sábado, 15 de maio de 2010

De Chaves a Oeiras


No itinerário aconselhado pelo Via Michelin, de Chaves a Oeiras é percorrida uma distância de 474 km, para um tempo de viagem previsto de 04h51 e um custo estimado de 75.80 EUR (31.35 EUR em portagens e 44.45 EUR em combustível). Ou seja, um adepto do Grupo Desportivo de Chaves que queira assistir in loco à final da Taça de Portugal, terá de percorrer 948 km e gastar 150 EUR em combustível e portagens, a que acresce o preço dos bilhetes e das refeições. Além disso, se o jogo não tiver prolongamento e, mal termine, o adepto do Desportivo correr para o carro e vier embora, na melhor das hipóteses chegará a Chaves por volta da meia-noite (isto, claro, se decidir passar fome e não parar pelo caminho para jantar).

E se a final fosse em Braga, conforme os flavienses sugeriram e o FC Porto concordava?
Bem, como a distância de Chaves à cidade dos arcebispos é de 124 km, no total os adeptos do Chaves percorreriam menos 700 km (!!), gastariam menos 110 euros em gasolina e portagens e, pequeno pormenor, poderiam estar de regresso a tempo de jantar calmamente em casa.

Por todas estas razões, chegou a haver uma petição em Chaves para que a final pudesse ser num estádio mais perto, mais concretamente o de Braga.
Na altura, o presidente do clube, Mário Carneiro, afirmou: "Para os atletas e alguns associados, pode haver algum simbolismo na ida ao Jamor, mas que interessa jogar num estádio despido de público? Por isso, entre o simbolismo e a necessidade, nesta altura de crise, os adeptos optam pela poupança de despesas".

Como reagiu a FPF à vontade dos dois clubes finalistas?

Segundo o JN, o presidente federativo, Gilberto Madail, é contrário a qualquer mudança, atendendo a que se deve "respeitar o peso da tradição".
Quanto ao vice-presidente Amândio Carvalho, alertou que o regulamento da competição estipula a realização da final no Estádio Nacional e que só poderá mudar em caso de um motivo de força maior.

Mas há alguma razão, racional e objectiva, para que a final da Taça de Portugal tenha de ser num local fixo (por sinal nos arredores de Lisboa)?
É óbvio que não e menos ainda quando esse local é o estádio do Jamor o qual, em termos de conforto e de condições de segurança está a anos-luz de qualquer um dos 10 estádios do EURO2004.

Assim sendo, porque razão, tal como acontece nas competições europeias, o estádio onde se realiza a final da Taça de Portugal não é escolhido/sorteado pela FPF no início de cada época, entre um conjunto de estádios que reunisse as condições mínimas (lotação, conforto, segurança, acessos) para tal?
Evidentemente, este facto não deveria impedir que mais tarde, havendo acordo entre os dois finalistas, a final pudesse realizar-se num estádio que facilitasse a deslocação de um maior número de adeptos desses clubes.


"O Estádio Nacional não serve para mais nada, tem que ter mesmo um jogo especial como a final da Taça para nos lembrarmos que existe"
Manuel Queiroz, 'De Trivela'

12 comentários:

Pitágoras disse...

Esta coisa da tradição tem que se lhe diga. Em Inglaterra, jogar a final da taça em Wembley é uma tradição e um enorme motivo de orgulho para qualquer jogador por vários motivos:
- essa tradição tem décadas (o estádio novo de Wembley sucedeu ao antigo);
- trata-se de um estádio moderno com todas as condições para a realização de um grande jogo de futebol;
- existe uma relação afectiva fortíssima entre os adeptos ingleses e esse local.
Coloco a seguinte questão: algum destes motivos é válido para a realidade portuguesa?
Fará sentido obrigar milhares de pessoas de ambos os clubes, a viajar centenas de quilómetros e gastar centenas de euros, para verem as suas equipas a jogar num estádio sem condições e que lhes diz muito pouco?

Miguel Magalhães disse...

"Mas há alguma razão, racional e objectiva, para que a final da Taça de Portugal tenha de ser num local fixo (por sinal nos arredores de Lisboa)?"
Há várias:
. sendo em Oeiras, a malta que só vai para os croquetes (os convidados da FPF, a chamada "família do futebol") podem almoçar e jantar em casa
. sendo em Oeiras, há sempre uma probabilidade alta de o jogo ter casa cheia com um clube a jogar "em casa" - nas 70 edições da prova, em 51 vezes esteve presente o campeão dos túneis ou o Sporting (nos últimos 30 anos, foram 18 as vezes em que pelo menos um esteve na final)
. pelos dois motivos apontados acima, tanto os adeptos como a malta dos croquetes e dos convites ficam mais confortáveis com o jogo em Oeiras
. por fim há aquela razão parola do "estádio helénico" e da tradição. E só num país de parolos é que se continua a usar um estádio só para um jogo. Que eu saiba, os ingleses jogam a final em Wembley mas a selecção também joga lá. E o mesmo se passa com os franceses e o Stade de France em Paris. Mas se o Jamor não tem condições para jogar lá a selecção, porque diabo é que tem para a final da Taça?

A solução é fazer como eu faço: não vou à final da Taça. A última vez que quebrei esta minha promessa foi em 2004 e como ainda por cima dei de caras com um grupo de jagunços vestidos de vermelho quando me dirigia para o estádio e a coisa ia correndo mal, jurei que nunca mais.

(obviamente que se o jogo de amanhã fosse em Braga não haveria ainda 8 mil bilhetes por vender mas isso não interessa, pois não?)

Pitágoras disse...

Miguel Magalhães estou inteiramente de acordo.

Orgulhoazulebranco disse...

Percebe-se a coisa do simbolismo e da tradição,eu pelo menos percebo.É "aquela coisa" de ir ao Jamor,mas o raio do estádio não tem condições,porra!!A Federação Internacional de Rugby ficou chocada com as condições!
Daqui a uns anos,o estádio vai estar ainda pior,e vamos ver a FPF a dizer "Temos que respeitar o peso da tradição",chega a ser cómico!
Aposto que os balneários da minha escola conseguem suplantar os balnerários daquela espelunca -.-'

Carlos Santos disse...

Miguel Magalhães disse...
"Mas se o Jamor não tem condições para jogar lá a selecção, porque diabo é que tem para a final da Taça?"


Miguel concordei com tudo o que escreveu e esta frase é digna de um cartaz, ou, melhor, um lençol!

Parabéns!

Daniel Gonçalves disse...

A ideia de jogar a final da Taça no Jamor é um vestígio do centralismo político do Estado Novo, que tinha medo de partilhar ou deixar fugir das suas mãos qualquer prerrogativa do Poder que possuía. Se faz sentido haver um local/estádio simbólico, como em Wembley, isso não acontece com o Jamor, que não possui condições para tal. É um arcaísmo mental, o que diz tudo da mentalidade das pessoas que fazem parte da Federação Port. Futebol, obsoletas.

Daniel Gonçalves disse...

O próprio Estádio Nacional é um símbolo do Estado Novo, servia não só para eventos desportivos, mas também para desfiles e manifestações políticas, como por exemplo a Mocidade Portuguesa. Está portanto desfasada da realidade portuguesa do século XXI, e também nos leva a concluir que há por aí muitas pessoas que, se fisicamente vivem num regime democrático, mentalmente ainda vivem em num regime político como o Estado Novo.

meirelesportuense disse...

Deixou de fazer sentido esta teimosia em jogar no Jamor...A realidade mudou tanto e está em tão constante alteração que só mesmo os saudosistas de um tempo que já não existe, podem continuar a querer manter esta tradição que percebe-se, visa apenas alargar a manutenção da protecção a "uns quantos"...Se aquele espaço já não tem qualquer utilidade, reparem que a Selecção vai para o interior e despreza o Jamor, os jogos da Selecção não se realizarão jamais naquele Estádio, acredito que um dia mais tarde ou mais cedo, irá ser demolido ou então terá que ser muito alterado...Para servir como Centro Nacional de Estágio das Selecções, por exemplo...Mesmo assim não creio, com tantas estruturas existentes e de tão boa qualidade, fará mais sentido "diversificar os locais dessas concentrações", tal como acontece já...Os que querem sempre seguir os exemplos da Inglaterra com Wembley, não podem esquecer que Wembley tem uma história completamente diferente da do Jamor, existe uma realidade diferente também em Inglaterra, a ligação centenária à Monarquia, numa República os símbolos máximos são os da Igualdade, Fraternidade e Liberdade...O oposto do concentracionismo próprio das Oligarquias...

meirelesportuense disse...

Hoje houve final em Inglaterra e eu nem sequer me esforcei por ver, não tem o mesmo interesse que já teve, o Futebol transformou-se muito...Em Inglaterra nas equipas de topo já quase não jogam Ingleses...Isso poderia ser alterado se mudassme as normas mas quem manda em tudo são os mais poderosos e estes, não querem ter muito trabalho, compram já feito.

meirelesportuense disse...

Porventura a Final da Taça de Inglaterra era em tempos, uma oportunidade quase única, de ver em directo, um jogo de alta qualidade na Televisão...A imensa maioria dos jogos não era transmitida, restavam os jogos dos Campeões, das Selecções e normalmente os realizados fora de portas, em Portugal não transmitiam, isso e de dois em dois anos, ora um Mundial, ora um Europeu...Depois as competições Olímpicas, mais uma oportunidade de ver Desporto em directo, recordo-me de passar por Sá da Bandeira ou pelo Padrão, e assistir a fragmentos dessas competições, que eram mostradas por Tvs colocadas estrategicamente à disposição de quem passava, incentivando à compra dos aparelhos...Marketing puro.
Hoje temos a Tv por Cabo e tudo ou quase tudo o que se leva efeito com algum relevo no Desporto, Cinema, etc passa por ali...Não é preciso sair de casa, até vídeo Clube lá está disponível, ainda por cima com a possibilidade de se gravarem programas sem recurso aos tradicionais gravadores, tenho um pessoal que está praticamente inactivo, só lê se me derem matéria agradável para visionar, de resto está adormecido perante tanta e tão diversificada informação facultada pelas televisões!...Estas estão agora controladas por Empresas que vendem Informação!
No Futebol nem os Clubes conseguem contrariar esse fenómeno, não conseguem e não o querem, mas estas estratégias empobrecem drasticamente as assistências, especialmente nos Países mais dependentes...

eumargotdasilva disse...

Para haver tradição tem de haver uma recordação e uma transmissão de valores - ou coisa assim parecida! Ou seja, como só os adeptos do estado novo entenderam porque é que fazia sentido ter-se um estádio nacional, essa tradição é inexistente em si mesmo, não existe. É óbvio que essa conversa é bolorenta e só interessa a quem acha que tradição quer dizer centralismo! Ironicamente, esses mesmos centralistas, que acham que são Portugal, são os mesmos que agora ao tentarem dizer que os do Norte são uns vândalos que vão sempre para a porrada, gostariam de os afastar das suas portas...
mas, talvez também por isso acho que era bom que fosse lá e sempre com equipes do Norte e arredores!..

inconformista disse...

Para mim é pura vassalagem! É uma forma de obrigar os clubes que não são da chamada Grande Lisboa a deslocarem-se ao ainda chamado Estádio Nacional! E, ao mesmo tempo, é uma forma de proteger os clubes grandes da Capital do ex-Império, por razões óbvias... Claro que nos últimos anos as coisas tem corrido mal, dadas as vitórias do FCP!