente nos aspectos de integração dos novos elementos, iremos entrar na fase decisiva de apuramento para o campeonato do Mundo 2010, com vários jogos até Novembro. Se no caso dos portugueses isso já afecta pelo menos três titulares – Rolando, Bruno Alves e Raul Meireles (e veja-se o estado em que Meireles chegou do último compromisso da Selecção) -, o que dizer do impacto dos jogos e sucessivas viagens intercontinentais em Fucile, Álvaro Pereira, Rodriguez e Falcao.


6) "É fácil expulsar o Hulk no futebol português"

"É fácil expulsar o Hulk no futebol português. Leva pancada, como toda a gente viu, há faltas que não são marcadas e torna-se fácil de expulsar. Olhem para algumas imagens da época passada, desta época, e perceberão que toda a capacidade de sofrimento e de encaixe tem limites. Não estou a desculpar. Esse não é o caminho do Hulk. Nesse, podemos interferir, e vamos fazê-lo, trabalhamos nesse sentido. Há, também, a responsabilidade dos outros."
Jesualdo Ferreira, 16/08/2009

Nos jogos em que não estiver castigado ou lesionado (a época passada esteve 6 ou 7 jogos no estaleiro fruto das cacetadas de que é alvo), poderá Jesualdo contar com o Hulk a 100%?
Tenho dúvidas, principalmente se a SAD persistir num silêncio sepulcral sobre o tema das arbitragens.


7) Um novo trio de ataque

Com a saída do Lisandro, o castigo do Hulk e a lesão de Rodriguez que, inexplicavelmente, se arrasta deste Junho passado (na pré-temporada cumpriu apenas 24 minutos diante do Aston Villa e mais alguns no particular com o Padroense), Jesualdo tem de inventar um trio de ataque completamente novo para os próximos jogos. O problema é que os mecanismos ofensivos demoram muito mais tempo a criar do que os defensivos (é mais fácil formar uma defesa para destruir do que um ataque para construir) e, apesar do potencial que queiramos ver em Mariano, Varela e Falcao, convenhamos que a matéria prima não é a mesma em relação ao trio da época passada.
Como, ainda por cima, o médio ofensivo também é novo (Belluschi em vez de Lucho), o que se pede ao Jesualdo é que faça o milagre de apresentar um ataque entrosado e eficaz nos próximos jogos.


Por todas estas razões, parece-me claro que Jesualdo está metido em trabalhos.

Da minha parte não sou, nem estou pessimista, mas perante tantos condicionalismos, internos e externos, penso que nós portistas temos de ser realistas e apenas exigirmos o impossível... daqui a algum tempo (dois ou três meses). Até lá o que interessa é irmos ganhando, mesmo que seja por meio a zero e jogando esteticamente muito mal.

Para já, volto a dizer o que escrevi em 2 de Agosto passado. Se em Maio do próximo ano o FC Porto conquistar o Penta, nem que seja apenas com um ponto de avanço, já será muitíssimo bom.

6 comentários:

Miguel Magalhães disse...

Muito bom o artigo como o José Correia já habitou os leitores deste blog.
Muitas destas variáveis da equação são recorrentes e ocorrem com frequência no Porto:
- falo das revoluções do plantel - o Porto já nos habituou a contratar uma dezena de jogadores por época ;
- falo das carradas de hispânicos - já foram os brasileiros e em menor dose os de leste ;
- falo da perseguição ao Hulk - já foi o Deco, p.ex., e neste ponto o que lamento é que muitos portistas embarquem nos ataques aos seus próprios jogadores e em muitos casos sejam os primeiros a fazê-los ;
- falo até da perda da dupla de argentinos - lembro-me do meio campo Costinha, Maniche e Deco, da dupla Sousa e Jaime Pacheco, da dupla Domingos e Kostadinov;
Mas há um ponto que me preocupa muito mais que os outros e que é a perda de referências e de símbolos na equipa:
- ter apenas três portugueses na equipa titular e dos quais apenas um tem passagem pelas camadas jovens do clube;
- três apenas cinco jogadores de campo com mais de um ano de casa;
- ter estrangeiros com a braçadeira de capitão e um deles ser o Mariano que a massa adepta não reconhece como um líder
A mística do Porto e aquilo que nos fez ser diferentes e ganhar mais que os outros nestes últimos anos passa muito por ter jogadores com muitos anos de casa, jogadores que sabem e sentem que jogar no Porto é jogar num clube especial, jogadores que se mantêm como referências para os que entram e para os que saem. E também muito importante, que se mantêm como referências para os adversários e os adeptos. Gomes, Oliveira, Jaime Pacheco, Sousa, André, Rui Barros, Paulinho Santos, Domingos, João Pinto, Fernando Couto, Jorge Costa, Vitor Baía e tantos outros, transportaram a mística do Porto ao longo dos últimos 30 anos. E alguns estrangeiros tiveram esse privilégio como por exemplo Celso, Aloísio, Drulovic ou Deco. Perdemos essa forma de estar e perdemos um dos segredos do nosso sucesso.
Se olharmos para os nossos adversários é fácil de perceber que quando o Benfica perdeu os seus símbolos começou a ganhar muito menos.

6012 - Azul desde 1971- disse...

Especulação, pura especulação...Pontos bem vistos, mas não de temer.Qualquer deles. Tenho confiança no Porto e nas suas estratégias. Quem viu o que aconteceu o ano passado sabe que "prognósticos....."
VIVA O FCPorto

John Aarson disse...

Bem, em primeiro lugar não posso deixar de congratular o autor pelo post. Um dos melhores e mais claros artigos que já li sobre o FCP.
Realmente a coisa não está fácil, e parece que tudo está contra nós (bem... tudo, tudo não... podiamos ter o Paulo Bento e o tremendo azar do Sporting neste inicio de época. Felizmente isso não está a acontecer xD ) - Mas efectivamente os Benfiquistas já fazem a festa do título - paí pelo 15º ano consecutivo, pelo que me lembro, mas também no final só o ganharam uma vez - o FCP cada vez mais mostra que não é a equipa que conquistou o tetra campeonato, e cada vez demonstramos mais fragilidades e vemos que tudo dentro de campo está contra nós. Mas uma coisa é certa:
nos últimos 8 anos perdemos 2 vezes o campeonato. Nessas duas vezes tínhamos o FCP a jogar de uma maneira lastimável. Sempre que o Porto jogou um bocadinho melhor que lastimável... foi campeão. E penso que - tal como em outubro, depois da fatigante vitória 0-1 contra o Dynamo - haverá uma altura na época em que o FCP encontrará o seu equilibrio e formará o seu novo grupo de campeões.
Agora, sim, o SLB tem grande equipa. Mas não vamos já atirar a toalha ao chão. Este ano eles têm efectivamente a CERTEZA que vão ganhar o campeonato. Então pronto. Titulo entregue... não têm nada a temer, podem jogar à vontade. Que ilações podemos tirar historicamente desde 1992? Que sempre que o Benfica começa a época a achar que vai ganhar o campeonato, perde. As únicas vezes que ganharam o campeonato foi quando pensavam que nao tinham grandes hipóteses (1994 e 2005).
Há que acreditar e apoiar o nosso FCP nos bons e especialmente nos maus momentos! Vamos em direcção ao Penta!

Mário Faria disse...

A equipa que entrou a jogar com o Paços apenas 2 jogadores foram recrutados nesta época.
Respeito muito o JF, mas no jogo passado entende-se mal o estouro de Meireles, o menor acerto de Fernando, o nervosismo de Hulk, a intermitência de Fucille e Mariano, a instabilidade dos centrais e a pouca produtividade de Tomás Costa e Farías. Ora estes são homens que deviam jogar quase de olhos fechados.
Aliás os melhores foram provavelmente os novos : Beluschi, Falcão e Varela.
Quanto tempo é preciso para integrar os jogadores? Como entender que um jogador como Bollati que chegou a internacional pela Argentina não valesse um chavo no FCP ? A Argentina terá provavelmente o futebol mais próximo do europeu e percebo mal tanta dificuldade na integração dos jogadores.
A Imprensa releva a capacidade táctica de JJ e JF diz que nos treinos é que a equipa evolui, e faz do seu modelo e dos processos que o servem como a chave para o êxito. O treino e a rotina táctica são indispensáveis, mas devem poder moldar-se às características dos jogadores. Por outro lado, a maioria dos jogadores que fazem parte do elenco do FCP, não sendo galácticos, vêm de boas escolas e não são certamente ignorantes na compreensão do jogo e na forma de o interpretar, segundo as dificuldades que lhe são colocadas. Porque esse é o nó górdio do problema : ganhar os duelos colectivos e individuais que em cada jogo lhes são colocados.
O que noto é que os sectores no FCP jogam muito distantes, porque a opção é jogar com a defesa sistematicamente recuada e com um trinco que pouco avança para manter o eixo central defensivo um caminho quase inexpugnável aos ataques dos adversários. Temos pouca posse de bola que raramente passa os 50%, não somos pressionantes, fisicamente os adversários parecem correr mais que nós e fico muitas vezes com a ideia que os jogadores do FCP são obrigados constantemente a grandes correrias que devem ser muito desgastantes e que “descansamos” pouco tendo a bola em nosso poder. E quando apanhámos equipas bem fechadinhas cá atrás, temos enorme dificuldade em ganhar. Isso explica em parte os bons resultados fora e a tremedeira caseira, da época passada,
Aliás, a demora na confirmação da continuidade de JF e as notícias não desmentidas do CM parecem significar que o ciclo JF era tido como esgotado no FCP. Espero que não e que JF e o FCP confirmem os bons resultados anteriores.
Apesar das dúvidas que tenho relativamente ao nosso comportamento no presente campeonato, acho que o comentário do Zé é muito oportuno e que apetece explorar. Foi o que fiz, armado em treinador de bancada.

dragao vila pouca disse...

Meus caros, ao ficarmos com o Jesualdo já sabemos o que nos espera: um processo de aprendizagem lento, um futebol que não encanta, baseado nas chamadas transições rápidas - já em 1987/1988 Ivic jogava assim, mas na altura chamava-se contra-ataque! -, que joga no erro do adversário, que não é contundente, que arrisca pouco, enfim, aquilo que sabemos...mas ganhou e como ganhou, Jesualdo continua, e ao continuar quando podia sair pela porta grande, é porque acredita que vai ser capaz de atingir os objectivos de ser campeão, pelo menos.
Há uma coisa que ele disse na C.Imprensa que eu retenho: a equipa está melhor nesta altura, do que estava por esta altura da época passada.

Mesmo nunca tendo sido um grande fã do professor - estou habituado a ganhar com um futebol mais bonito - dou-lhe, porque ele merece, todo o crédito.

José Correia disse...

Mário Faria disse...
«no jogo passado entende-se mal o estouro de Meireles, o menor acerto de Fernando, o nervosismo de Hulk, a intermitência de Fucille e Mariano, a instabilidade dos centrais e a pouca produtividade de Tomás Costa e Farías. Ora estes são homens que deviam jogar quase de olhos fechados.»

O Meireles tem limitações físicas e dificilmente aguenta três jogos completos numa semana.
O Fucile e o Mariano sempre foram intermitentes, isto é, são capazes do melhor e do pior no mesmo desafio.
O Farias joga pouco para a equipa e quando a equipa joga pouco para ele transforma-se num peso morto.

No jogo com o Paços de Ferreira, do meio campo para a frente, faltaram Lucho, Rodriguez, Lisandro e Hulk (a partir dos 50 minutos). Convenhamos que isso não é coisa pouca.

Acredito que as coisas vão melhorar, mas não de uma semana para a outra. Vai ser preciso tempo - 2 ou 3 meses - até vermos os jogadores do FC Porto a funcionarem como equipa, principalmente do meio campo para a frente.